quinta-feira, 5 de janeiro de 2012







Moça bonita de vestido florido


* Por Gustavo do Carmo

Moça bonita parada no ponto de ônibus em Copacabana. Estava de vestido de alcinha florido. Branca, magra, cabelos curtos, mas femininos. Cortado à altura dos ombros. Do jeito que eu gosto.
Tive o receio de que ela era do tipo Raimunda, feia de cara e boa de... você sabe! Mas não era. Era bonita de rosto, sim! Aliás, sou mais chegado aos seios do que ao traseiro. Não consegui reparar no seu peito. Precisava ser discreto, não olhar muito. Então, não lembro direito se eram grandes ou não. Acho que eram médios.
Voltei a ficar atrás dela. Ela de costas para mim. Costas brancas e lindas. Não vi nenhuma falta de educação ou elegância da parte dela. Só uma alça azul do sutiã.
Ela esperava pelo ônibus, impaciente. Eu também. Ficou um tempão. Eu também. Segurava impaciente uma bolsa de butique. Deve ter comprado outro vestido florido. Teve um momento em que ela colocou a bolsa de butique no chão da calçada.
Foi aí que eu comecei a ter fantasias. Não as sexuais (por enquanto), mas as sentimentais. Pensei em lembrá-la da bolsa no chão. Pensei ela agradecendo e a gente se conhecendo. Pensei a gente conversando. Pensei a gente trocando e-mails e telefones. A gente saindo. Indo ao teatro ou ao cinema. Indo ao motel. Transando, finalmente.
Fantasiei também, a gente se apresentando. Ela conhecendo a minha família e eu conhecendo a dela. O nosso noivado. O nosso casamento. Os nossos filhos. Até as nossas brigas.
Como será o seu gênio? Pelo que eu vi dela no ponto, parecia ser enfezada, nervosinha. Requer cuidado. Mas esperando um ônibus em Copacabana por um tempão, correndo risco de voar pelos ares na explosão de um bueiro, qualquer um vira uma pessoa enfezada e nervosa. Vai que ela seja doce.
Será que ela tem TPM com freqüência? Será que ela gosta de ajudar os outros? Será que os pais dela são ricos? Será que ela já trabalha? Onde será que ela estuda? O que ela estuda? Jornalismo? Arquitetura? Engenharia?
Ao mesmo tempo, pensei no pior: ela poderia ter estar falando com o namorado no celular quando deixou a bolsa no chão. E se eu a lembrasse da bolsa no chão, poderia estar passando por idiota. Afinal, ela sabia e não era cega.
Pela demora do nosso ônibus imaginei que ela estivesse esperando a mesma linha do meu. Imaginei ela indo para Bonsucesso também. Ou até para a Penha. Repeti todas as minhas fantasias sentimentais, românticas e sexuais. Todas as minhas ilusões.
O ônibus chegou. O meu. Subi no meio da multidão. A moça bonita do vestido florido não entrou. Meu ônibus não serviu para ela. Ela ficou parada no ponto. Nunca falei com ela. Não sou sedutor barato. Sou mesmo um bobo. Nunca mais a vi.

* Jornalista e publicitário de formação e escritor de coração. Publicou o romance “Notícias que Marcam” pela Giz Editorial (de São Paulo-SP) e a coletânea “Indecisos - Entre outros contos” pela Editora Multifoco/Selo Redondezas - RJ. Seu blog, “Tudo cultural” - www.tudocultural.blogspot.com é bastante freqüentado por leitores.

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