Pena de se separar
* Por Gustavo do Carmo
Eram casados há quase
vinte e cinco anos. Prestes a comemorem bodas de prata. Tinham dois filhos
gêmeos adolescentes. Mas não faziam sexo há um ano. Na última vez foi de luz
apagada. E Fabrício não gostou.
Arianna estava macia
demais. E seus seios estavam muito espalhados quando deitada e finos demais
quando em pé, mais parecendo um saco vazio. Aliás, quando ela ficava por cima,
Fabrício sentia falta de ar. Quando acordava, já iluminado pela claridade do
dia, se assustava com a sua aparência. Arianna estava ficando obesa e seu rosto
já a identificava como tal.
Deixá-la era questão
de tempo. Mas Fabrício tinha pena. Ela sempre foi tão boa para ele. Tão
carinhosa. Arianna o colocou na produtora de vídeo onde ele trabalha. Cuidava
da casa. Fazia os pratos de comida que ele adorava. Não podia abandoná-la de
uma forma tão fria. Mas não estava aguentando mais. Sua linda mulher de seios
fartos estava ficando horrenda.
Começou a evitar o
sexo. Passou a ver televisão na sala até dormir. Trabalhava em casa até tarde.
E a dor de cabeça, que nunca foi desculpa para ele, passou a ser. Arianna já
desconfiava. E questionava quando ele dizia que tinha dor de cabeça.
— Mas você curava a
sua dor de cabeça com sexo.
— Mas hoje está muito
forte.
Arianna aceitava as
suas desculpas. E Fabrício ficava ainda com mais pena. Precisava dar um basta
naquilo. Começou a ficar além do expediente no trabalho. Às vezes dormia na
produtora. Se preocupava em ligar para a esposa e avisar. Arianna acreditava.
Os filhos e a família dela começaram a suspeitar que ele tinha uma amante. Arianna odiava fofocas. Acreditava piamente no
marido. E tinha razão.
Mas a paciência e a
confiança dela nele teve um limite. Aproveitou que ele chegou muito cedo em
casa e o colocou contra a parede.
— Você não vai tomar
banho enquanto não confessar que tem outra! Já faz um ano que não transamos. O
que houve? Não sou mais atraente?
Disse, firme. Sem gritar.
— Eu realmente não
tenho outra mulher. Ainda. Mas vou arrumar.
Pela primeira vez, deu
um tapa na cara do marido.
— Cachorro!
— Pode me bater. Eu
mereço. Mas eu preciso falar a verdade. Perdão, meu amor. Mas você está muito
gorda. E seu rosto está ficando velho e deformado. Eu quero o divórcio.
— Cachorro! Repetiu o
xingamento e o tapa.
Arianna ficou a noite
inteira chorando. Fabrício foi dormir na casa dos pais, que mesmo separados
afetivamente, ainda eram oficialmente casados.
O divórcio demorou um
ano para sair. Durante esse tempo, Arianna fez uma cirurgia de redução de
estômago, emagreceu, colocou silicone, operou o rosto para tirar as papadas da
bochecha, fez um lifting. Voltou a ficar bonita, magra e realmente peituda.
Assim, ela apareceu no
fórum para assinar o divórcio. E ainda estava maquiada. Fabrício voltou a ter
atração pela futura ex-esposa. Arianna demorou para corresponder. Se fez de
difícil.
Casaram-se de novo.
Tiveram mais um filho, uma menina, desta vez. Arianna voltou à boa forma
rapidamente. Agora, era Fabrício quem estava gordo, velho e desinteressante.
Mas ela estava com pena de se separar dele novo. Ele sempre foi um bom marido.
*
Jornalista e publicitário de formação e escritor de coração. Publicou o romance
“Notícias que Marcam” pela Giz Editorial (de São Paulo-SP) e a coletânea
“Indecisos - Entre outros contos”.
Bookess -
http://www.bookess.com/read/4103-indecisos-entre-outros-contos/ e
PerSe
-http://www.perse.com.br/novoprojetoperse/WF2_BookDetails.aspx?filesFolder=N1383616386310
Seu
blog, “Tudo cultural” -
www.tudocultural.blogspot.com é bastante freqüentado por leitores
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