Os
furos da Lava Jato
*
Por Frei Betto
A
corrupção é inerente à história humana. Até no grupo de
apóstolos escolhidos por Jesus havia um corrupto: Judas Iscariotes.
E quantos de nós podem dizer com sinceridade que nunca furtaram uma
manta de avião, sonegaram o Imposto de Renda, embolsaram o troco
excessivo entregue por engano pela caixa do supermercado?
A
corrupção decorre da impunidade e da imunidade. Impunidade de
empreiteiras, empresas, frigoríficos e bancos que, graças ao Caixa
Dois, tinham (e muitos ainda têm) em mãos juízes, políticos e
fiscais. E imunidade assegurada por essa aberração constitucional
chamada foro privilegiado, que derruba o princípio angular do
direito e legitima a verdade de que nem todos são iguais perante a
lei.
Agora,
surgiu uma pedra no meio do caminho de corruptos e corruptores: a
Lava Jato. Em si, necessária e urgente. É a primeira vez na
história do Brasil que políticos graduados e donos de empresas são
encarcerados e obrigados a devolver aos cofres públicos parte do que
roubaram.
Mas
há lisura na Lava Jato? Infelizmente os fatos demonstram que não.
Promotores buscam vaidosamente a luz dos holofotes; prisões são
feitas antes da devida investigação e solidez de provas; frequentes
vazamentos jamais são apurados e os responsáveis punidos; e as
informações contrabandeadas dos autos para a mídia são
preconceituosamente seletivas, focando uns partidos e poupando
outros…
No
tsunami de corrupção que assola o Brasil, a Lava Jato constitui uma
exceção. Onde estão os criminosos descobertos pela Operação
Zelotes? Todos soltos. Onde os responsáveis pela catástrofe
provocada pela Samarco, em Minas? Todos em liberdade. E as
maracutaias do metrô de São Paulo? Debaixo do tapete.
O
elitismo é um carrapato que suga privilégios da Justiça. Quanto
tempo levará o STF para condenar os culpados e absolver os
inocentes? Até hoje o STF não levou nenhum político com mandato à
cadeia. E no passo de tartaruga que caracteriza a nossa suprema
corte, pode ser que muitos crimes prescrevam. Além disso, a polícia anda algemar, a Justiça manda ao Gilmar…
Uma
pergunta que não quer calar: como toda essa montanha de dinheiro
roubado pelos réus da Lava Jato transitou do Brasil ao exterior?
Levada em mala de turista? A nado? Enfiada em tubos de pasta de
dente?
Se
o Banco Central tem olhos para qualquer quantia acima de 10 mil reais
movimentada entre bancos, como justificar a cegueira diante de
vultosas quantias da corrupção?
Não
basta espalhar veneno pela casa para acabar com os ratos. Do mesmo
modo, enquanto as instituições brasileiras não passarem por
profundas reformas, como erradicar o foro privilegiado e divulgar na
internet todos os atos públicos, dos salários dos políticos às
licitações, os ratos continuarão à espreita, dispostos a
aproveitar as múltiplas brechas hoje existentes.
O
moralismo causa indignação. Mas não inibe a corrupção.
*
Frei Betto é escritor, autor de “O que a vida me ensinou”
(Saraiva), entre outros livros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário