Lição das águas
* Por
Pedro J. Bondaczuk
O nome do nosso planeta – como já
escrevi inúmeras vezes – é totalmente inadequado (diria, equivocado). Deveria
ser o do composto químico mais abundante, que o caracteriza e possibilita a
existência de vida em seu interior: ou seja, água, e não Terra, que é,
relativamente, tão escassa, embora essencial.
Em alguns outros recantos do Sistema
Solar essa substância até pode existir, mas nunca nas enormes proporções que há
por aqui e sequer em estado líquido. Daí tamanha desolação e vazio nesses
corpos celestes que orbitam o Sol, a maioria (senão todos) inóspita ao homem (e
a qualquer outra espécie de vida).
É bastante provável que não estejamos
sós na vastidão universal. Matematicamente, pode-se extrapolar a existência de
pelo menos 300 mil (provavelmente, até, muito mais) de mundos, rigorosamente
semelhantes ao nosso. Ou seja, com a atmosfera adequada e, sobretudo, com
abundância de água líquida. Certeza, porém, não temos nenhuma. Será que algum
dia teremos? Não creio. As gerações se sucederão por aqui, até que algum
cataclismo cósmico, ou a insensatez do próprio homem, destrua este (para nós)
aconchegante planeta (já bastante avariado por sinal) e ponha fim à aventura
desta estranha espécie animal.
Mas o assunto sobre o qual o convido a
refletir não é bem este (embora nunca seja demais fazer profundas reflexões
sobre esse tema). A água, além de compor mais de 80% do nosso organismo e de
ser o composto químico mais abundante em nosso Planeta , pode
nos trazer (metaforicamente) inúmeras lições de vida.
É desnecessário ressaltar o uso que
fazemos dela no dia a dia. Mal despertamos, utilizamo-la para nossa higiene
pessoal, indispensável para nos dar conforto e preservar nossa saúde. Sem ela,
não teríamos, por outro lado, o café da manhã. Banhamo-nos nela, bebemo-la,
cozinhamos e até nos divertimos com ela, em piscinas ou praias e vai por aí
afora.
O filósofo norte-americano, Ralph Waldo
Emerson (um dos meus preferidos), recomenda: “Experimenta as águas revoltas
assim como as paradas: elas podem ensinar lições que vale a pena aprender”. E a
que ensinamentos ele se refere? À sua análise química? Claro que não! O que diz
respeito à sua utilidade? Também não, já que não há quem não saiba disso. O
referente à sua preservação e utilização racional? Essa é uma lição que todos,
indistintamente, deveríamos ter na ponta da língua, mas não é a ela que Emerson
se refere.
Então a qual ensinamento das águas
deveríamos atentar? Ao da necessidade da ação! Ao de que a vida se caracteriza
pelo movimento, jamais pela estagnação. Ao da coragem de encarar elevados
“despenhadeiros”, representados por obstáculos de toda a sorte, por quedas,
fracassos e decepções que (se soubermos lidar com eles) tendem a nos
“purificar”, nos fortalecer, nos engrandecer e nos conduzir a grandes
conquistas, até dos sonhos, ideais e desafios que julgávamos impossíveis de
vencer e de alcançar.
Sim, amigos, as águas podem nos ensinar
preciosas lições. E o tempo todo, dada sua abundância. Elas têm que fluir, sem
cessar, desde o nascedouro, da fonte de onde brotam, em direção,
progressivamente, ao mar. Devem fluir em mansos córregos e ribeirões,
juntando-se, em certos pontos, a outros, formando rios, que por sua vez
desembocam em outros mais caudalosos, não raro encachoeirados em determinados
trechos, mas sempre fluindo, sempre seguindo em frente, sempre correndo, sem se
deter, rumo à foz.
Assim devemos ser nós. Não podemos e
não devemos jamais nos conformar em ser meras poças paradas, que só tendem a
diminuir, até desaparecer, tendo as águas evaporadas pelo calor do sol. Mas
antes de se evaporarem, se não forem fluentes, se contaminam com toda a sorte
de impurezas e adquirem aparência suja, torva e lamacenta. Tornam-se focos de
bactérias e adoecem os que se utilizarem delas. Em vez de fontes de vida, se
transformam em agentes de doenças e, não raro, de morte.
Essas são algumas (as mais importantes)
lições que as águas podem nos ensinar. As pessoas inteligentes, criativas, que
tenham o saudabilíssimo hábito da reflexão, podem aprender muitas e muitas
outras. Uma das principais é que, se você se limitar a refletir, sem que esse
ato volitivo seja acompanhado de ações, irá se tornar inútil e improdutivo, um
peso morto para si e para os que convivem consigo. Fazer isso é formar poças
que não tardam a ficar poluídas e a disseminar doenças. Afinal, a vida é
dinâmica, como as águas que fluem sem-cessar. Pelo menos é o que deveria ser. E
sempre!
* Jornalista, radialista e escritor.
Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981
e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras
funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no
Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e
“Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos), “Cronos &
Narciso” (crônicas), “Antologia” – maio de 1991 a maio de 1996. Publicações da
Academia Campinense de Letras nº 49 (edição comemorativa do 40º aniversário),
página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio de 2001. Publicações da Academia
Campinense de Letras nº 53, página 54. Blog “O Escrevinhador” –
http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
Dos seus recados, sempre tiro alguma coisa útil para mim. Caso eu leia já pensando numa justificativa, já é sinal de que serviu, de alguma forma, como lição.
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