Misterioso fascínio
Eu nunca consegui entender a
razão do futebol, esporte relativamente recente (pelo menos com as 17 regras
atuais que o regulam) – originalmente voltado à elite – despertar tamanho
interesse, fascínio e, sobretudo, paixão.
Num piscar de olhos, em somente
168 anos de existência (foi oficializado em 1846, do jeito que o conhecemos na
atualidade, na Inglaterra), ou seja, no tempo de apenas cinco ou seis gerações,
se tornou foco de atração para, no mínimo, dois terços dos mais de 7 bilhões de
habitantes do Planeta.
A FIFA, hoje, por exemplo, tem
número maior de membros do que a Organização das Nações Unidas (ONU). Por que?
Para mim, é um mistério. Estima-se que cerca de quatro bilhões de pessoas estão
acompanhando, ou pela televisão, ou por rádio, ou por outro meio qualquer, a
atual Copa do Mundo. Nenhum outro tipo de espetáculo, seja artístico, seja
esportivo ou de que natureza for, sequer se aproxima dessas cifras.
Há quem garanta (vejam só), que o
futebol (ou coisa remotamente parecida com ele), surgiu na China (que
futebolisticamente, convenhamos, deixa tudo a desejar e é um zero à esquerda),
entre os anos de 3000 e 2500
AC . Vá lá! Que seja! Da minha parte, considero como data
da sua verdadeira criação a ocasião em que foi regulamentado e ganhou suas 17
regras, com as quais os árbitros tomam suas decisões (ao menos teoricamente,
pois na prática...). Ou seja, o ano de 1846.
Nesta altura, a bola está
“pingando” a caráter para um sem-pulo a gol e não vou deixar passar a oportunidade.
O tema enseja-me algumas considerações, digamos, históricas, posto que sem o
rigor do historiador.
Pode-se dizer, sem grandes
margens para erro, que a Grécia Antiga foi o verdadeiro berço dos esportes de
competição. Desses que, ao final das disputas, emerge um vencedor, mas em que o
perdedor não é sacrificado. Ou seja, pelo menos permanece vivo e fisicamente
incólume.
Considera-se, oficialmente, que
as primeiras modalidades esportivas surgiram com os também primeiros Jogos
Olímpicos, disputados ao pé do Monte Olimpo, em homenagem ao deus Zeus. E isso
ocorreu em 776 AC ,
ou por volta desse ano.
O objetivo primário era o de
adestrar os jovens e os soldados gregos, desenvolvendo suas habilidades físicas
e um saudável espírito de competição. Isto é, ensiná-los tanto a vencer, quanto
a perder, ambas as coisas muito importantes, quer nos esportes, quer, e
principalmente, na vida. A isso convencionou-se chamar de “espírito esportivo”.
Até então, diga-se de passagem,
tanto na Grécia, quanto (e principalmente) entre outros povos, não havia nada
sequer parecido com o conceito de esporte. Ninguém se exercitava por prazer, ou
para se adestrar, ou para competir. Os exercícios executados pelo homem tinham,
todos, motivação prática. Eram involuntários, ditados pela necessidade e pelas
circunstâncias. Destinavam-se, por exemplo, à busca de caça para assegurar a
sobrevivência ou à defesa pessoal, da tribo e do patrimônio, nas guerras.
Sobre as modalidades olímpicas
primitivas, um excelente texto que encontrei no site Historianet (www.historianet.com.br) nos informa,
com grande objetividade, quais eram. Diz: “Os primeiros jogos limitavam-se a
uma única corrida com cerca de 192 metros . Em 724 AC , introduziu-se uma nova modalidade, semelhante
aos atuais 400 metros
rasos. Em 708 AC ,
acrescentou-se o pentatlo (competição formada por cinco modalidades atléticas,
incluindo-se a luta livre, salto de distância, corrida, lançamento de disco e
lançamento de dardo) e, posteriormente, o pancrácio (luta similar ao boxe.
(...) Em 608 AC ,
foi incluída a corrida de carros”.
Observe-se que nenhum desses
esportes era coletivo. Era cada um por si... Mas os maias antigos, do outro
lado do mundo, na América do Norte e parte da América Central (os mesmos que
recentemente estiveram em evidência por terem supostamente previsto o fim do
mundo para 21 de dezembro de 2012), no auge da sua civilização, contavam com
uma modalidade esportiva muito popular na ocasião. Era um jogo de bola que,
forçando um pouco a barra, podemos dizer que misturava um tanto de futebol e
outro tanto de basquete, sem ser, propriamente, nem uma e nem outra dessas
modalidades.
Até hoje existem vestígios dos
campos em que se praticavam esse esporte, popularíssimo na época que, na
verdade, tinha o caráter de ritual religioso (dos mais selvagens e dramáticos).
Tanto que eles se situavam, quase sempre, no recinto de algum templo – como o
de Tonina, na atual cidade mexicana de Chiapas. Um dos maiores deles
localizava-se no interior do complexo sagrado de Chichén Itzá.
O jogo era disputado por duas
equipes, com sete jogadores cada, sendo um deles o capitão. Os atletas maias
podiam tocar na bola – grande e feita de látex concentrado – apenas com os pés
e os quadris. O objetivo era colocá-la por entre um dos três arcos de pedra,
ornados de duas serpentes que se entrelaçavam, com a cabeça e a cauda quase se
tocando, que ficavam a uma altura de cerca de vinte metros. Requeria, pois,
muita habilidade e força dos participantes.
Cada jogador trajava sua mais
rica veste, não raro com adornos de guerra. Todavia, não era bom negócio vencer
as partidas. Vejam só, o capitão da equipe vencedora (justo ele), em vez de
receber algum prêmio, alguma medalha, homenagem ou taça, era sacrificado ao
término do jogo, em honra aos deuses. Eu, hein!!!
Terminada a disputa, esse atleta,
geralmente o de maior destaque por sua habilidade e força, ajoelhava-se junto à
bola e era decapitado, com um só golpe certeiro, pelo sacerdote. O jogo, pois,
estava diretamente ligado à idéia de morte. O curioso é que os times sempre se
empenhavam ao máximo pela vitória. Os capitães sentiam-se sumamente honrados
por poderem oferecer suas vidas às cruéis e sanguinárias divindades maias. Ah,
se a moda pega!
Por essas e outras, prefiro, um
trilhão de vezes, o futebol, mesmo que se trate de uma partida chatérrima, de
dois times pernas de pau, com um árbitro desses horrorosos (que a gente vê por
aí apitando jogos do Campeonato Brasileiro), que resulte num deprimente e
sonolento zero a zero. Nele, pelo menos, entre “mortos e feridos”, todos se
salvam.
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Assustador, mas ainda hoje, não em esportes, mas em outras situações de conflitos, os homens continuam fazendo suas decapitações, apedrejamentos, amputações e toda a sorte de torturas a quem não é do grupo deles. Também prefiro o futebol.
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