Para atender a leitores
O futebol está presente em minha Literatura (e, de certa
forma, em minha vida). É verdade que não na mesma proporção do interesse (diria
melhor, paixão) que desperta em bilhões de pessoas mundo afora. Longe disso. A
estranha veneração que multidões nutrem pelos vários clubes vencedores (raros
se interessam pelos meros “coadjuvantes”), e por astros e estrelas consagrados
dessa modalidade esportiva, é crescente. Aumenta, praticamente, na mesma
proporção do aumento da população mundial. Esse comportamento, claro, me intriga,
enquanto intelectual que analisa friamente os costumes do seu tempo. Sobretudo
quando analiso a proporção “custo/benefício”. Mas... quem se importa com isso?
Hoje em dia, a imensa maioria das pessoas valoriza muito
mais um jogador de futebol do que um cientista que, por exemplo, descubra a
cura de alguma doença que tenha sido até então incurável. Aliás, personalidade
alguma, do presente ou do passado, e nenhum profissional, seja de que área de
atividade for, rivaliza, sequer de longe, em termos de valorização, de popularidade
e de idolatria, com os mais hábeis praticantes desse esporte das multidões.
Estes contam, além de tudo, com remuneração muitíssimo superior às de um
médico, um magistrado, um filósofo e até de um presidente da República, apenas
para citar alguns casos. Professores, então... nem é bom comparar. Soa ridícula
a comparação, tamanho o desnível. Todavia, quem é mais importante para o futuro
da sociedade e da civilização: um mestre ou um jogador de futebol? Ora, ora,
ora... Até o mais bronco dos broncos, o soberano dos beócios sabe que é o
professor. Comparar com escritores, então, nem pensar!
Estranha (de fato surreal) ou não, o fato é que essa
obsessão generalizada com algo de tão escassa importância intrínseca, existe.
Portanto, não é façanha alguma o fato de algum escritor fazer dela tema para
sua produção literária. Estranhável, sim, é quando um assunto tão evidente é
ignorado, como se não estivesse onipresente em nossa vida no cotidiano. Escrevi,
porém, muito pouco a respeito. Em termos de ficção, abordei-o, e raramente de
forma específica, em cinco de meus contos. E apenas um trata do futebol
diretamente. É o que dá título ao meu livro “Lance fatal”, publicado em 2010
pela Editora Barauna.
Em poesia, compus um único e solitário poema sobre o
assunto. E não foi dedicado ao consensualmente considerado o mais completo
jogador de futebol que já apareceu, Pelé. Foi inspirado na performance de
Garrincha na Copa do Mundo de 1962, no Chile, quando foi um dos responsáveis
pela conquista do bicampeonato mundial pela Seleção Brasileira. Escrevi-o quase
um ano após esse tão comemorado êxito esportivo: em 22 de abril de 1963.
Para não deixá-lo “no ar”, paciente leitor, transcrevo-o
abaixo. Seu título é “Guerreiro alado” e diz:
“Garrincha, pequeno pássaro encantado,
alado guerreiro, ingênuo e inocente,
que faz desfilar, no presente,
galhardia,
e humor e graça, as sementes do amanhã,
e que alimenta nossa fragílima fantasia
no palco grandioso do Maracanã.
Mameluco cavaleiro do sonho,
de auriverde manto sagrado,
corcel veloz, galopa e voa
a felicidade perfeita dos simples
nos gramados da América e Europa.
Pés alados. Pés de anjo. Pés calçados
de couro e poesia, de poder e magia,
na luta heróica, com espírito lúdico,
faz acenos familiares à glória
e, em danças, coreografias, corrupios,
bêbedo de luz, sorve o vinho da
vitória.
Líder nato, sem bazófia ou arrogância,
dançando, com dez exímios bailarinos,
tece, com os pés, o painel encantado da
vida
no teatro, dramática arena dos bravos,
do Estádio Nacional de Santiago.
A fama é tênue e pesa toneladas.
Heróis despencam no esquecimento
vítimas da ingratidão covarde e
infeliz.
Mas Garrincha voa, flutua, ganha alento
e, com arte, com magia e encantamento
desperta, orgulha e enaltece um país”.
Admito que não se trata de nenhuma obra-prima, de eventual
jóia rara, que me credencie, exagerando bastante (e põe exagero nisso!) a um
Prêmio Nobel de Literatura. Longe (um milhão de anos-luz de distância) disso!
Mas, convenhamos, o poema tem lá seu encanto (descontando os exageros que
cometi, a pretexto de “licenças poéticas”). Destaco que no terreno da
não-ficção, escrevi um livro inteiro sobre futebol, intitulado “Copas ganhas e
perdidas”. Foi escrito em 2010 e eu tinha expectativa de publicá-lo antes do
traumático Mundial de 2014, “imortalizado” com o vexame da Seleção Brasileira,
que fez história sofrendo o inexplicável placar de 7 a 1 diante da implacável
Alemanha, mesmo jogando em seus domínios. Esse desastre futebolístico ainda vai
dar muito pano para manga, com certeza. Atualizei, claro, o livro com os
detalhes da Copa de 2014 e tenho expectativa de publicá-lo antes do Mundial da
Rússia, em 2018.
Sinceridade? Não tenho muita esperança (quase nenhuma) de
interessar alguma editora, para publicar esse livro, tendo em vista o fracasso
nas negociações que mantive com algumas, entre 2011 e 2013. Mas... nunca se sabe.
Não sabemos nem mesmo o que pode nos acontecer no minuto seguinte, quanto mais
nos próximos três anos, não é mesmo? E por que trouxe esse assunto à baila,
neste espaço nobre voltado à Literatura? Não, meus críticos implacáveis, não
foi para me vangloriar (até porque, não há motivo para tanto). Foi para atender
à solicitação de dezenas de leitores (sem exagero) feita por e-mail, o que,
óbvio, me lisonjeia. Faço-o, pois, com inegável satisfação, mesmo correndo o
risco de ser mal interpretado (o que é quase certo que serei). É o que tenho a
declarar a propósito, por ora.
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Pode ser que não tenha escrito uma obra-prima, mas fez uma previsão absolutamente certa: o fracasso de Garrincha fora dos gramados.
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