Consciência ecológica
A
preservação do meio ambiente é tarefa de todos e não apenas de
meia dúzia dos que se autodenominam (ou são denominados) de
“ambientalistas”. Compete, pois, também aos escritores tratarem
do tema, pondo a força de seu talento comunicativo a serviço de uma
causa que se faz a cada dia mais premente, mais urgente, mais
momentânea face às dramáticas (e nocivas) mudanças climáticas
que já se observam em várias partes da Terra. Sei que na maior
parte do tempo isso é o mesmo que malhar em ferro frio. Poucos, ou
raros, lhes darão ouvidos. Mas nossa obrigação é a de tentar,
tentar e tentar até que, quem sabe, haja um surto coletivo de
lucidez.
Hendrick
Willelm Von Loon nos fornece excelente justificativa para assumir
essa tarefa de “arautos do preservacionismo”. Escreveu, certa
ocasião: “Somos todos companheiros de viagem no mesmo planeta, e
somos todos igualmente responsáveis pela felicidade e bem-estar no
mundo em que vivemos”. E estava errado? Obviamente que não! Aliás,
o significado da palavra “planeta” é exatamente “viajante”.
Ou, para ser mais específico, é o de uma espécie de nave espacial
que singra o imenso (infinito?) oceano do espaço, composto não de
água, mas de vácuo, ou, de acordo com nova teoria dos físicos, de
“matéria negra”.
Não
me peçam explicações a respeito. Não saberei dar! Não passo de
mero “escrevinhador”, ou de rabiscador de ideias, posto que
curioso por todos os assuntos, tanto dos que entendo, quanto dos que
tento entender. Meu papel é o de provocar a inteligência e a
imaginação alheias e de induzir as pessoas a pensarem. Não lido
com certezas, mas com dúvidas e com possibilidades.
Mas,
a propósito da depredação do meio ambiente por parte do homem,
constato, ou concluo, que ninguém faz isso de forma deliberada, com
a intenção específica de destruir em minutos o que a natureza
levou milhões, bilhões de anos para criar. Age assim de forma
inconsciente, achando que a mata que derrubou, por exemplo, para
criar um pasto, não fará falta ao Planeta. Claro que fará! Ou que
a queimada que fez não trará nenhum prejuízo ao solo e que até
pode torná-lo mais fértil. Quem pensa assim está enganado,
obviamente, mas não convencido do engano.
Monteiro
Lobato escreveu um artigo a propósito, intitulado “Uma velha
praga”, publicado no jornal “O Estado de São Paulo”, em 12 de
novembro de 1944. Em determinado trecho do seu arguto texto
opinativo, o genial escritor acentua: “Preocupa a toda gente o
conhecer em quanto fica, em francos e cêntimos, um soldado em guerra
e por dia; mas quem cuida de calcular os prejuízos de toda a ordem,
provindos de uma queima destas? – em velhas camadas de humus
destruídas; em sais preciosos que, em breve, as enxurradas deitarão
fora, rio abaixo, vai ao oceano; no rejuvenescimento florestal da
terra paralisado e retrogradado; na destruição das aves silvestres
e possível advento consequente de pragas insetiformes; na alteração
para pior do clima, pela agravação crescente das secas; em vedos,
cercas e aramados perdidos; em gado morto ou depreciado pela falta de
pastos; em mil e uma particularidades que dizem respeito a esta ou
àquela zona, e, dentro dela, a esta ou aquela situação agrícola”.
Monteiro
Lobato referia-se à “praga” das queimadas, procedimento, aliás,
ainda muito comum Brasil afora (e provavelmente em outras tantas
partes do mundo), a despeito do que se conhece hoje e das campanhas e
alertas para que as pessoas não recorram a esse procedimento. Além
dos prejuízos citados pelo escritor, há a poluição da atmosfera,
causada pela fumaça da queima de madeira, de capim verde ou, o que é
muito mais comum, notadamente em vastas áreas do Nordeste brasileiro
e do Estado de São Paulo, de cana, antes do início do seu corte.
Em
1º de janeiro de 1974, a Rede Globo exibiu um “Globo Repórter”
especial – e então o programa já era tradicional e um dos
campeões de audiência na telinha – em que foram entrevistadas
personalidades de diversas áreas de conhecimento, cientistas,
sociólogos, filósofos, historiadores etc.. Elas foram instadas para
que fizessem um diagnóstico o mais realista possível da situação
mundial na ocasião. E que extrapolassem, tentando prever o que
poderia acontecer caso as coisas não mudassem para melhor e, dessa
forma, sugerissem as providências que deveriam ser adotadas.
