A
mulher do goleiro
* Por Rodrigo
Ramazzini
Era a primeira rodada do campeonato
municipal de futebol de campo. A presença de público impressionara até os
organizadores do evento. Quase trezentas pessoas estavam no campo esportivo para
assistir São Nicolau x Milan Cover, pela chave A do torneio.
Duas horas antes da partida, o técnico
do São Nicolau ficara sabendo que o seu goleiro titular não compareceria ao
jogo, pois estava em horário de trabalho e não conseguira liberação. Por
lógica, quem assumiria a posição seria o primeiro reserva. Eis o segundo
problema: ele caíra de moto na noite anterior, já saíra do hospital, não
sofrera nada muito grave, mas precisava ficar em repouso absoluto. E é assim que
entra o Tavinho, segundo goleiro reserva, na nossa história.
Sem alternativas, o técnico do São
Nicolau telefonou para o Tavinho e avisou-o da sua titularidade naquela tarde
de domingo. O Tavinho não levava muito jeito para o futebol, muito menos para
goleiro. Fora inscrito na equipe por ser dono de um ônibus, o qual segundo os planos
da equipe, seria fundamental no futuro, pois almejavam jogar torneios fora da
cidade.
Faltavam quinze minutos para iniciar o
jogo e o Tavinho não aparecia. O lateral esquerdo já estava fardando-se de
goleiro quando o ônibus surgiu, lotado, ao som de pandeiros e cavaquinhos.
- Trouxe a minha torcida, rapaziada –,
exclamou Tavinho, no vestiário.
Eram esposa, mãe, pai, cunhados,
vizinhos etc. Todos com o objetivo de incentivá-lo no primeiro jogo oficial da
sua carreira como goleiro. Começa a partida. Com exatos 17 segundos, “um balão”
é dado do meio-de-campo em direção ao gol defendido por Tavinho.
– Minha! – gritou para os zagueiros,
saindo debaixo das traves em direção à bola. Ofuscado pelo sol, ele perde-a de
vista. Ela quica na sua frente, na entrada da pequena área, passa-lhe por cima
e entra na goleira. Gol! São Nicolau 0 x 1 Milan Cover. Os torcedores do
Tavinho ficam incrédulos. Não podia estar acontecendo aquilo. Mas estava, e
pior, tinha mais...
Aos três minutos de partida, a bola é
recuada pelo zagueiro para Tavinho, que pressionado pela aproximação de um
adversário, assusta-se e tenta chutar a bola para a lateral. O chute sai fraco,
a bola cai aos pés do atacante do Milan Cover. Não deu outra. São Nicolau 0 x 2
Milan Cover.
A torcida do Tavinho, que era só festa
antes do jogo, após esse lance pára por completo o seu incentivo. Sentam-se e
quietos assistem o restante da partida. Os demais expectadores é que começam a
zombá-lo. Gozação que aumenta a cada nova trapalhada em campo. Trapalhadas
que sempre resultavam em gol para o adversário. O placar marcava São Nicolau 0
x 5 Milan Cover ao término da primeira etapa.
No segundo tempo o “show” proporcionado
pelo Tavinho fora maior. Quem assistia ao jogo gargalhava sem parar. A chacota
era geral. Gritos satirizando-o eram ouvidos aos montes. Até um cântico
zombando-o entoaram:
- Com o Tavinho campo... Com o Tavinho
em campo, não tem placar em branco!
O placar da partida indicava São
Nicolau 0 x 11 Milan Cover. Foi então que, aos 38 minutos da segunda etapa, o
Tavinho realiza a sua primeira defesa no jogo. Uma bola cruzada da direita para
o centro da área. O centroavante do Milan Cover erradamente cabeceia. A bola
dirigia-se para fora de campo, mas o Tavinho a interceptou dando uma linda
“ponte” e espalmando-a para escanteio. A mulher do Tavinho, que agüentara todas
as gozações ao marido “friamente”, não titubeou. Levantou-se e gritando,
lascou:
- É isso aí! Mas bah... Que baita
goleiro!
*
Jornalista e contista gaúcho.
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