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Nem foca escapa da praga
*Por Ruth Barros
A enchente que inundou Praga há alguns meses e seus monumentos históricos e lindos teve ainda um outro efeito colateral – as focas da cidade aproveitaram que o zoológico também fez água para botar o pé, ou melhor, as nadadeiras na estrada. Detalhe importantíssimo: só fugiram as fêmeas. O macho ficou quietinho no zoológico destruído, provavelmente sentado no sofá esperando a final do campeonato. “Só saio quando a televisão boiar”, deve ter pensado o “foco”.
Essa pequena fábula real moderna, relatada pelas agências internacionais de notícias, fez com que Anabel encarnasse um Esopo rápido e transmutasse a vida da foca para a vida como ela é. Prova que a acomodação não é privilégio do macho brasileiro – o macho tcheco, pelo menos o da foca, também sofre do mesmo mal.
Em fase de conquista, nossos focas brasileiros são imbatíveis. Fazem gracinhas, mostram-se adoravelmente amestrados, usam bem o focinho, dão um show. Com raras e honrosas exceções, o espetáculo tende a acabar quando eles se acham donos e senhores do material. Para que se incomodar, se a foca fêmea, já totalmente dominada, se mostra cordial e amiga, sempre pronta a assegurar o fornecimento de pipoca quentinha e cerveja gelada nos fins de semana na frente da TV?
Para continuar nessa de mundo animal, vou contar o caso de uma moça que, depois de 14 anos de namoro e muitas brigas, a maioria causada pela falta de interesse do foco em se arrancar do sofá, foi chantageada com uma cachorra. O bofe arrumou Minnie, a cachorrinha, a mais perfeita desculpa para que ele não saísse de casa nos fins de semana – ela ficava deprimida sozinha.
A obstinada amiga ainda fez um esforço de reportagem para manter um clima no eterno sofá: - Se eu quisesse viajar, era obrigada a ficar pesquisando hotéis que aceitassem cachorros. Com restaurantes e bares era a mesma coisa. Acabei cansando -, conta ela. Para salgar a terra arrasada, o atual parceiro de Minnie - sim, minha amiga se arrancou em busca de um namorado mais divertido e jogou o antigo não aos cães, mas à cachorra - mandou uma dessas bobagens de Internet a ela, listando as vantagens de ter uma cachorra em vez de mulher em casa. “Quanto mais tarde você chega, mais excitada ela fica em te ver”, dizia entre outras pérolas o elegante torpedo.
Experiência de vida e/ou idade também não livram ninguém de cair no conto do foca amestrado que acaba no sofá. Depois de quase 50 anos de casamento, viúva e dona de razoável pensão, a tia de uma amiga reencontrou a alegria de viver em bailes da terceira idade. Até uma dor eterna no joelho sumiu, levada pelo ritmo da música. Nessa balada ela encontrou um senhor distinto, pé de valsa, que começou a fazer-lhe a corte. Entre pegar na mão respeitosamente e irem morar juntos – na casa dela, é claro – passaram-se rapidíssimos quatro meses.
A família comentou, não achou de bom tom nem a pressa nem a falta de papel passado, mas a vingança do falecido não tardou a vir do além. Com casa, comida e roupa lavada, o novo marido começou a ter enorme preguiça em freqüentar os bailes das noites de sábado, cortados sumariamente da agenda do casal. Aos domingos, lépido e fagueiro depois de uma noite aboletado na frente da televisão, vai encontrar amigos antigos, enquanto ela fica em casa preparando o almoço – ele acha caro e desconfortável encarar fila de restaurante. Ela não consegue simplesmente livrar-se dele, até para não dar o braço a torcer para a família. E a dor do joelho voltou com tudo.
Anabel Serranegra quer encarnar La Fontaine para recontar a fábula do marido-cigarra, aquele que canta incansavelmente enquanto a mulher viaja com as crianças de férias.
Nota: Anabel tem uma coluna chamada O Diário da Perua. Metida a escritora e jornalista - não, ela não é modelo e atriz - tem uma cabeça que funciona como mix do pensamento vivo de Danuza Leão com o Casseta e Planeta. A auto-intitulada perua tem mais 30 e menos de 40 anos - assim como a idala Danuza, ela se recusa ferozmente a revelar a verdadeira idade. Quem sabe em um futuro livro de memórias? Tudo de bom. Anabel tem o mundo como limite - sexo, homens, filhos, televisão, política, celebridades, consumo, viagens, nada escapa à curiosidade dela. Como também gosta muito de se mostrar e mostrar sua coluna, resolveu assumir o convite que foi feito à sua criadora, a jornalista e escritora Ruth Barros, para escrever no Comunique-se.
* Maria Ruth de Moraes e Barros, formada em Jornalismo pela UFMG, começou carreira em Paris, em 1983, como correspondente do Estado de Minas, enquanto estudava Literatura Francesa. De volta ao Brasil trabalhou em São Paulo na Folha, no Estado, TV Globo, TV Bandeirantes e Jornal da Tarde. Foi assessora de imprensa do Teatro Municipal e autora da coluna Diário da Perua, publicada pelo Estado de Minas e pela revista Flash, com o pseudônimo de Anabel Serranegra.
