Literário

Top 15 desenhos do Pica-pau

* Por Fernando Yanmar Narciso

Bem, como não podia deixar de ser, resolvi fazer minha própria seleção dos episódios do Pica-pau que eu considero os melhores. Muitas escolhas podem acabar irritando os fãs mais xiitas do personagem, mas não há no mundo um fã mais xiita que eu!

1- Amigos penosos(1946) Em toda lista de melhores desenhos do Pica-pau sempre aparecem três capítulos que são hors concours, nem compensam ser mais reverenciados do que já são: Vamos às cataratas(1956), sinônimo de desenho do Pica-pau aqui no Brasil; A vassoura da bruxa(1955), que eu não gosto muito- e O barbeiro de Sevilha (1944), que eu desprezo. Para mim, o maior clássico do personagem é, na verdade, dois capítulos que se completam, e por sinal são duas versões de um dos primeiros desenhos do personagem, Pânico na cozinha (1941). Aqui, Pica-pau e o Lobo Mau convivem em plena harmonia em seu barco, se empanturrando como dois Calígulas em alto mar. Daí vem um tufão – não o da novela- e os arrasta para uma ilha deserta. Sem comida em todo o território além de um ganso mais esperto que os dois, eles não vêem alternativa senão um trair a confiança do outro e voltarem à batalha sádica e esfomeada de Quem cozinha quem? Com passagens de cena e piadas mais coerentes que as do antecessor, a cena da “sopa de lobo” é icônica, e o capítulo merecia um Oscar.

2- Quem cozinha quem?(1946) Este desenho veio antes do meu 1º lugar, e como dito antes, tem praticamente a mesma premissa. James Culhane foi o diretor dos desenhos do passarinho de 44 a 47. Ele deve sua personalidade mais malandra e anárquica ao tiozinho de boina, fã de Sergei Eisenstein. Vemos o topetudo lendo As Formigas e o Gafanhoto, de La Fontaine, sem acreditar na história. Ele cai no sono e logo se vê preso pela neve dentro de casa, sem um farelinho para pôr no bico. De tão desesperado, se veste de Chapeuzinho Vermelho e sai à caça de um Lobo Mau para fazer lobo assado, ao passo que o lobo, também faminto, quer depenar o pássaro e fazer churrasco com ele. O resto do desenho é uma típica batalha de desenho animado, com um tentando comer o outro das formas mais sádicas possíveis- sem malícia, crianças... Há diversas pistas em todo o desenho que mostram que Pica-pau está na verdade sonhando com tudo, como as gags culinárias que “viram a mesa” sem nenhuma explicação. Simplesmente inesquecível!

3- Concerto na marra(1954)- O legendário pioneiro da animação Hugh Harman trabalhou por um curto tempo ao lado de Walter Lantz, quando ele reestruturava seu estúdio de animações, e deu ao “patrão” poucas e excelentes contribuições, sendo esta a melhor. Noutra rendição da Rapsódia Húngara de Franz Liszt, que já havia sido tema de desenhos de Tom e Jerry e do Pernalonga, Pica-pau trabalha como afinador de pianos numa loja e se encontra refém de um bandidão que carrega um saco de dinheiro e um revólver que mais parece uma bazuca. Escondido dentro do piano, ele força o passarinho a tocar sem parar, enquanto foge da polícia. A perseguição de carro entre a viatura e o caminhão dos bandidos e o passarinho tendo um ataque de epilepsia no final, de tanto tocar piano, não têm preço.

4- Roubando gasolina(1947)- Depois que Culhane abandonou o estúdio da Universal, Dick Lundy, diretor dos desenhos do Pato Donald, tornou-se o diretor oficial da empresa, após um ano de "estágio". Ele humanizou o personagem, e trouxe lições moralistas no final de cada desenho. Agora ele podia até aprontar durante toda a fita, mas tinha que pagar por seus erros no final. Aqui, o passarinho rouba gasolina do tanque de uma viatura, dirigida pelo guarda Leôncio- Quantos policiais vocês conhecem que trabalham de short e colete?- e se inicia a perseguição do dia. Depois de torturar a morsa durante todo o desenho, o pássaro acaba levando a pior: Leôncio imitando o Pica-pau e esguichando graxa na cara dele é uma das cenas mais engraçadas da história do cinema.

5- O Pica-pau na barbearia(1964)- Ele não devia ter saído da cama nesse dia... Enquanto aparava o penacho, Pica-pau é feito de refém na barbearia por Rei Luizinho, um leão que fugiu do circo, que não pára de torturar o penoso para que ele não o entregue às autoridades. Depois de muitas idas e vindas e de uma tentativa frustrada de entregar o leão para ganhar a recompensa, Pica-pau sofre a maior humilhação de sua vida no hilário, porém sádico, final.

