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Virago
* Por Daniel Santos
De saco cheio. Isso mesmo: de saco cheio – assim ela se sentia. E agora que marido e filhos não estavam, podia arranhar o verniz da civilização, abdicar batom e salto alto para resgatar antiga animalidade.
Ainda se obrigou arrumar as compras logo ao chegar do mercado. Depois ... Ah, que farra! Atirou longe os sapatos, ficou só de calcinha, fez macarrão e comeu na panela sem mastigar direito, farelos sobre a toalha.
Comeu de pernas abertas na cozinha, defronte à tevê, coçando a virilha sem o menor recato, que se enchera de princípios, de boas maneiras, das contenções várias que os homens costumam impor, mas ignoram.
Agora, como eles, cuspia comida sem pudor, enquanto cantarolava as músicas que as chacretes dançavam. Cada bunda, cada teta! E vibrava dando murros na mesa com autoridade de comandante, de proprietário!
Como era bom dar murros na mesa! Coçou a virilha, de novo, e enxugou a última garrafa de cerveja. Arrotou, enfim, com gosto. E entrou pela tarde esgravatando os dentes com palito, cuspindo longe os fiapos.
* Jornalista carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de "O Estado de São Paulo" e da "Folha de São Paulo", no Rio de Janeiro, além de "O Globo". Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.
* Por Daniel Santos
De saco cheio. Isso mesmo: de saco cheio – assim ela se sentia. E agora que marido e filhos não estavam, podia arranhar o verniz da civilização, abdicar batom e salto alto para resgatar antiga animalidade.
Ainda se obrigou arrumar as compras logo ao chegar do mercado. Depois ... Ah, que farra! Atirou longe os sapatos, ficou só de calcinha, fez macarrão e comeu na panela sem mastigar direito, farelos sobre a toalha.
Comeu de pernas abertas na cozinha, defronte à tevê, coçando a virilha sem o menor recato, que se enchera de princípios, de boas maneiras, das contenções várias que os homens costumam impor, mas ignoram.
Agora, como eles, cuspia comida sem pudor, enquanto cantarolava as músicas que as chacretes dançavam. Cada bunda, cada teta! E vibrava dando murros na mesa com autoridade de comandante, de proprietário!
Como era bom dar murros na mesa! Coçou a virilha, de novo, e enxugou a última garrafa de cerveja. Arrotou, enfim, com gosto. E entrou pela tarde esgravatando os dentes com palito, cuspindo longe os fiapos.
* Jornalista carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de "O Estado de São Paulo" e da "Folha de São Paulo", no Rio de Janeiro, além de "O Globo". Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.
Muito bom Daniel!
ResponderExcluirFiquei imaginando a cena, mas cuspir é
uma coisa que não faço, muito feio.
O resto...vá lá.
Adorei!
beijos
Nossa, Daniel, quanto tempo esta mulher deve ter sido reprimida...
ResponderExcluirBeijos
Algumas vezes temos vontade de nos animalizar. Uma ocasião perguntei para um homem, que era artista na habilidade de utilizar talheres, se, em casa, estando sozinho, seguia o mesmo ritual. Ele afirmou que sim, para o meu descrédito. Uma vez meu filho, ainda criança, escutou uma mulher eliminar gases sem o devido recato e perguntou festivo: uai, as mulheres também fazem isso? Ele não sabia. Bela "porrada" nas nossas convenções.
ResponderExcluirÓtimo, Daniel! Nada como fazer o que se quer, ficar à vontade, sem ninguém para patrulhar! Abraço!
ResponderExcluirO belo sexo vai à forra. Ou à farra. E vai em grande estilo, na pena privilegiada do Daniel. Grande texto, amigo.
ResponderExcluirQue maravilha de conto ! Enfim, ela fez o que queria. Nada como a liberdade. A coitada devia andar muito reprimida e " chutou o balde" com vontade.
ResponderExcluirbj