O
disparate das raparigas do Bonfim
* Por
Mara Narciso
Elthomar Santoro,
nascido em São João da Ponte e morto há dois anos, foi um músico e compositor
montes-clarense fora do gráfico em tudo. Inconformado e rebelde são adjetivos
que mal seguram dentro o autor de “Rapariga do Bonfim”. Desgarrado do contexto,
era diferente, e suas composições não aceitam uma mera classificação. Ainda que
esse seu dramático tango se chame “Disparate”, poucos se lembram disso, e sim
da finalização da sua letra deboche, que, depois de contar um relacionamento do
começo ao fim, xinga a ex-amada: “és indigna, malvada, infusada, rapariga do
Bonfim”. As duas palavras finais são insulto forte em Montes Claros, cidade que
já teve prostíbulos na Rua Bonfim.
Vítima do alcoolismo,
Elthomar Santoro, após um infarto veio a falecer em 2014, aos 56 anos. Ficaram
a sua obra e os shows em sua homenagem, mas o que melhor retumbou foi o
surgimento do Bloco Raparigas do Bonfim em dezembro de 2015, estreando na rua
em fevereiro de 2016. De caráter livre, como o homenageado, o bloco aceita
homens e mulheres, e a norma é não ter norma, basta ensaiar para sair. Não tem
filiação, carteirinha, contribuição, sendo uma agremiação de amigos para
amigos.
A ideia surgiu num
ensaio de músicos, em que um deles perguntou sobre onde cada um passaria o
carnaval e como todos ficariam em Montes Claros resolveram fundar um bloco para
resgatar o carnaval de rua. O nome chocante foi perfeito para os ideais do
grupo, que queria dar leveza e alegria a palavra “rapariga” e “ocupar os
lugares públicos de uma maneira alegre e divertida”. “O bloco não tem dono nem
pai, é nosso, é de Montes Claros. Quem sugeriu o nome estava no grupo, na casa
de Alexandre Zuba. No momento tocava um blues”, relembra Clara Marcele, uma das
fundadoras do Bloco e criadora de uma página para ele no Facebook.
“A diretoria informal,
hoje com nove, no primeiro desfile tinha cinco pessoas. Com mil reais e
programação para sair com 300 integrantes, desfilou com mais de mil e hoje é
esse sucesso, é essa loucura toda”, diz Clara Marcele. Na primeira aparição,
desde a concentração no Bairro Todos os Santos, todo o trajeto até a Praça da
Matriz, onde foi o apogeu, até a dissolução, o desfile se tornou um grande
evento. Choveu gente de todo lugar, mostrando uma ebulição momesca que foi
despertada e divertiu todo mundo.
No ano passado uma das
musas do Bloco foi Isabel Lopo, atriz que fez o papel principal numa
representação teatral da música “Disparate”, no Centro Cultural, e de
porta-estandarte saiu o antropólogo Joba Costa vestido de mulher.
Também aconteceu a
inevitável censura quanto ao nome, nas redes sociais. Acharam apelativo,
desonroso, infame, discriminatório em relação às mulheres que estavam
desfilando. Outros o acharam chamativo e interessante. De acordo com os
organizadores, “é uma brincadeira séria, bem carnavalesca”. Todos os meses do
ano passado, o Bloco Raparigas do Bonfim foi requisitado para show,
comparecendo com 30 a 50 pessoas para se apresentar com responsabilidade e
cuidado.
O sucesso exagerado se
deu pela força musical do homenageado, não tão reconhecido em vida, e o nome
forte que já caiu na boca do povo, desejoso do carnaval de rua. Algo como
Agremiação Acadêmicos dos Montes não atrairia tanta gente.
Hoje tem ensaio e no
dia 18 de fevereiro haverá um pré-carnaval. Muitos componentes já fizeram suas
fantasias, enquanto os produtores esquentam os tambores sob o comando do mestre
de bateria Alexandre Zuba. Outra pessoa importante para o Bloco é Alice
Parrela, que vem fazendo os preparativos para a festa, enquanto os
montes-clarenses mostram-se ávidos para seguir o Bloco, cair na folia,
engrossar o cordão, e garantir seu sucesso.
Médica endocrinologista, jornalista
profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e
Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a
Hiperatividade”
Ó abre alas para as "Raparigas do Bonfim"... Abraços, Mara.
ResponderExcluirNós queremos passar! Obrigada, Marcelo!
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