Altamente mais ou menos
* Por
Marcelo Sguassábia
COMO É QUE O SENHOR
RESUME A SUA TEORIA?
É simples: a
felicidade está na mediocridade – entendendo-se mediocridade como patamar
médio, não como algo de qualidade sofrível. O ideal é sempre a média, é nela
que residem o equilíbrio e a harmonia. Para aprovar ou reprovar um aluno, não
tira-se a média de suas notas? E as fileiras do meio, não são as mais
disputadas no cinema? Voltando à comparação com o universo escolar: o chatinho
de óculos da primeira carteira, que uns chamam de cheira-bunda e outros de
lustra-maçã, é um nerd insuportável. O da turma do fundão coloca tachinha na
cadeira do professor. E ambos são repulsivos.
EXPLIQUE MELHOR.
Vou dar um exemplo:
imagine uma maratona ou uma corrida de Fórmula 1. Nada como correr e terminar a
prova no pelotão intermediário – nem na tropa de elite, nem no lodo dos
retardatários. Os que estão no imenso cordão mediano correm numa boa, porque
uma corrida precisa dos que estão no meio para que existam os que acabam nas
pontas. É o pessoal que faz número, são os menos cobrados e ao mesmo tempo
absolutamente indispensáveis.
SIM, MAS…
Os últimos recebem o
desprezo e a chacota. Os primeiros, a inveja e a responsabilidade por um
desempenho cada vez melhor. Um expoente em qualquer coisa é tão discriminado
quanto um retardado naquela mesma coisa. Lembre-se, meu caro: o filé do peixe é
aquela parte que fica entre a cabeça e o rabo.
SÓ QUE É A CABEÇA QUE
COMANDA O PEIXE PARA BUSCAR ALIMENTO, E O RABO É QUEM O IMPULSIONA PARA CHEGAR
ATÉ ELE.
Sim, e para quê? Para
nutrir o resto do corpo e nos legar o seu filé, aquela parte que fica bem no
meio… xeque-mate, senhor repórter!
ESTA É UMA FORMA UM
TANTO QUANTO CONFORMISTA DE ENCARAR A VIDA, NÃO ACHA?
Pode ser para você, um
sujeito visivelmente contaminado pela competitividade capitalista. Que segura
trêmulo este microfone na minha cara, olhando a toda hora para o relógio e
preocupado em ser o primeiro a levar esta minha entrevista às bancas amanhã.
Não é isso mesmo?
SE EU NÃO FIZER ISSO,
SOU MANDADO EMBORA. MAS, CONTINUANDO: EM DECLARAÇÕES RECENTES, O SENHOR AFIRMA
QUE SUA TEORIA TAMBÉM SE APLICA ÀS RELAÇÕES FAMILIARES.
Evidente. O primeiro
filho é sempre vítima de uma criação cheia de cuidados excessivos, de
bajulações desnecessárias da parte dos pais e dos avós, o que acaba por
estragar o indivíduo e torná-lo um parasita sem vontade própria, com traumas
que farão as delícias e o sustento dos analistas. Já com o caçula, via de regra
ocorre o oposto: a família já está tão de saco cheio de tantos filhos que cria
o coitado de qualquer jeito. A vantagem fica com os filhos do meio, que herdam
as roupas e brinquedos do primogênito e deixam a sucata para o mais novo da
prole. Além disso, eles ficam livres da vigilância ostensiva dos pais – que
estão mais ocupados em limpar o cocô do pequenininho e ficar procurando droga
na mochila do mais velho. Pode reparar, é sempre assim.
FINALIZANDO, O QUE
ACHOU DESSA ENTREVISTA?
Mais ou menos. Você
não me entupiu de perguntas bestas, nem eu me alonguei muito nas respostas. E
estando mais ou menos, para mim está ótimo.
* Marcelo Sguassábia é redator publicitário. Blogs:
WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e
WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).
Vida mais ou menos é vida mediana. Não deixa de ser um lugar confortável, ainda que não invejável.
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