Tive
o capricho de gravar esse programa (em áudio, pois então o
videotape não era acessível ao público). E mais, vislumbrando o
caráter histórico das entrevistas, decalquei-as, todas, em textos,
que tenho ainda hoje arquivados na memória do meu computador. Não
me enganei quanto à sua importância. Entre essas entrevistas, por
exemplo, consta, entre umas dez ou doze outras, a do historiador
britânico Arnold Toynbee. Mas não é a dele que trago à baila
hoje. É a de Marshall McLuhan. E o badalado e controvertido pensador
canadense disse, em determinado momento, textualmente, o seguinte:
“Um
velho ditado afirma que a fonte de esperança é eterna em nosso
peito. O homem nunca é abençoado, mas sempre espera ser. A
esperança parece estar sempre à frente. E o homem tem o mau hábito
de estar constantemente olhando pelo retrovisor. E o que ele vê é o
que está vindo por trás, como um enorme caminhão na estrada.
Talvez não seja a imagem perfeita da esperança, porque eu,
pessoalmente, como religioso que sou, acho que a minha não está
neste mundo”.
E
prosseguiu: “Sob o efeito da eletricidade, o homem transforma-se
numa espécie de espírito sem corpo. Estamos no ar. Através do
telefone, por exemplo, estamos, ao mesmo tempo, em Nova York, Tóquio
e aqui (Toronto). Na era da eletricidade, o homem tornou-se uma
espécie de espírito etéreo. Passou a ser informação e está em
todos os lugares. Ele é parte do novo ambiente. E este novo ambiente
da informação inclui a gente que habita o mundo”.
E
concluiu o seguinte, nesta parte de tão preciosa entrevista: “Quando
no dia 17 de outubro de 1957 o Sputnik foi colocado em órbita da
Terra, isto pôs o Planeta dentro de um ambiente conquistado pelo
homem. Naquele momento, a Terra tornou-se uma responsabilidade humana
programada, tornando-se "ecológica". Com a chegada do
Sputnik, o simples planeta deixou de existir. Tornou-se o Planeta
Terra. Uma espécie de Terra espacial. Uma nave espacial onde toda a
humanidade é a tripulação”. McLuhan já havia expressado o
mesmo raciocínio, com outras palavras, em seus livros. Mas este
depoimento foi feito de viva voz.
Questiono:
o homem tem capacidade para zelar pelo seu “lar cósmico”?
Entendo que sim! Sua capacidade, queiram ou não, está muito além
da imaginação. No prefácio de um livro de astronomia que li há
algum tempo, o astrônomo espanhol, Antonio Paluzie Burrel, escreveu
(com o que concordo plenamente, por expressar a caráter o que penso
a propósito): “Maravilhoso e singular contraste. No homem que
povoa a Terra, nesse pigmeu de absurda e incompreensível pequenez,
vibra um espírito gigantesco, capaz de igualar-se à imensidade do
universo real, posto que tem sido capaz de descobri-lo e
compreendê-lo. E outro contraste, revelador, é entre a pequenez
física da matéria que forma o homem e a grandeza espiritual de sua
alma, inteligente, soberana e imensa”.
Essas
palavras complementam uma constatação do escritor francês, André
Malraux, em um artigo (ou ensaio, não me lembro bem), em que
afirmou: “O maior mistério não é que estejamos jogados ao acaso
entre a profusão da matéria e a dos astros: é que, nessa prisão,
tiremos de nós mesmos imagens bastante poderosas para negar o nosso
nada”. E não é?!
Por
isso, apesar de parecer que pregamos no deserto, ao chamarmos as
pessoas à racionalidade e bom-senso e ao pedir-lhes (na verdade,
exigir-lhes) cuidados extremos com o meio ambiente, temos, sim,
possibilidades de sucesso. Pequenas? Talvez. Mas reais. Entendo que
“ainda” há esperança. Porque, como o próprio Malraux observou:
“Alguma coisa de eterno permanece no homem...alguma coisa que
chamarei sua parte divina”.
Boa
leitura!
O
Editor.
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