segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Imensa fortuna

* Por Daniel Santos

Sonhou para si um palácio o homem que se acreditava príncipe. E, assim, dia após dia de sua airosa juventude, dedicou-se à construção da mansarda, onde teria um sinete de prata para intimar a vasta criadagem.

Privou-se do que pôde e viveu no limite da necessidade, imaginoso o bastante para incluir no projeto detalhes que lhe assegurariam um estilo de vida próximo ao soberbo, digno de uma alta figura da aristocracia.

Assim dedicado à grande obra, aprendeu, embora inconsciente, o valor de cada centavo que a construção consumia – algo que só um plebeu de verdade aprende ao longo de uma vida limitada a gastos básicos.

Por isso, talvez, ao terminar o palácio, não conseguiu habitá-lo. Um anexo, aos fundos do terreno, mais convinha à nova consciência. Cedeu ao príncipe os suntuosos aposentos e acomodou-se prazeroso na modéstia.

De vez em quando os dois se avistam da janela, mas ignoram-se como desconhecidos. O nobre contempla suas vastas glebas, enquanto o plebeu sorri, porque se sabe agora dono até do que não mais precisa.

* Jornalista carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de "O Estado de São Paulo" e da "Folha de São Paulo", no Rio de Janeiro, além de "O Globo". Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.




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