O dia de São Nicolau
* Por
Urda Alice Klueger
(Sete anos atrás – 2007
– no seu dia, São Nicolau me trouxe nada mais nada menos que o meu cachorrinho
Atahualpa, que naquela altura pesava tanto quanto um bife! Grande São Nicolau!
Obrigada!)
Comemora-se São Nicolau
no dia 6 de Dezembro e há muita coisa a ser dita sobre esse dia.
Para a Igreja Católica,
São Nicolau foi um bispo polonês que viveu há muitos séculos. Era um homem
justo e generoso, e gostava de fazer caridade incógnito, deixando saquinhos com
moedas de ouro durante a noite, nos umbrais das janelas dos necessitados. Foi
isto que li a respeito do santo, numa “Série Sagrada”, quando era criança. Só
que, quando li isso, São Nicolau já era uma entidade muito forte para mim, e
até fiquei um pouco decepcionada por saber que ele tinha vivido a vida sem
graça de um bispo, quando poderia tê-la vivido na alegre companhia de Papai
Noel.
Bem, de qualquer forma,
ele foi uma pessoa muito forte, pois virou tradição e se perpetuou na memória
de todas as crianças alemãs ou descendentes de alemães. E, na noite de 6 de
dezembro, tantos séculos depois, São Nicolau continua visitando esses crianças
e, incógnito, continua deixando suas dádivas, não mais moedas de ouro, mas
balas, chocolates e castanhas, e é sobre a magia da noite de 6 de Dezembro que
eu quero falar.
A memória me traz a
noite de São Nicolau de quando eu tinha três anos, a primeira de que recordo.
Meus pais nos orientaram, a mim e à minha irmã Mariana, a enfeitarmos nossos
sapatos com as flores do jardim, e os colocamos na janela da sala de nossa casa
pequena e aconchegante. Um grande mistério passou a envolver tudo depois
daquele ato solene, e tínhamos o coração disparado enquanto jantávamos ouvindo
o “Repórter Esso”, pois era noite de milagres, a primeira noite de milagres
para mim. E, de repente, meu Deus, o susto! Grandes batidas nas paredes da
nossa casa de madeira silenciaram as cigarras que cantavam, e puseram em
disparada meu coração virgem de emoções fortes.
- São Nicolau ! –
confirmou meu pai, fazendo-se tão assustado quanto nós, e nos agarramos a ele,
chorando de medo, mas não por muito tempo. Um matraquear no chão de madeira da
sala transformou o medo em pavor, e meu pai e minha mãe tiveram que nos acalmar
para que fôssemos ver o que havia acontecido. E, milagre! – encontramos o chão
da sala forrado de balas lindas e desconhecidas que algum vizinho ali jogara, e
o medo e o susto passaram enquanto juntávamos aquelas balas maravilhosas vindas
diretamente do além. Lembro-me, nos dias seguintes, de como ficava admirando
aquelas balas chiques, envoltas em papéis lindos e coloridos, bem diferentes
das triviais balas de coco-queimados que comprávamos na venda do vizinho seu
Eugênio. Inesquecível primeira noite de São Nicolau, quantas outras vivi!.
São Nicolau foi-se
adaptando às necessidades das nossas vidas. Quando aprendemos a escrever,
deixávamos nossas cartas ao Papai Noel dentro dos sapatos, na janela, na sua
noite. Ele além de levar as cartas, ainda enchia os sapatos de guloseimas, e
fiz isso até ser uma adolescente bem grandona.
Outras adaptações foram
sendo necessárias. Por exemplo, quando meu sobrinho Mteka era pequeno, morava
em apartamento, e não entendia como São Nicolau poderia chegar até à sua
janela. Lembro dos seus grandes olhos claros enquanto perguntava:
- Mas ele é mágico? Ele
pode vir voando até aqui?
Claro que ele é mágico;
São Nicolau tudo pode.
Nossa última criança
foi minha sobrinha Laura, e muito festejamos o São Nicolau com ela.
Comemorávamos em grande estilo, com jantar e amigos que tinham outras crianças,
e São Nicolau comparecia sem falta, a bater nas portas, a jogar balas e
chocolates no meio da sala, a deixar as crianças aterrorizadas e encantadas.
Querido São Nicolau!
Observei, porém, ao
longo da vida, que São Nicolau só existe, na nossa região, para as crianças que
descendem de alemães. Em lugares como Lages/SC, por exemplo, São Nicolau não
existe. Amigos que tenho em Itapiranga/SC, lá no fim do estado, cidadezinha de
colonização alemã, garantem-me que lá São Nicolau é festejado igualzinho como o
é em Blumenau, o que nos leva, de novo, às raízes alemães. É uma pena que todas
as crianças não tenham São Nicolau! É um santo mágico, encantado, e que pode
tudo. Fica a sugestão para as outras etnias: por que não dar São Nicolau para
todas as crianças?
* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e
doutoranda em Geografia pela UFPR, autora de mais três dezenas de livros, entre
os quais os romances “Verde Vale” (dez edições) e “No tempo das tangerinas” (12
edições).
O meu São Nicolau já se chamava Papai Noel. Foi em 1959, e eu tinha 4 anos. Inesquecível!
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