Literário

Lição de metafísica

* Por Antonio Medina Rodrigues

Eu, que não tinha o que fazer, vi Hegel
junto de um campo de futebol onde
funciona uma fábrica e uma favela.
O jogo estava a começar, ninguém o via.

Então ele chegou, e por um fiapo
de temporalidade houve uma comoção geral:
deram lugar pra ele no time dos operários,
e no intervalo ele teve que sair,
porque chegou o cobra,
e cobra não costuma estar de fora,
de modos que ele foi andando,
e também porque tinha levado
e dado muito pontapé, e, afinal de contas,
a coisa não era para se levar
assim tão a sério que diabo! –
Ele que entrasse na real,
pois futebol não era guerra.

Sacado, foi pela cerca,
com aquela indumentária de Vai-vai
seguido de cinco meninos, duas meninas e um negão
impressionado com a garra dele
e com a falta que ele fez”Olha seu Regel,
o senhor é um jogador refinado, de futuro,
só que aqui não tem lugar,
aqui só tem filhinho de papai.
Por que não vai jogar no Santos?
Lá estão sempre precisando”.

Mas no meio do caminho, foi a velha da cocada
que depois de insolitíssima tesão por ele,
arrematou no espírito geral:
“Gosta mesmo é de pancada, né paizão?”.

• Poeta, professor, ensaísta e tradutor