Conversando com minha mãe 5 – Pri
* Por
Urda Alice Klueger
(Para Rogério Gil
Theodorovicz e a Pri)
Sabe, mãe? Taí outra coisa
que não tenho com quem conversar. Naquela altura minha vida estava dividida
entre o pessoal do trabalho, os estudantes de História e a mãe. Não havia tempo
para falar com mais gente, e então eu fui contando tudo para a mãe.
O primeiro colega que
eu conheci no primeiro dia do curso de História foi o Rogério. Acho até que já
o encontrei no Vestibular. Sei que ele esteve sempre junto, sempre por perto,
como acho que ainda hoje está, embora agora a gente se encontre mais nas redes
sociais. Mas era um amigão, bom para fazer trabalhos em equipe juntos,
estudioso, curioso, acabou indo pesquisar o seu povo, que eram os descendentes
de ucranianos da região de Canoinhas, isto já na especialização.
Quando Rogério chegou
ao curso de História, nos seus parcos 21 anos de vida, já chegou com muitas
dificuldades: perdera o pai pouco antes, e sua mãe lutava pelo pão do dia a dia
lá na sua Canoinhas, tocando um pequeno comércio. Mas ele era cheio de vida e
de otimismo, e com entusiasmo contava das suas pequenas aventuras na terra dele
e num tempo em que vivera em Curitiba, e tais aventuras ficavam grandes,
magníficas, na voz entusiasmada dele, e nunca que ele se queixava da vida. Bem
no comecinho, já na primeira semana de aula, ele nos contou da sua grande
preocupação: Vanusa, a namorada que ficara para trás, na sua terra, tendo
dentro dela um bebezinho que eles tinham feito, e todos nós nos tornamos mais
ou menos padrinhos e madrinhas daquela criancinha que ainda não havia nascido.
Priscila foi o nosso
primeiro bebê no curso de História, e dia a dia eu contava para a mãe as
novidades: das dificuldades que o Rogério, sua mulher e a Pri enfrentavam para
ficarem juntos aqui em Blumenau, afinal, e de como aquela pequenina família
batalhava pelo direito à felicidade e à vida, e lembro como a mãe se admirava a
cada coisa que eu contava, orgulhosa que era dos meus valorosos jovens
companheiros historiadores:
- Isto é que é um
rapaz de valor! Fosse outro, talvez esquecesse que deixara uma filhinha para
trás!
Ao longo daqueles
anos, Rogério, eu e a mãe acabávamos nos encontrando, e o Rogério contava
coisas assim:
- Sábados à tarde eu
tiro para brincar com a minha filha!
Curiosa, a mãe queria
saber mais:
- E de que brincam?
- Do que a Pri quiser.
De boneca, de casinha, de qualquer coisa...
Íamos embora e a mãe
reafirmava:
- Rapaz de valor!
O tempo passou, muitas
coisas aconteceram, Pri ganhou a irmãzinha Maria Luisa, e sabe a mãe o que
houve recentemente, agorinha, neste começo de ano? A Pri passou no vestibular
da Universidade Federal de Santa Catarina, e está indo embora para Florianópolis,
estudar Odontologia!
Outra pessoa não iria
entender o meu entusiasmo e a minha alegria por saber que a menininha do
Rogério já chegou ao vestibular e foi lá e deu um show, e então achei que
deveria contar tal coisa para a mãe.
Pri, parabéns,
parabéns, parabéns! Tenho certeza que, lá do outro lado, minha mãe está feliz
por tua causa, também!
Blumenau, 14 de
Fevereiro de 2015.
*
Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR,
autora de mais três dezenas de livros, entre os quais os romances “Verde Vale”
(dez edições) e “No tempo das tangerinas” (12 edições).
O simples, o quase banal ganha uma vestimenta de acontecimento raro nas suas palavras. O mundo visto pela sua ótica fica um doce.
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