* Por Mara Narciso
Devido ao feriado, meu filho viajou para Belo Horizonte. Meu marido foi visitar sua irmã e eu fiquei em casa. Eram duas horas da tarde do Dia de Finados. Ouvindo música, na minha sala de estar, decidi tomar uma cerveja, quando tocam o interfone. Espio pelo vidro da porta da sala, e por ser pessoa desconhecida, não quis atender. Quem chamava, aparentemente foi embora. Desliguei a música e subi, porém, quando espiei do segundo andar, vi dois homens do outro lado da avenida, bem em frente à casa da minha irmã. Olhavam em minha direção.
Voltaram e mexeram no portão do fundo, porém desistiram. Eu os via pela janela, mas não quando entraram pelo portão da garagem, o arrastando no muque (um deles era bem forte). Deduzi depois, que os homens pegaram no quintal um cano maciço, de uns 40 cm, e arrombaram a janela do escritório. Eu ouvi o estilhaçar de vidros, mas não entendi exatamente o que acontecia. Antes de eles entrarem, já tinha trancado a porta que separa a parte social da parte íntima da casa. Também fechei a porta do meu quarto e, guardando a chave no bolso, me fechei no closet. Antes disso, liguei para minha amiga, para pedir ajuda, mas não completei a ligação, pois não sabia o que dizer. Estava aflita, sem entender a intenção dos bandidos. Pensei tratar-se de vândalos, e não de ladrões. Liguei para meu marido, no fixo da minha cunhada, que mora do outro lado da cidade. Pedi que chamasse a polícia, pois estava tão assustada com os vidros quebrados, que não teria cabeça e talvez nem tempo para explicar o fato, endereço e outros detalhes. Telefonei para a minha irmã que mora em frente, e lhe pedi o mesmo.
Lá fora, na parte de baixo, o quebra-quebra continuava. Dava para ouvir bem os bates nada cautelosos, e o barulho de pedaços de porta voando. Tive certeza que estavam dentro da casa quando se aproximaram. Senti que o meu tempo estava se esgotando, ao escutar o arrombamento da porta que leva à parte íntima. Para atravessar essa porta que tem corrente de segurança, eles usaram o pé e toda a força, pois a fechadura ficou retorcida, e a madeira maciça aos pedaços. Faltavam ainda duas portas, a do meu quarto e a do closet. Com todos os meus músculos retesados, fiquei de cócoras no pequeno espaço. Demoraram um pouco, pois foram demolir o quarto do meu filho. Eu empunhava firmemente o celular e novamente tentei falar com minha amiga, porém a porta do meu quarto foi arrebentada, e eu achei prudente me calar. Um deles perguntou se a porta do closet seria outro quarto. Então, muda, transida de medo, quase louca, já ouvindo a música de Psicose, de Alfred Hitchcock, não acreditava que seria poupada, e esperei pelo momento final.
Fiquei estatelada, escutando vozes atrás da porta, numa tortura por tempo imensurável. Não sabia quantos homens eram. Então, num baque forte, numa ombreada a porta do closet foi aberta. O bandido avançou para cima de mim, e num susto, segurando com força os meus cabelos por trás, de forma que eu não o visse, perguntou-me onde era o cofre da casa. Não olhei para ele, e não tive nenhuma reação. O bandido me soltou, antes de eu responder, virou as costas e ambos saíram do quarto.
Nesse meio tempo, minha irmã ligou para a polícia, explicou tudo e foi para a porta da rua com minha tia para ver o movimento. Ainda me perguntou se ela poderia fazer mais alguma coisa, pois a polícia já vinha. Ao mesmo tempo, meu marido chegou ao nosso bairro. Estava sem celular. Tinha entendido que moleques estariam jogando pedras na casa. Quando chegou e não viu ninguém, deu uma volta na praça à procura dos desconhecidos. Só então, foi a um posto da PM, próximo de casa e pediu aos militares para acompanhá-lo. Chegaram ainda a tempo de ver dois homens do lado de fora.
