

Alguém ainda torce pelo Bangu?
* Por Gustavo do Carmo
A ideia de escrever esta crônica surgiu durante um sonho. Estava em uma aula quando de repente o professor perguntou os clubes pelos quais os alunos torciam. O pessoal ia respondendo: Flamengo, Vasco, Fluminense, Botafogo... Alguns citaram o América. Eis que um deles, muito constrangido, tímido, responde quase murmurando: Bangu. O professor não entendeu e pediu para o jovem repetir mais alto. O rapaz foi aumentando gradualmente o tom de voz até falar num volume audível, educado para o professor e a turma, mas impaciente para ele mesmo: BANGU!
Alguns caíram na gargalhada. Outros tentaram segurar o riso. Não lembro se o professor chegou a comentar alguma coisa. Só lembro de ter pousado a minha mão sobre o ombro do rapaz, negro, e ter falado com ele:
— Tá escondendo que torce pelo Bangu por quê? Assume a paixão pelo seu time, ora! Não tem gente que torce pelo América?
Pois é. Logo depois, acordei. De volta para a realidade, pensei: alguém ainda torce pelo Bangu? Já estou careca de saber que a torcida do América só consegue lotar uma Kombi. Tem muita gente famosa torcendo pelo time da Tijuca, mas conheço poucos que torcem pelo time do estádio proletário Moça Bonita.
O Bangu Atlético Clube foi fundado no dia 17 de abril de 1904 por funcionários ingleses da Fábrica de Tecidos Bangu, do bairro da Zona Oeste do Rio de Janeiro. O clube ajudou a fundar a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro, então Distrito Federal, e disputou o primeiro Campeonato Carioca de 1906. Foi um dos que popularizaram o futebol entre a classe operária e o primeiro a combater o racismo no esporte.
Por ter muitos jogadores negros, um dirigente de um time adversário debochou: “Como tem crioulo nesse time!”. O então presidente Antônio Pedroso respondeu: “Crioulos não! Mulatinhos rosados”, em referência à tonalidade do uniforme vermelho e branco listrado verticalmente.
O Bangu foi Campeão Carioca em 1933 e em 1966. Revelou craques como Domingos e Ademir da Guia (que foi brilhar no Palmeiras), Cláudio Adão e Marinho. Mas sua melhor fase, que embora não tenha sido premiada com um título, foi na década de 1980, quando era gerido pelo bicheiro Castor de Andrade, numa época em que o dinheiro circulava à vontade. Em 1985, o Bangu foi vice-campeão brasileiro (perdendo nos pênaltis para o Coritiba, do Paraná, no Maracanã lotado por torcedores dos quatro grandes) e vice carioca, perdendo uma decisão polêmica para o Fluminense do árbitro José Roberto Wright.
Era uma época boa para ter torcedores do clube fabril entre meus colegas de escola, que começavam a descobrir o futebol quando crianças. Mas não tinha nenhum banguense. Ou não lembro de ninguém. Nem no primeiro grau, no segundo e nem nas duas faculdades que eu fiz.
Pessoalmente, eu só lembro de um casal de amigos da minha mãe que torcia para o Bangu. Aliás, só a esposa, já falecida. O marido, do qual não tenho mais notícias, não lembro se torcia mesmo. De personalidades só conheço o ator Nuno Leal Maia. Mas conversando com um amigo enquanto escrevia esta crônica, ele me disse que o Jorge Amado também torcia. Só que esse aí, claro, já é falecido como a amiga da minha mãe.
No final dos anos 80 a história do Bangu começou a ruir. Chegou a disputar a primeira divisão do Campeonato Brasileiro de 1988, mas caiu para a terceira, voltou para a segunda numa manobra política e em 1995, virou até pauta de matéria da revista Placar, que acompanhou um jogo contra o Coritiba, pela série B do Brasileiro. Era a comparação da final gloriosa de 1985 contra o jogo de tabela decadente dez anos depois.
Em 1999 o Bangu viveu uma expectativa supersticiosa de conquistar o título carioca só porque os anteriores foram vencidos num intervalo de 33 anos. Contratou até o então jogador Renato Gaúcho. Não deu em nada. Quase foi rebaixado.
