quarta-feira, 14 de maio de 2014

Olho grande e juízo minúsculo

* Por Fernando Yanmar Narciso

Uma das coisas mais marcantes para mim, no início do Plano Real, foi que ele iniciou na mesma época em que fiquei conhecendo e me apaixonei pelas cadeias de fast-food. Em 1995, você podia chegar à boca do caixa do McDonald’s com apenas 5 Reais nos bolsos e sair de lá com qualquer “Mc Oferta” e ainda sobrava algum pro mendigo na porta do “restaurante”. O Big Mac, assim como todos os lanches do cardápio, custava apenas $2,95, o que faz supor que os acompanhamentos saíam a 1 Real cada. E não apenas na loja dos arcos dourados, mas até nas lanchonetes das mais curraleiras os sandubas costumeiramente saíam por menos de cinco.

No entanto, ao final do primeiro mandato de FHC, o kit macabro Big Mac+ fritas+refrigerante já saía a $9,95. Inflação de 50% em quatro anos! Hoje o máximo que dá pra fazer com 5 Reais num balcão do McDonald’s é comprar duas casquinhas e talvez um copinho de água mineral, e nem deixam lamber o balcão se o sorvete derramar. Para um homem que não dirige como eu, o mais normal de acontecer é entrar na loja com 50 Reais no bolso e mal sobrar algum pra condução. Pelo menos, podemos queimar as calorias de todo aquele lixo tóxico andando de volta pra casa...

Vocês se lembram de como o plano econômico de Itamar Franco, surrupiado por FHC, parecia ter dado um Ctrl+Alt+Del na vida do povo brasileiro? Naquele mesmo ano em que virei consumidor assíduo do McChicken, era possível ver coisas hoje acima de nossa compreensão, como estocar frango para um mês inteiro no freezer com pouco mais de 10 Reais; gente saindo do supermercado com fardos e mais fardos de latinhas de Skol nos braços a $0,25 cada uma ou padarias vendendo pãozinho francês por $0,05 a unidade, e não no quilo!

O poder de compra de uma moedinha de 1 Real deixava os moleques da época bestificados. Imaginem comprar um saco de rosquinhas de coco Mabel, de 1 kg, com uma mísera moeda nos bolsos! Ou passar a tarde inteira cabulando aula na locadora de videogame, torrando trocados na frente do Super Nintendo! Minha mesada foi de apenas $30 por muitos anos, e dava pra se virar numa boa com aquelas três notinhas... Por algum motivo as coisas parecem ter saído de controle há alguns anos. A inflação, apesar de não ser (ainda) monstruosa, põe muita gente pra chorar embaixo da cama. Conseguem imaginar o que é gastar 5 Reais numa maçã no aeroporto?

Ano passado, quando houve aquele descontrole nos preços do tomate ao redor do país, quem de nós não ficou esperando pelo pior? Felizmente a inflação não subiu como temíamos. Já a ganância dos vendedores e a vaidade dos consumidores... A publicidade vive tentando nos conquistar com aquele sonho de vida boa, comerciais e cartazes cheios de pessoas sorrindo, descontraídas e de bem com a vida, contanto que compremos o que estão tentando nos empurrar goela abaixo. “Quem anda num carro X é porque fez por merecer”; “Você MERECE usar calças da marca Y”; “Marca Fulano de Tal: Você no topo do mundo”.

É preciso ter noções básicas de como funciona o mercado financeiro para não sair gastando como um doido e chegar ao meio do mês devendo até o pâncreas em juros. Mas digam aí quem pensa em apreciar a vida com moderação quando se pode sair de um Shopping Center usando Lacoste legítimo da cabeça aos pés, especialmente se você faz parte da classe C e adora se exibir para os vizinhos? Vendedores sempre contam com a chance de o consumidor ser ingênuo a ponto de enfiar o Visa na maquininha sem nem perguntar o preço do que está comprando. E depois o caboclo vai checar o extrato bancário, não consegue entender porque o saldo dele fica mais curto a cada mês e sai por aí pondo a culpa de seu descontrole no governo. Se as pessoas não abrirem os olhos e criarem juízo, logo nem uma McCasquinha vão conseguir comprar...

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