

Para uma foto de 1971
* Por Urariano Mota
Em 1971, Porto de Galinhas era o paraíso, sem asfalto, a que se tinha acesso por entre floresta de coqueiros e barro.
Chegamos ali de manhã, depois de uma noite inteira de álcool, da Casa de Caruaru a um bar na Encruzilhada, onde, escondidos, na parte de trás (vivíamos o tempo todo escondidos), ouvimos a noite inteira Yellow Submarine na radiola wurlitzer. Bebíamos e batíamos os copos, a repetir o refrão (ninguém sabia inglês): "we all live in yellow submarine, yellow submarine...". Queríamos dizer, bêbados: "o mundo todo é um submarino amarelo", porque estávamos bêbados.
Era uma sexta-feira de madrugada, quando no grupo (eu, Alfredo, Geraldo Galo Cego, Graça, Spinelli) o mais festivo e irresponsável de nós - quem? Spinelli, claro - propôs: "Vamos a Porto de Galinhas". Aceitamos sob urras. Lá em Porto de Galinhas estavam Maridite, Betinha (uma das namoradas utópicas de Spinelli), e uma gangue boa, do movimento estudantil de medicina da UFPE.
Alfredo não queria ir, pois como iria justificar em casa? Então Spinelli, sempre ele, mais uma vez achou a saída: "Diga que o tio de um amigo, o tio Sebastião / teve um infarto do coração". Eu observei, apesar do muito álcool no sangue, que desculpa com rima não colava. Mas na falta de outra, Alfredo deixou um bilhete em casa, que o seu pai, incrédulo, leu pela manhã
"Volto amanhã. O tio Sebastião teve um infarto do coração". O pior é que, na pressa, nem explicou de quem Tião, que morrera do coração, era tio.
E fomos, com Alfredo na vemaguete, a 120 por hora (velocidade máxima do carro), de marcha royal. Às seis da manhã, Alfredo tinha os olhos injetados, sanguíneos, grandes e se fechavam por breves segundos na rodovia que levava para o Cabo. A minha função era ficar de olho no olho dele, para lhe dar pontadas nas costelas. "Acorda, olha a estrada". E ele, irritado: "eu não estou dormindo!".
Estava, e eu o acordava, e por isso não entramos de vez em um submarino amarelo.
Achamos o caminho não sei como. Lembro que na antiga Rodoviária eu desci e perguntei a um dos guardas "para que lado fica Porto de Galinhas". E no rumo do ali à esquerda, achamos.
Quando lá chegamos, acordamos todas as meninas (aquelas mesmas que não nos queriam e nós tanto queríamos) aos berros: "olha o leite, olha o leite!".
O melhor da viagem é chegar. Súbito, alguém, e dessa vez não foi Spinelli, teve a ideia de tirar uma foto. Nela, Spinelli imita Lenin (perdoem, essa era a sua intenção), Galo Cego, o galego míope, na foto sem óculos, imita Paulo Francis (perdoem mais uma vez, essa era a sua intenção), Gracinha nos estimula, dá corda, e um certo indivíduo, no meio da angústia daqueles anos, sorri para a câmera. Dá a impressão de estar feliz. Estava bêbado.
* Escritor e jornalista
* Por Urariano Mota
Em 1971, Porto de Galinhas era o paraíso, sem asfalto, a que se tinha acesso por entre floresta de coqueiros e barro.
Chegamos ali de manhã, depois de uma noite inteira de álcool, da Casa de Caruaru a um bar na Encruzilhada, onde, escondidos, na parte de trás (vivíamos o tempo todo escondidos), ouvimos a noite inteira Yellow Submarine na radiola wurlitzer. Bebíamos e batíamos os copos, a repetir o refrão (ninguém sabia inglês): "we all live in yellow submarine, yellow submarine...". Queríamos dizer, bêbados: "o mundo todo é um submarino amarelo", porque estávamos bêbados.
Era uma sexta-feira de madrugada, quando no grupo (eu, Alfredo, Geraldo Galo Cego, Graça, Spinelli) o mais festivo e irresponsável de nós - quem? Spinelli, claro - propôs: "Vamos a Porto de Galinhas". Aceitamos sob urras. Lá em Porto de Galinhas estavam Maridite, Betinha (uma das namoradas utópicas de Spinelli), e uma gangue boa, do movimento estudantil de medicina da UFPE.
Alfredo não queria ir, pois como iria justificar em casa? Então Spinelli, sempre ele, mais uma vez achou a saída: "Diga que o tio de um amigo, o tio Sebastião / teve um infarto do coração". Eu observei, apesar do muito álcool no sangue, que desculpa com rima não colava. Mas na falta de outra, Alfredo deixou um bilhete em casa, que o seu pai, incrédulo, leu pela manhã
"Volto amanhã. O tio Sebastião teve um infarto do coração". O pior é que, na pressa, nem explicou de quem Tião, que morrera do coração, era tio.
E fomos, com Alfredo na vemaguete, a 120 por hora (velocidade máxima do carro), de marcha royal. Às seis da manhã, Alfredo tinha os olhos injetados, sanguíneos, grandes e se fechavam por breves segundos na rodovia que levava para o Cabo. A minha função era ficar de olho no olho dele, para lhe dar pontadas nas costelas. "Acorda, olha a estrada". E ele, irritado: "eu não estou dormindo!".
Estava, e eu o acordava, e por isso não entramos de vez em um submarino amarelo.
Achamos o caminho não sei como. Lembro que na antiga Rodoviária eu desci e perguntei a um dos guardas "para que lado fica Porto de Galinhas". E no rumo do ali à esquerda, achamos.
Quando lá chegamos, acordamos todas as meninas (aquelas mesmas que não nos queriam e nós tanto queríamos) aos berros: "olha o leite, olha o leite!".
O melhor da viagem é chegar. Súbito, alguém, e dessa vez não foi Spinelli, teve a ideia de tirar uma foto. Nela, Spinelli imita Lenin (perdoem, essa era a sua intenção), Galo Cego, o galego míope, na foto sem óculos, imita Paulo Francis (perdoem mais uma vez, essa era a sua intenção), Gracinha nos estimula, dá corda, e um certo indivíduo, no meio da angústia daqueles anos, sorri para a câmera. Dá a impressão de estar feliz. Estava bêbado.
* Escritor e jornalista
Passamos um feriadão numa casinha no alto da serra
ResponderExcluirem Friburgo. O conhaque não deu nem pra saída.
O pessoal de porre resolveu ir pra sauna e a doida
aqui junto com eles. Na volta pra casinha, foi um tal de um escorrega daqui e outro dali.
Muita lama na idéia e gargalhadas na escuridão.
Beijos
Alguns passeios ficam gravados e encravados na memória que ocupam vários capítulos da nossa vida. Tenho um passeio aos 13 anos de idade no Parque Muncipal da minha cidade, onde ouvimos muitas vezes a música " I started the joke", com Bee Gees, que nunca mais se desgarrou dessa música. É ouvi-la e o passeio volta, mesmo 41 anos depois. Quando chegamos fomos punidas. Éramos meninas de um colégio de freiras que matamos aula no sábado (com autorização de uma das professoras freiras que depois negou tudo), e tivemos de fazer prova final de duas disciplinas. A lição que tirei desse castigo é que não devemos confiar em freiras professoras. Elas morrem de medo de assumir as suas decisões. Relatos como o seu Urariano, servem para fazer voltar o filme. Obrigada!
ResponderExcluirSou eu que agradeço, Mara e Núbia.
ResponderExcluirAbraços.