Jovem, bela e repórter
* Por
Mara Narciso
Desde quando um branco
tem por principal bandeira defender os negros, ou um poderoso veste a camisa em
defesa dos que nada possuem, ou um homem lute pelos direitos das mulheres, ou
quem sabe um jovem passe a maior parte do seu tempo defendendo os velhos? Cada
qual preserva seus próprios interesses, protegendo suas causas, como fazem os
políticos e grupos corporativos. Crianças, idosos e animais não conseguem se
defender a contento. É preciso que alguém os salve. E que todas as omissões
sejam castigadas.
Ser bonito não exige
mérito. É gratuito e fruto do acaso genético. Em todos os quadrantes, ninguém
tem dúvidas quando está diante da beleza, a qual é ultravalorizada. Pelo
excesso, a palavra “lindo” perde sua força por ser o vocábulo mais escrito nas
redes sociais. De fato, nunca vi uma mulher linda reclamar de sê-lo. Já as
feias... Bem, ser feio é uma maldição, tanto que as bruxas são grotescas, e a
presença de feiúra é associada à maldade. Quem suspeitaria no Brasil que alguém
bem vestido e lindo cometeria um assassinato cruel? Pouquíssimos.
Outra palavra que se
esvazia, por ser presença obrigatória em homenagens à mãe ou a outra mulher
madura é a qualificação de “guerreira”. Falando assim, parece que nenhuma delas
vence a batalha. Mulheres podem estar em guerra, para ao fim se tornarem
vencedoras. As pessoas feias e as velhas estão em toda parte, exceto
trabalhando como repórter na tela da Globo News, uma emissora que não sai do
ar. O amadurecimento, o saber, a segurança, a experiência são pontos positivos
em qualquer nação, exceto no Brasil, país cuja população envelhece, mas fazer
40 anos é ficar velho. Com a mudança das leis trabalhistas, pergunta-se: quem
dará emprego a alguém às vésperas de fazer 65 anos? A televisão é que não dará.
Na produção, a experiência conta, mas em frente às câmeras, apenas rostos
bonitos e jovens, que não chegam aos 30 anos. E a credibilidade, como fica?
Jamais na condução das reportagens, a velha guarda, com maior substância, tem
chance quase única nas opiniões.
Enquanto as pessoas
continuarem a ter vergonha dos anos que viveram, camuflando suas idades
numéricas com obstinação, com se fossem segredo de estado, a desvalorização do
velho se petrificará. A mulher, bem mais do que o homem, dono e senhor de tudo,
torna-se invisível. Quantas mulheres com mais de 70, casadas com homens de 30
anos recebem deferência dos demais? As mulheres jovens não se importam (?) com
homens de corpos decadentes, desde que possam trazer-lhes benefício social,
financeiro, intelectual ou outro. No gênero oposto isso também é verdade, mas,
enquanto os homens maduros vivenciam o fato com glória, a mulher é jogada na
fogueira. O amor não tem idade, assim como o interesse também não. Que cada um
faça o que manda a sua vontade ou seu sentimento.
Numa briga, caso um
dos contendores seja idoso, isso lhe será jogado em insulto feito munição. A questão
não é exigir que se acatem os velhos, amaldiçoando a juventude por ser jovem,
ameaçando-a de que um dia deixará de sê-lo. Isso é apelar pelo óbvio, mesmo que
muitos se esqueçam disso. Ainda que demore uma geração, é preciso educar as
crianças, para a respeitabilidade acontecer. Sem grosserias nem ofensas, mas
sem edulcorar a velhice, o velho precisa usufruir os seus direitos, sendo
respeitado agora, sem esperar nem um minuto a mais. Partindo dele próprio, ao
se dar ao respeito, com o tempo, muito tempo, nossa civilização será
civilizada.
*Médica endocrinologista, jornalista
profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e
Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a
Hiperatividade”
O final, desejando que com o tempo nossa civilização torne-se civilizada, resume tudo. Muito bom, Mara. Feliz 2017.
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