*Por Ruth Barros
A enchente que inundou Praga há alguns meses e seus monumentos históricos e lindos teve ainda um outro efeito colateral – as focas da cidade aproveitaram que o zoológico também fez água para botar o pé, ou melhor, as nadadeiras na estrada. Detalhe importantíssimo: só fugiram as fêmeas. O macho ficou quietinho no zoológico destruído, provavelmente sentado no sofá esperando a final do campeonato. “Só saio quando a televisão boiar”, deve ter pensado o “foco”.
Essa pequena fábula real moderna, relatada pelas agências internacionais de notícias, fez com que Anabel encarnasse um Esopo rápido e transmutasse a vida da foca para a vida como ela é. Prova que a acomodação não é privilégio do macho brasileiro – o macho tcheco, pelo menos o da foca, também sofre do mesmo mal.
Em fase de conquista, nossos focas brasileiros são imbatíveis. Fazem gracinhas, mostram-se adoravelmente amestrados, usam bem o focinho, dão um show. Com raras e honrosas exceções, o espetáculo tende a acabar quando eles se acham donos e senhores do material. Para que se incomodar, se a foca fêmea, já totalmente dominada, se mostra cordial e amiga, sempre pronta a assegurar o fornecimento de pipoca quentinha e cerveja gelada nos fins de semana na frente da TV?
Para continuar nessa de mundo animal, vou contar o caso de uma moça que, depois de 14 anos de namoro e muitas brigas, a maioria causada pela falta de interesse do foco em se arrancar do sofá, foi chantageada com uma cachorra. O bofe arrumou Minnie, a cachorrinha, a mais perfeita desculpa para que ele não saísse de casa nos fins de semana – ela ficava deprimida sozinha.
A obstinada amiga ainda fez um esforço de reportagem para manter um clima no eterno sofá: - Se eu quisesse viajar, era obrigada a ficar pesquisando hotéis que aceitassem cachorros. Com restaurantes e bares era a mesma coisa. Acabei cansando -, conta ela. Para salgar a terra arrasada, o atual parceiro de Minnie - sim, minha amiga se arrancou em busca de um namorado mais divertido e jogou o antigo não aos cães, mas à cachorra - mandou uma dessas bobagens de Internet a ela, listando as vantagens de ter uma cachorra em vez de mulher em casa. “Quanto mais tarde você chega, mais excitada ela fica em te ver”, dizia entre outras pérolas o elegante torpedo.
Experiência de vida e/ou idade também não livram ninguém de cair no conto do foca amestrado que acaba no sofá. Depois de quase 50 anos de casamento, viúva e dona de razoável pensão, a tia de uma amiga reencontrou a alegria de viver em bailes da terceira idade. Até uma dor eterna no joelho sumiu, levada pelo ritmo da música. Nessa balada ela encontrou um senhor distinto, pé de valsa, que começou a fazer-lhe a corte. Entre pegar na mão respeitosamente e irem morar juntos – na casa dela, é claro – passaram-se rapidíssimos quatro meses.
A família comentou, não achou de bom tom nem a pressa nem a falta de papel passado, mas a vingança do falecido não tardou a vir do além. Com casa, comida e roupa lavada, o novo marido começou a ter enorme preguiça em freqüentar os bailes das noites de sábado, cortados sumariamente da agenda do casal. Aos domingos, lépido e fagueiro depois de uma noite aboletado na frente da televisão, vai encontrar amigos antigos, enquanto ela fica em casa preparando o almoço – ele acha caro e desconfortável encarar fila de restaurante. Ela não consegue simplesmente livrar-se dele, até para não dar o braço a torcer para a família. E a dor do joelho voltou com tudo.
Anabel Serranegra quer encarnar La Fontaine para recontar a fábula do marido-cigarra, aquele que canta incansavelmente enquanto a mulher viaja com as crianças de férias.
Nota: Anabel tem uma coluna chamada O Diário da Perua. Metida a escritora e jornalista - não, ela não é modelo e atriz - tem uma cabeça que funciona como mix do pensamento vivo de Danuza Leão com o Casseta e Planeta. A auto-intitulada perua tem mais 30 e menos de 40 anos - assim como a idala Danuza, ela se recusa ferozmente a revelar a verdadeira idade. Quem sabe em um futuro livro de memórias? Tudo de bom. Anabel tem o mundo como limite - sexo, homens, filhos, televisão, política, celebridades, consumo, viagens, nada escapa à curiosidade dela. Como também gosta muito de se mostrar e mostrar sua coluna, resolveu assumir o convite que foi feito à sua criadora, a jornalista e escritora Ruth Barros, para escrever no Comunique-se.
* Maria Ruth de Moraes e Barros, formada em Jornalismo pela UFMG, começou carreira em Paris, em 1983, como correspondente do Estado de Minas, enquanto estudava Literatura Francesa. De volta ao Brasil trabalhou em São Paulo na Folha, no Estado, TV Globo, TV Bandeirantes e Jornal da Tarde. Foi assessora de imprensa do Teatro Municipal e autora da coluna Diário da Perua, publicada pelo Estado de Minas e pela revista Flash, com o pseudônimo de Anabel Serranegra.
Teria graça se não fosse verdade. A dança do acasalamento dura o tempo de uma música. Depois, nunca mais! Ou quase isso.
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