No dia em que fui personagem do
Notícias Populares
* Por Pedro J. Bondaczuk
Um dia quando (na verdade “se”) eu escrever minhas memórias,
certamente não esquecerei de registrar a ocasião em que fui matéria do jornal “Notícias
Populares” de São Paulo, inclusive com chamada de primeira página e tudo mais.
Isso aconteceu há muito tempo, há 39 anos, num 1º de novembro de 1977. Alerto,
todavia, os leitores e aqueles que gostam de mim, que não precisam ficar
preocupados. E o por quê desse meu alerta? Simples. Porque a especialidade do “Notícias
Populares” eram matérias que hoje compõem o cenário de programas televisivos,
como “Brasil Urgente” e “Cidade Alerta”. Ou seja, seu foco concentrava-se em “violência,
sexo e crimes”. O jornal notabilizou-se, sobretudo, por suas manchetes
inusitadas, chamativas, digamos, “diferentes”. Chamavam a atenção nas bancas
por serem violentas e sexuais. Todavia, nunca me envolvi em escândalos e muito
menos em crimes, nem como autor de qualquer delito e nem como vítima.
Então, como fui parar nas páginas do Notícias Populares,
inclusive com chamada de primeira página? Enfatizo que a causa de me tornarem “personagem”
da citada matéria que me sensibilizou tanto e que jamais esquecerei foi
positiva e construtiva. Não sei se o jornal, criado pelo imigrante romeno Jean
Melle, publicado pelo Grupo Folha, veiculou, antes ou depois, reportagens que
não fossem sobre sexo, crimes e violência. Mesmo em caso afirmativo, no
entanto, estas foram raras exceções. E a que tratou especificamente da minha
pessoa foi uma dessas matérias excepcionais. Fiquei comovido, sobretudo, por
duas razões. A primeira pelo fato dela ter sido sugerida por um amigo que
sempre considerei como irmão, o Flávio Paulucci, radialista com o qual
trabalhei na Rádio ABC de Santo André e que não vejo há 39 anos, mas cuja
amizade permanece intacta, como se tivéssemos nos encontrado ainda na manhã de
hoje. O segundo motivo, pelo fato dos editores do jornal terem se sensibilizado
com minha luta e terem aberto uma exceção na sua linha editorial, escrevendo
matéria tão simpática e positiva.
Muitos haviam escrito a meu respeito antes, e outros tantos
escreveram depois, dando-me a maior força e tratando-me com extrema
generosidade. Mas nenhum texto me comoveu tanto como esse do NP. Pena que a
matéria não surtiu o efeito que o Flávio esperava e que o Notícias Populares
queria que surtisse. Em 1977, embora radialista e já jornalista, eu não estava
ligado por contrato a nenhuma empresa de comunicação. Fazia “freelances”, é
verdade, para vários jornais do interior paulista, mas minha atividade
profissional não tinha nada a ver com jornalismo ou radialismo. Na ocasião, já
havia escrito cinco livros, mas não publicara nenhum. O título da matéria do NP
deixava claro qual era a intenção dessa publicação. Era: “Poeta quer editar
seus versos”. Sabem o que aconteceu? Nada!!! Continuo, 39 anos depois, querendo
publicar meus versos.
Desde então, publiquei quatro livros, todos por
interferência de amigos, ou seja, “Quadros de Natal” (contos), “Por uma nova
utopia” (ensaios), “Cronos e Narciso” (crônicas) e “Lance fatal” (contos).
Posso até ser um escritor razoável (presumo), mas sou péssimo negociador. Não
tenho a mínima habilidade para negociações. Transcrevo, a seguir, a matéria do
Notícias Populares, letra por letra:
“O leitor Flávio Paulucci nos escreve a
respeito de Pedro J. Bondaczuk, considerado "o poeta de alma azul",
que durante 4 anos, em sua infância, esteve internado no Lar Escola São
Francisco – entidade de recuperação para crianças paralíticas, mesmo assim, ele
não esqueceu o amor ao azul e nem à vida.
Natural do Rio Grande do Sul, Pedro, já
com 8 anos, iniciou seus ensaios de poeta, escrevendo versos dedicados a
"Sete de Setembro". Em 1961, foi responsável pelo programa "O
Brasil de Amanhã", na rádio ABC, em Santo André. Ainda na década de 60,
teve seus trabalhos apresentados na Rádio Cultura de Campinas e o jornal
Correio Popular publicou uma reportagem revelando seus anseios e planos.
Homenageado em vários locais e ganhador
de muitas bolsas de estudos, não pôde concluir seu curso de medicina por falta
de recursos. E apesar de ter participado de diversos concursos de poesia e
ganho muitos deles, sua real oportunidade ainda não apareceu. Tem vários livros
para serem publicados e procura um editor. Afirma que todo lucro advindo de
suas publicações, caso isso venha a acontecer, será destinado ao Lar Escola São
Francisco, pela sua simpatia a essa entidade.
De seus poemas, o intitulado
"Dissimulação", por exemplo, foi premiado 3 vezes, mas considera-se
um poeta à procura de um editor. Caso os editores se interessem, o poeta
solicita que sejam enviadas cartas à Caixa Postal 1894, CEP 13100, Campinas.
As pessoas que lhe servem de exemplo na
vida são: Helen Keller por saber superar suas limitações físicas; Abraham
Lincoln pelo seu esforço e autoconfiança; Albert Schweitzer pelo seu
desprendimento pessoal e seu imenso amor ao próximo.
Trecho do poema
"Dissimulação":
Figuram-me triste,
com um ar "blasée",
revestido de tédio,
envolto na saudade,
a viver um passado.
E eu revisto o meu rosto em sombras,
torno os meus olhos opacos,
os meus sentimentos "gris",
crispo e selo os meus lábios.
E desta melancólica armadura
faço o meu perfeito disfarce,
minha útil arma de defesa,
o meu escudo protetor,
o meu refúgio indevassável.
Mas a alma, escondida,
secretamente,
estua de alegria.
O coração, à socapa,
mal esconde o seu júbilo.
A máscara falsa do rosto
nem sempre pode dissimular
que amo a vida,
que creio em Deus,
que sou feliz!!!”
Pois é, esta é a matéria, publicada em 1º de novembro de
1977 pelo Notícias Populares. É direta, é objetiva, é simpática e é, sobretudo,
construtiva. Por isso, a despeito de opiniões negativas de muitos sobre este
jornal – que circulou entre 15 de outubro de 1963 e 20 de janeiro de 2001 (que
coincidência, justo na data do MEU ANIVERSÁRIO!) – sempre, sempre e sempre
pensarei com carinho e com gratidão nos seus editores, que se sensibilizaram
com minha luta. Ah, a propósito: esta ainda não acabou. Continuo, como há 39
anos, à procura, de um editor, especificamente para meu livro de poesias “O
poeta de alma azul”. Se quiserem, todavia, publicar outro livro meu, de
qualquer outro gênero, estejam à vontade. Quem se habilita?!!!!!
*
Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas
(atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e
do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe,
ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma
nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance
Fatal” (contos), “Cronos & Narciso” (crônicas), “Antologia” – maio de 1991
a maio de 1996. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 49 (edição
comemorativa do 40º aniversário), página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio
de 2001. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 53, página 54. Blog “O
Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
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