O colégio e a igreja
* Por
Hilton Görresen
O Colégio Stela
Matutina foi o mais tradicional de São Chico. Por ser administrado por freiras
e por estar a poucos metros da Igreja Matriz, tinha uma “parceria” com a
igreja. De seus quadros de alunos saía o contingente de sacristães. Na verdade,
eram coroinhas, pois sacristão é o funcionário que cuida da igreja. O
sacristão, do qual me lembro, recolhia as contribuições durante as missas, de
cabeça baixa e mão fervorosamente sobre peito, e acendia as velas do altar de
Nossa Senhora.
Ser sacristão (ou
coroinha) era uma função concorrida entre os meninos. Dava direito a tocar os
sinos e subir ao alto do campanário, a torre na qual esses estavam. Podiam
utilizar a mesa de pingue-pongue na sacristia e mesmo participar de um time de
futebol, o time do padre. O acesso ao cargo era muito fácil, bastava ser um
“bom menino” (muitas vezes não era assim), e decorar o latinório que se
recitava nas missas. Quando o padre clamava o “dominus vobiscum”, os meninos
respondiam (feijão com marisco): “et cum spiritu tuo”. Na horinha da
consagração, badalavam os sininhos e nas missas solenes espalhavam fumaça de
incenso, sacudindo uma panelinha.
Por influência da
escola, tinha-se orgulho em fazer a primeira comunhão. Qual a criança que não
esperava esse dia? Contar ao padre os “enormes” pecados: “Padre, dai-me a vossa
bênção porque pequei...”. As crianças saíam em fila da escola um pouco antes de
iniciar a cerimônia, vestidas de branco, segurando uma vela com lacinho nas
mãos, e conduzidas por algumas meninas vestidas de anjo. Na mente, a
recomendação de não engolir a hóstia. No final da cerimônia voltavam ao colégio
onde quebravam o jejum com um farto café com cuques e doces.
Havia colaboração da
escola também nas procissões. Certa vez, tive de percorrer a rota
colégio/igreja à frente de um grupo de pessoas, vestindo uma bata colorida e
carregando um belo estandarte. Quem me conhece, não deixaria de estranhar isso.
Mas a verdade é que, quando percebi a irmã superiora com aqueles apetrechos,
parecendo procurar um “voluntário”, corri a me esconder no banheiro. Mas a
bendita irmã foi me encontrar e não deu outra: além de amargar esse tal
desfile, ainda fiquei de pé durante uma missa inteira, debaixo do púlpito, com
o estandarte nas mãos. Quando os coroinhas bimbalhavam os sinos eu levantava o
estandarte.
Na despedida do
colégio, a gente cantava: “... de ti eu levo saudades, saudades tantas de ti”.
E eu não sabia que, cinquenta anos depois, isso seria verdade.
*
Escritor catarinense, autor de seis livros: cinco de crtônicas e um de memórias
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