O destino se cumpriu em 2004, exatamente no ano do seu centenário. Dois anos antes, se sentiu mais uma vez roubado pelo Fluminense no Campeonato Carioca disputado em plena Copa do Mundo em que o Brasil ganhou o penta. Ninguém viu. Nem o juiz.
A popularidade do Bangu já estava tão baixa que ele demorou para voltar à primeira divisão do Campeonato Carioca, o que aconteceu apenas em 2009, mesmo assim, com um time emprestado pelo Madureira. A queda do América foi tão comovente que o clube pediu ajuda ao Romário e ele ficou apenas um ano na segunda divisão. O Bangu ficou durante quatro.
Ah! Lembrei de um segundo torcedor ilustre do Bangu ainda vivo: o presidente da Federação do Estado do Rio, Rubens Lopes, que aliás, negociou a parceria com o Madureira.
Espero eu esteja quebrando a minha cara escrevendo esta crônica e, assim que eu publicar no Tudo Cultural e no Literário, receber uma enxurrada de torcedores orgulhosos e que, de preferência, não morem no bairro: “EU TORÇO PELO BANGU COM MUITO ORGULHO!”
Mas, por enquanto, ainda tenho que perguntar se alguém, além do Rubens Lopes e do Nuno Leal Maia, ainda torce pelo Bangu. Sei que o clube também tem a sua história e suas glórias, como diz o hino, mas ainda tem torcida?
* Jornalista e publicitário de formação e escritor de coração. Publicou o romance “Notícias que Marcam” pela Giz Editorial (de São Paulo-SP) e a coletânea “Indecisos - Entre outros contos” pela Editora Multifoco/Selo Redondezas - RJ. Seu blog, “Tudo cultural” - www.tudocultural.blogspot.com é bastante freqüentado por leitores
* Por Gustavo do Carmo
A ideia de escrever esta crônica surgiu durante um sonho. Estava em uma aula quando de repente o professor perguntou os clubes pelos quais os alunos torciam. O pessoal ia respondendo: Flamengo, Vasco, Fluminense, Botafogo... Alguns citaram o América. Eis que um deles, muito constrangido, tímido, responde quase murmurando: Bangu. O professor não entendeu e pediu para o jovem repetir mais alto. O rapaz foi aumentando gradualmente o tom de voz até falar num volume audível, educado para o professor e a turma, mas impaciente para ele mesmo: BANGU!
Alguns caíram na gargalhada. Outros tentaram segurar o riso. Não lembro se o professor chegou a comentar alguma coisa. Só lembro de ter pousado a minha mão sobre o ombro do rapaz, negro, e ter falado com ele:
— Tá escondendo que torce pelo Bangu por quê? Assume a paixão pelo seu time, ora! Não tem gente que torce pelo América?
Pois é. Logo depois, acordei. De volta para a realidade, pensei: alguém ainda torce pelo Bangu? Já estou careca de saber que a torcida do América só consegue lotar uma Kombi. Tem muita gente famosa torcendo pelo time da Tijuca, mas conheço poucos que torcem pelo time do estádio proletário Moça Bonita.
O Bangu Atlético Clube foi fundado no dia 17 de abril de 1904 por funcionários ingleses da Fábrica de Tecidos Bangu, do bairro da Zona Oeste do Rio de Janeiro. O clube ajudou a fundar a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro, então Distrito Federal, e disputou o primeiro Campeonato Carioca de 1906. Foi um dos que popularizaram o futebol entre a classe operária e o primeiro a combater o racismo no esporte.
Por ter muitos jogadores negros, um dirigente de um time adversário debochou: “Como tem crioulo nesse time!”. O então presidente Antônio Pedroso respondeu: “Crioulos não! Mulatinhos rosados”, em referência à tonalidade do uniforme vermelho e branco listrado verticalmente.
O Bangu foi Campeão Carioca em 1933 e em 1966. Revelou craques como Domingos e Ademir da Guia (que foi brilhar no Palmeiras), Cláudio Adão e Marinho. Mas sua melhor fase, que embora não tenha sido premiada com um título, foi na década de 1980, quando era gerido pelo bicheiro Castor de Andrade, numa época em que o dinheiro circulava à vontade. Em 1985, o Bangu foi vice-campeão brasileiro (perdendo nos pênaltis para o Coritiba, do Paraná, no Maracanã lotado por torcedores dos quatro grandes) e vice carioca, perdendo uma decisão polêmica para o Fluminense do árbitro José Roberto Wright.
