domingo, 12 de abril de 2009




É a vida: “ovo” de chocolate em pó


* Por Seu Pedro


Fiquei comovido com a maneira de um pobre menino encarar a vida. Ele é o “Quinzinho”, por ter nome de Joaquim, ser raquítico, e ter “mesada” de quinze centavos por semana. Mas nem sempre é chamado pelo apelido, pois ele não gosta. Sabe que “Quinzinho” é também apelido de político ladrão, que sendo corrupto, recebe quinze por cento da obra contratada.

Ele tem somente nove anos, mas parece ter seis, por isto a sua inteligência se sobressai. “Tão pequenino e tão inteligente!”, dizem os que não o conhecem, perplexos com suas respostas. É de uma família de mãe abandonada, com seis filhos para criar, e o mais velho é ele, que com corpo franzino, faz duas ou três viagens para entregar a roupa lavada, para terceiros.

No barraco onde mora, um aparelho de TV, ainda preto & branco, sem controle-remoto, é a diversão. Dona Maria, quando quer desligar o aparelho, para que as crianças venham almoçar, e também para economizar energia, lá da cozinha puxa a extensão da tomada.

O almoço é rico, quase sempre sobras de comida de algumas mansões, e na mesa, há garrafas de refrigerantes, enchidas com água fresca. Geladeira só quando “Quinzinho” arrumar um emprego. Os domingos são legais e eles alimentam a esperança, a cada dia, de chegar a data de cada um receber os R$ 0,15 e comprar um “geladinho” de frutas.

Na hora do recreio, na escola pública, onde a merenda vale um almoço, Quinzinho só vai brincar depois de devorar dois pratos do macarrão com molho. É prevenido. Volta e meia, ganha pastéis dormidos, na lanchonete da esquina, mas não os come só. Divide-os com os irmãos menores, e reserva um para a mulher de sua pobre vida: sua mãe. E assim o “Quinzinho”, honesto, vai levando a vida, alheio ao conforto, e sem inveja dos seus xarás políticos.

No início do ano, com seu humor, ao ser perguntado como foi o Natal, respondeu: “Foi bom. Os outros meninos ganharam presentes da árvore. Eu ganhei a árvore”. Só não explicou que o presente chegou um pouco atrasado, no dia seis de janeiro. Só veste roupas finas e boas. Finas de tão usadas. Boas de serem jogadas no lixo, mas que a sociedade cisma que pobre tem que aproveitar.

“Quinzinho” é um cara cem por cento. Não é com outros meninos, que estão sempre brigando. Garante que nunca será como aquele garoto que colocou uma placa no pára-choque da bicicleta, e que vivia mostrando para as meninas da escola: “Quero te atropelar, para ter o prazer de te socorrer”. O menino alegre e conformado dizia: “Quando tiver uma bicicleta, não vou atropelar ninguém. E vou ganhar uma moto quando eu crescer”. Os colegas riam e perguntavam: “E você vai crescer?”

Ele e os irmãos só bebem leite porque um senhor manda um litro tirado de uma vaca da roça, e que em casa vira litro e meio com água complementar. E era hora de sonhar! Veio chegando a Páscoa, tempo de passagem, de renascimento da vida. “Quinzinho” e irmãos sonhavam com chocolates em forma de ovos, nem que fosse do tamanho de ovo de codorna. Mas o ovo gorou.

Chegou a Páscoa e sua mãe, saindo da rotina das economias, comprou, para festejar a data, um pacote de achocolatado, desses de um real e pouco, usados nas refeições matinais de outras famílias. Veio o domingo. A missa não foi a cores. Com a igreja cheia de gente fina, como iriam assistir a missa ao vivo, com as “finas” roupas que tinham? Assistiram na velha TV em preto & branco e ouviram o bispo falar que excomungava até se fosse preciso.

Páscoa é um dia especial, de amor, celebração e comemoração de uma nova vida. Os meninos vizinhos, com os beiços lambuzados de chocolates tirados do ovo, riram quando ele, com um copo do chocolate diluído no leite, brindou: “viva o nosso o ovo de páscoa em pó!!!”
Nesta Páscoa, compre um ovo de chocolate a mais.

(*) Seu Pedro é o jornalista Pedro Diedrichs, editor do jornal Vanguarda, de Guanambi, Bahia.

Um comentário:

  1. A pobreza dá boas histórias, mas não tem graça alguma.Os remediados dão os seus restos com a ilusão de que compram um lugar no céu, já que o lugar ao sol já está mais do que garantido.

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