terça-feira, 9 de fevereiro de 2010




Meu verso

* Por Washington Queiroz

Meu verso não tem malabarismos.
É seco: grito de arara ecoando
na pedra
do teu coração que bate,
que bate.
Não tem pétalas, segredos, ecos:
é um estilhaço fervendo, voando louco,
sem paragens ou abrigo.
O verso é nada e não está comigo
— está no doido da esquina
na continência do bêbado, está em mim.
Meu verso não presenteia amores. Antes,
está nas torturas, nas duras dores.
E além, meu verso não é poesia
e não agrada: é brasa que fere o olho
e a paisagem sagrada.
O verso enfim não está em mim;
gira no planeta, acomete doenças,
não quer ser lírico ou laço.
E foge do fogo dos que criaram
as alegrias todas, tidas e vindas.
Das danças e manifestações do prazer
se esconde. Inconformado, meu verso
não quer ter.
Assim, aos domingos meu verso não vai às igrejas.
Brinca com prostitutas, puxa punhal, navalha,
dorme na sarjeta.

* Poeta e antropólogo baiano, autor do livro “A dança dos véus – fantasia e fuga”.

2 comentários:

  1. Versos despidos...
    Soam como estampidos
    e ardem como um tapa
    no rosto.
    Parabéns.
    Abraços

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  2. Seus versos são cortantes. Conseguiu o intento com distinção. Decepa as almas mais indiferentes. Atordoantes, isso sim é o que são seus versos.

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