6- Que lindinho o cachorrinho!(1964)- A estréia do cachorro amarelo com uma armadilha de urso no lugar dos dentes e o temperamento do Godzilla. Por acaso o Pica-pau acaba o comprando no Pet Shop e fica o desenho inteiro tentando trazê-lo para a pensão de Meany Ranheta- também estreante- que não permite cachorros no recinto. O rugido maníaco do cachorro antes de morder a Meany repetidas vezes é inesquecível.

7- Os três pica-paus(1965)- Episódio perdidaço, não passa no Brasil há décadas! Pegue os três porquinhos, troque por Pica-pau, Toquinho e Lasquita e já tens o enredo desse episódio engraçadíssimo. O lobo apalermado que vive retrucando todas as torturas que sofre na mão dos pica-paus e o sotaque de Ribeirão Preto de Toquinho e Lasquita são clássicos!

8- Motorista desleixado(1946)- Me identifico muito com esse episódio, afinal, assim como o Pica-pau, não consigo tirar carteira de motorista e já fui muito trolado pelo instrutor da auto-escola. O pássaro não devia conseguir carteira nem pra brincar com um Hot Wheels, quem dirá dirigir um carro! Em seu final bizarro, ao esbarrar num extintor de incêndio, seu calhambeque se transforma num tipo de jato supersônico e ele vira a mesa contra o Leôncio, seu instrutor de direção.

9- A observadora de pássaros(1965)- Este não passa há muito tempo no Brasil. Sua última exibição foi na Globo, que o censurou simplesmente por ter uma musiquinha cantada pelo passarinho no meio do episódio. Aqui a Sra. Meany, estranhamente nada ranheta, se aventura pela ornitologia e acaba esbarrando com o Pica-pau na floresta, que não para de encher o saco da velhota por todo o desenho, nos últimos lampejos de sua fase mais sacana.

10- Auto- estrada fracassada(1964)- Por incrível que pareça, esse capítulo, que foi até citado na revista Veja como exemplo de selvageria nos desenhos animados, não tem nada de original. É um plágio praticamente quadro-a-quadro do desenho do Pernalonga No Parking Hare, de 1953. Pelo menos é um plágio bem feito, quase superior ao original. Pica-pau vive numa árvore no meio de um campo onde vai ser pavimentada uma estrada, o peão de obras Homero faz de tudo para derrubar a árvore e falha miseravelmente, sendo judiado pelo penoso de todas as formas possíveis, chegando até a ser achatado por um rolo compressor.

11- O vendedor insuportável(1957)- “E assim consegui o tapete de urso”. Pica-pau conta uma história para Toquinho e Lasquita sobre seus tempos de vendedor da Herbalife, quando conheceu o urso Charlie e fez de tudo para que ele comprasse seus produtos, chegando até a matá-lo!

12- Vivendo num buraco(1962)- “Em todos esses anos nesta indústria vital...” “Testando: Um, dois, três...” De tão inesquecíveis, acabei transformando essas falas em toques pro meu celular!

13- Hora do banho(1946)- Foi o que eu mais assisti quando pequeno, pois estava na 1ª coletânea em K-7 da saudosa CIC Video. Estréia de Dick Lundy no comando da série, aqui Pica-pau vive na pensão do Leôncio, que só quer tomar banho em paz na sua banheira. De repente bate um complexo de Tio Patinhas no bicudo, pois sua moedinha de 10 centavos desce pelo ralo e ele faz de tudo para recuperá-la, até dinamitar a pensão! Hum... Em tempos de plano Cruzado, isso até que fazia sentido...

14- Uma aventura no supermercado(1951)- Simplesmente uma das idéias mais bizarras que já conseguiram ter para um desenho animado! Escrito pela tropa de elite da Warner Bros.(Os roteiristas dos Looney Tunes Tedd Pierce e Warren Foster), aqui Pica-pau tenta sair com uma compra enorme do supermercado do Zeca Urubu sem pagar. De casualidade ele acaba entrando em contato com tinta invisível, que faz parecer que ele foi esquartejado! Ao perceber o que houve, o passarinho tem a idéia de cobrir o resto do corpo com a tinta e fazer de conta que o supermercado é mal-assombrado. Por causa de sua natureza macabra (Numa cena, Zeca urubu até se imagina condenado à forca!) este capítulo foi proibido no mundo todo e não passa mais no Brasil desde que a série deixou de ser propriedade do SBT.

15- Não puxem minhas penas(1961)- O passarinho, preso no meio de uma tempestade, acaba chegando ao castelo de um cientista maluco, que inventou um robô que tudo o que sabe fazer é depenar frangos. É estimulante ver o penoso levando a pior por quase um desenho inteiro pra variar, mas no final, claro, ele acaba virando a mesa. O robô, além de descerebrado, parece que é feito de Lego, pois qualquer tropicão o desmancha em mil pedaços.

*Designer e escritor. Site: HTTP://terradeexcluidos.blogspot.com.br