A minha tia e minha irmã também viram os dois homens saindo pelo portão por onde entraram. Um deles colocou algo dentro da meia (dinheiro? máquina fotográfica?). Queria estar com as mãos livres, para não levantar suspeitas, e logo se separaram. Um deles foi em direção a minha irmã, uma testemunha, para intimidá-la. Ela não se manifestou e ele passou. O meu marido entrou com a polícia e achou tudo arrebentado, uma janela e três portas desmanteladas, além de cômodos revirados.
Após o registro da ocorrência, a policial questionou sobre o motivo de os ladrões não terem levado a sacola que estava arrumada em cima da cama, com rádio, celulares e outros objetos. Imagino que, de acordo com as chamadas do meu celular, a ação demorou cerca de meia hora. Assim, o meu susto de ter sido descoberta foi grande, mas maior ainda foi a surpresa dos ladrões, pois, certos de a família estar viajando no feriado (não havia nenhum dos carros na garagem), eles teriam tempo até para um lanche. Mas, de repente a polícia poderia chegar. Por isso partiram, com calma, mas rapidamente, deixando um rastro de destruição, mas sem mortes. Poderia ter sido espancada e assassinada, pois o desrespeito a vida atingiu tal patamar, que os criminosos não se contentam em roubar. Precisam humilhar, bater, machucar e até mesmo dilacerar suas vítimas, antes de matá-las.
Na hora de dormir, quem conseguiu? O filme Halloween, com o assassino Michael Myers, passou mais de cem vezes. E então, esgotada desmaiei de 2 as 6 h, para recomeçar a cena, interminavelmente. Foi quando tomei o café e um ansiolítico. Preciso muito celebrar a vida. A minha vida.
*Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia Feminina de Letras de Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade” – blog http://www.teclai.com.br/
Puxa, Mara. Que aventura! Fico feliz que todos tenham saído sãos e salvos dessa. Um grande abraço.
ResponderExcluirApesar do susto e do sentimento de violação, você teve muita sorte, que bom que se refez desse trauma.
ResponderExcluirAbraços.
Amigos, o caso narrado aconteceu mesmo, porém com Dulce, a minha amiga de infância. Ela está arrasada, traumatizada e não pensa e nem fala noutra coisa, só na escalada dos bandidos, que no final parece que eram quatro e não dois, como contei. Fomos somar as cores das camisas vistas por ela, pelo marido e irmã. No começo não fechou. Quando foi arrombada a última porta, bateu na cabeça dela, fazendo um "galo". A amiga que ela ligou fui eu, mas não completou nenhuma das duas ligações. Estranho é que o telefone aqui chegou a tocar, e eu senti que seria ela, embora quase nunca ela telefone. Tanto é assim,que não quis ligar nem para a polícia.
Fiquei impressionada com a inoperância da PM e da irmã dela que ficou na porta da casa, do outro lado da rua e nem por sombra imaginou que a irmã corria perigo.
Obrigada Marcelo e Núbia pela atenção, passagem e comentário.
"Nada detém quem quer entrar", realmente. Não há obstáculos intransponíveis para esses meliantes, delinquentes incorrigíveis. Haja vista os crimes que vemos nos noticiários, como um recente, que relatou um roubo num apartamento de luxo em Copacabana, quando então a dona do apartamento foi rendida na portaria quando saía. Fizeram-na voltar ao apartamento, fizeram a "limpeza", foi estuprada, etc. Tudo isso a 100 metros de um posto policial. Não acompanhei o caso depois, mas o curioso é que o porteiro não viu nada? E as câmeras de segurança? E os vizinhos do apartamento? Não viram nem ouviram nada? Resumindo, corremos riscos diários, infelizmente. Não estamos seguros nem dentro de nossa casa. A cada noite quando formos dormir e que nada de ruim tenha nos acontecido, devemos pensar: "Bom, vou dormir em paz". Dormir em paz? E se eu for surpreendido por um desses "crápulas" no meio da noite?
ResponderExcluirPreocupante, Edir. A permanência da vida depende de uma espécie de loteria ou roleta russa: espero que as intenções dos bandidos não me encontrem. Obrigada pela atenção da passagem e do comentário.
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