Devaneios de uma roqueira 1
* Por
Fernando Yanmar Narciso
CAPÍTULO 1 (PARTE 2)
- Tô atrapalhando
alguma coisa, prima?- Resolvi me meter na presepada.
- Opa, opa, opa! Olha
só quem resolveu acordar, sô!- Ela finalmente solta o freguês, que desmancha no
chão que nem um pudim mole.
- ‘Ocê’ não muda
mesmo, hem, Barbie?- Minhas pernas mal me obedeciam enquanto cambaleava até o
balcão.
- Ó quem fala! Foi uma
senhora noitada hein, cumádi? Dois dias no limbo...
- Faz aí um leite com
abacate e um café duplo, pra ver se eu consigo pelo menos andar até a cidade...
- Deixa comigo. Liga
pra essa pancadariazinha não, só outro otário querendo sair sem pagar...
- Mais um pra
coleção...
- Mas aquela
apresentação que a gente fez em Juiz de Fora no sábado foi um arraso! Nem em um
mês trabalhando aqui nessa ratoeira nós ia conseguir tanto dindim!
- Ah, nem me lembro de
nada do show...
- Mas vai lembrar
rapidinho... Vai ali ao banheiro e dá uma olhada nas suas costas!
- Minhas...
Ainda sem entender
nada, fui ao toalete pra ver do que se tratava. Fechei a porta, liguei a luz,
puxei meu beloso pra frente, me olhei no espelhinho da parede... E meu berro de
pavor foi tão alto e estridente que as lâmpadas do restaurante, o espelho do
banheiro, os copos da prateleira e as lentes dos óculos de minha prima se
estilhaçaram! Uma coisa horrorosa, um monstrengo enorme, uma pintura de inseto
tenebrosa adornava minhas costas indo dos ombros até quase entrar pela bunda!
- AAAAAAAAHHHH! QUE
MONSTRO É ESSE NAS MINHAS COSTAS?!- Derrubei a porta do banheiro com o ombro em
brasa, e comecei a raspar as unhas com força pelo corpo, ali mesmo na frente de
todo mundo, como num show de descarrego- SAI DAÍ! SAI! SAI! SAI!
- Faz isso não, prima!
Isso é tatuagem, não é pintura!
- Como... Como essa
tattoo horrível foi parar aqui, Barbie?
- Pronto, esqueceu
mesmo... Bom, depois do show uns caras foram visitar a gente no camarim com uns
goles fortes pra caramba e umas pastilhas esquisitas pra uma farrinha. A gente
ficou doidona demais e muito depressa, um deles era tatuador... Encurtando a
história, te achei ontem pelada e jogada na calçada do posto, com isso aí nas
costas. ‘Tava’ tão noiada que nem acordou quando te trouxe pro quarto...
- Kurt Cobain, que
tragédia... E ‘ocê’ nem pra tirar o rei da agulha de cima de mim! Ai, minha
cabeça... E quanto eu perdi nessa burrada?
- Seu cachê.
Putz, meus olhos
ficaram quase do tamanho do pires com a xícara de café que minha prima me
serviu. Poderia me preparar psicologicamente pra ouvir qualquer resposta, menos
aquela!
- QUÊ? Eu gastei tudo
o que eu ganhei no show... NISSO?!
Bati a cabeça três
vezes com força na quina do balcão, de tanta raiva que senti de mim mesma.
Minhas lágrimas poderiam rivalizar em volume com a urina que escorria pelos
bancos dos fregueses, que ainda estavam assombrados com a pancadaria da minha
prima de cinco minutos atrás. POR QUE EU?!
- E pra coroar, ainda
tô atrasadaça pro trabalho!
- Relaxa, cumádi...
Comecei a tomar tudo
numa golada, até quase engasgar.
- Não toma tão
depressa, sô! Vai acabar enjoando de novo!
- Cadê meu violão?
- Tá mal mesmo, hem?
Acabou de colocar o estojo nas costas e já esqueceu...
- Âhn? Ah, sim, sim...
Cabeça a minha... Tchau, Barbie.
- Te cuida, prima...
E lá me fui pela
estrada de chão, mais ou menos pronta pra receber mais umas porradas da vida...
Corre atrás do mundo que ele é teu, Lexi! Bye, bye!
Alexia, sua não tão
confiável narradora.
* Escritor e designer
gráfico. Contatos:
HTTP://www.facebook.com/fernandoyanmar.narciso
cyberyanmar@gmail.com
Aléxia é uma típica bad girl.
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