Era uma época boa para ter torcedores do clube fabril entre meus colegas de escola, que começavam a descobrir o futebol quando crianças. Mas não tinha nenhum banguense. Ou não lembro de ninguém. Nem no primeiro grau, no segundo e nem nas duas faculdades que eu fiz.
Pessoalmente, eu só lembro de um casal de amigos da minha mãe que torcia para o Bangu. Aliás, só a esposa, já falecida. O marido, do qual não tenho mais notícias, não lembro se torcia mesmo. De personalidades só conheço o ator Nuno Leal Maia. Mas conversando com um amigo enquanto escrevia esta crônica, ele me disse que o Jorge Amado também torcia. Só que esse aí, claro, já é falecido como a amiga da minha mãe.
No final dos anos 80 a história do Bangu começou a ruir. Chegou a disputar a primeira divisão do Campeonato Brasileiro de 1988, mas caiu para a terceira, voltou para a segunda numa manobra política e em 1995, virou até pauta de matéria da revista Placar, que acompanhou um jogo contra o Coritiba, pela série B do Brasileiro. Era a comparação da final gloriosa de 1985 contra o jogo de tabela decadente dez anos depois.
Em 1999 o Bangu viveu uma expectativa supersticiosa de conquistar o título carioca só porque os anteriores foram vencidos num intervalo de 33 anos. Contratou até o então jogador Renato Gaúcho. Não deu em nada. Quase foi rebaixado.
O destino se cumpriu em 2004, exatamente no ano do seu centenário. Dois anos antes, se sentiu mais uma vez roubado pelo Fluminense no Campeonato Carioca disputado em plena Copa do Mundo em que o Brasil ganhou o penta. Ninguém viu. Nem o juiz.
A popularidade do Bangu já estava tão baixa que ele demorou para voltar à primeira divisão do Campeonato Carioca, o que aconteceu apenas em 2009, mesmo assim, com um time emprestado pelo Madureira. A queda do América foi tão comovente que o clube pediu ajuda ao Romário e ele ficou apenas um ano na segunda divisão. O Bangu ficou durante quatro.
Ah! Lembrei de um segundo torcedor ilustre do Bangu ainda vivo: o presidente da Federação do Estado do Rio, Rubens Lopes, que aliás, negociou a parceria com o Madureira.
Espero eu esteja quebrando a minha cara escrevendo esta crônica e, assim que eu publicar no Tudo Cultural e no Literário, receber uma enxurrada de torcedores orgulhosos e que, de preferência, não morem no bairro: “EU TORÇO PELO BANGU COM MUITO ORGULHO!”
Mas, por enquanto, ainda tenho que perguntar se alguém, além do Rubens Lopes e do Nuno Leal Maia, ainda torce pelo Bangu. Sei que o clube também tem a sua história e suas glórias, como diz o hino, mas ainda tem torcida?
* Jornalista e publicitário de formação e escritor de coração. Publicou o romance “Notícias que Marcam” pela Giz Editorial (de São Paulo-SP) e a coletânea “Indecisos - Entre outros contos” pela Editora Multifoco/Selo Redondezas - RJ. Seu blog, “Tudo cultural” - www.tudocultural.blogspot.com é bastante freqüentado por leitores
História muito interessante desse bravo time. Espero que a crônica desafie essa turma a melhorar e voltar a subir na tabela. A provocação é uma arma que tem poder.
ResponderExcluirOlha Gustavo, torci pelo Corinthians anos, anos e anos, acho que mais de vinte, sofrendo as piores gozações, mas quando alguém me perguntava por qual time torcia, respondia com o maior orgulho: pelo Corinthians! E se alguém cobrava melhor desempenho do meu time, justificava com a desculpa que todos nós sustentamos por anos e anos: tinham enterrado um despacho no campo pra meu time não ganhar. Pura inveja, Gustavo! Pura inveja do melhor time do país...rsrsrs
ResponderExcluirBeijos
Não conheço nenhum torcedor do Bangu e jamais
ResponderExcluirteria vergonha de assumir caso fosse, porém
confesso com orgulho incontido a minha paixão
pelo Flamengo!!!!
Beijos