Moro
testa os limites do regime de exceção
* Por
Emir Sader
Moro se viu alçado,
por um conjunto de circunstâncias, internas e externas, a participante de um
projeto de instauração de um Estado de exceção no Brasil. Escolhido pelos EUA
para ser o regente das acusações que desarticulariam o governo do PT e, com ele,
o potencial produtivo do país. Está cumprindo rigorosamente esse roteiro.
O PT foi tirado do
governo, se desarticula o poderio da Petrobras, das construtoras, da indústria
naval e de outros setores chaves da economia, que tinham guindado o Brasil a
potência econômica emergente em escala mundial. O projeto se complementaria com
o alijamento do Lula da vida política, tanto para sujar a imagem dele, como
para blindar definitivamente o sistema político de qualquer risco de sair de
novo de controle, como aconteceu a partir de 2003.
Da mesma forma que se
pode fazer tudo com as baionetas, menos sentar-se em cima – frase atribuída a
Napoleão -, não se pode fazer tudo com decisões jurídicas arbitrárias. Moro
pretende condenar Lula em primeira e segunda instância, acreditando que com
isso completa o golpe.
Mas não se pode fazer
tudo com decisões jurídicas, acreditando que elas têm força política para se
realizar. Nos últimos meses, Moro tem visto seu poder se enfraquecer e ele tem
feito declarações e tomado atitudes que confirmam sua consciência dos limites
do seu poder. No mesmo momento em que há enormes manifestações contra o governo
e em apoio ao Lula e, em que a manifestação de apoio ao Moro, em Curitiba, teve
a participação de 15 (quinze) pessoas, Moro se vê obrigado a vir a público para
reiterar que, segundo ele, "a grande maioria dos brasileiros o
apoia"(sic).
Em seguida, nova
demonstração de força, para testar os limites do que pode fazer, coloca em
prática, de novo de forma arbitrária, a "condução coercitiva", desta
vez do blogueiro Eduardo Guimarães. A reação não se fez esperar e não apenas do
campo da oposição, mas cada vez mais gente do campo do governo se sente
incomodada com as formas de agir e as declarações intempestivas dele.
Ele se comporta como
uma criança amuada que, contrariada, age para testar os limites do que é
suportável que ele faça. Como se estivesse treinando para tentar dar o bote
sobre o Lula – sua vítima maior. Ainda mais que ele mesmo se armou uma
armadilha, convocando o depoimento do Lula com dois meses de antecipação. Agora
se dá conta, pelas mobilizações de março e pelo prestígio cada vez maior do
Lula, o que espera Curitiba em 3 de maio. E também viu, pelo depoimento do Lula
em Brasília, o que o espera. (Lula já disse que quer que se filme não apenas
ele, mas também o Moro, em quem vai olhar nos olhos todo o tempo. Será
profundamente constrangedor, psicológica e moralmente, e Moro demonstra
nervosismo crescente com essa circunstância que ele mesmo criou).
Tudo indica que ele
sente que o terreno em que ele pisava antes de forma segura, começa a se mexer.
Ele já não une nem o campo da direita e ainda tem que enfrentar não apenas
desgastes públicos, como capacidade de mobilização cada vez maior no campo
popular e com Lula catalisando todas essas mobilizações. A defesa do Lula –
como foi a da Dilma diante do golpe – torna-se a defesa da democracia no Brasil
de hoje.
E Moro começa a
piscar, a gaguejar, a responder "sem comentários", ele que antes
adorava todo holofote e não perdia chance para ditar manchetes para a mídia
submissa. Sua própria teoria de que o país vive uma situação excepcional, que
requer métodos excepcionais – os métodos de exceção que ele pratica e que eles
propuseram que o Congresso formalizasse em lei, sem sucesso – vai caindo por
terra. O método excepcional da condução coercitiva já não é aceito pela opinião
pública, ele vai perdendo esse debate também e perdendo força para agir contra
o Lula.
Moro testa os limites
do regime de exceção, para saber se pode contribuir para transformá-lo em
Estado de exceção, mediante um segundo golpe. As reações têm lhe sido adversas,
fazendo que, nervoso, ele possa dar novos passos em falso, que podem ser fatais
para ele.
*
Sociólogo e cientista político
Apenas vendo para acreditar. E enxergamos o desmonte há quase um ano.
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