Nós votamos. eles elegem
* Por
Frei Betto
Haverá eleição
presidencial nos EUA em 2016. Como no Brasil, lá também o povo vota, mas quem
elege é o dinheiro.
Os pré-candidatos
estadunidenses já paparicam os grandes doadores de campanhas: Sheldon Adelson,
dono de cassinos, nos últimos 12 anos doou US$ 120 milhões aos republicanos;
George Soros, especulador, US$ 44 milhões aos democratas. Os irmãos David e
Charles Koch, do ramo petroquímico, se dispõem a arrecadar US$ 900 milhões para
os republicanos; e tantos outros bilionários se mobilizam.
Na corrida ao
Planalto, em 2014, nossos candidatos arrecadaram, juntos, R$ 586 milhões. A
campanha de Dilma abocanhou R$ 318 milhões, mais da metade do total. Zerou
todas as despesas e ainda sobraram R$ 169 mil. Aécio arrecadou R$ 201 milhões,
e ficou dependurado na dívida de R$ 15 milhões.
Até 1997, no Brasil
era proibido empresas financiarem campanhas eleitorais. O PSDB quebrou a boa
norma e fez aprovar a lei eleitoral nº 9.504, que permite financiar candidatos
sem que o dinheiro passe pelos partidos.
Só um imbecil pensa
que se trata de "doação". É, de fato, investimento. Empresas e bancos
"emprestam" grana à espera de retorno assegurado pelo desempenho
político do eleito. Não há papel assinado, exceto quando a doação é ao partido.
Se o candidato perde,
o investidor contabiliza na folha de "perdas e danos". E nada impede
de o candidato embolsar parte do recurso recebido. Se é eleito, sabe que deverá
ser leal a seus "investidores", caso contrário será castigado nas
próximas eleições e ficará a pão e água...
Os maiores
investidores procuram formar bancadas, como a do BBB (bola, bala e Bíblia),
assim como há bancadas do agronegócio, da bebida alcoólica, dos frigoríficos
etc.
São 39 os países que,
hoje, proíbem empresas de financiarem eleições, entre eles Portugal, França,
Canadá, México, Colômbia e Peru.
Além da grana
"por fora" de empresas e bancos, no Brasil há ainda a grana do Fundo
Partidário. Até abril deste ano era de R$ 290 milhões. Dilma, apesar do ajuste
fiscal, triplicou-o. Agora é de R$ 868 milhões. Também ela investe na base
aliada...
Em época de eleições,
você já escutou "Interrompemos a nossa programação para o programa
eleitoral gratuito." Mentira. Não é gratuito. O valor do tempo cedido por
rádios e TVs à campanha eleitoral é abatido no imposto de renda das emissoras.
Em 2014, elas ganharam R$ 840 milhões de isenções fiscais.
E o mais intrigante: a
União é, constitucionalmente, a proprietária do sistema radiotelevisivo
brasileiro. E, no entanto, paga para utilizá-lo em campanhas de interesse
público.
O STF decidiu por 6 a
1, em maio de 2014, proibir doação de empresas a campanhas eleitorais. Porém, o
juiz Gilmar Mendes, contrário à decisão, apelou para o recurso de "pedido
de vistas" e enfiou o processo debaixo do braço. E não há lei que o
apresse. Na verdade, ele queria ganhar tempo para transferir a decisão para o
Congresso. Acreditava que deputados e senadores, capitaneados por Eduardo
Cunha, vetariam a proibição.
Resta à sociedade
civil pressionar para que os nossos políticos tenham vergonha na cara e
decência no bolso. E, na próxima eleição, votar com mais consciência.
* Frei Betto é escritor, autor de “O
que a vida me ensinou” (Saraiva), entre outros livros.
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