A descoberta da vocação
A “aventura” de Humberto de Campos nos seringais da Amazônia
(assunto que abordei em texto anterior), teve, conforme o esperado, curta
duração. O jovem sonhador não conseguiu fazer a fortuna que esperava. Pudera!
Não era proprietário de nenhum seringal, mas simples empregado de um deles, e
sem nenhuma garantia trabalhista (que então era raríssima em qualquer atividade
no País). O que Humberto ganhou foi apenas experiência, e nada mais. Aliás,
teve muita sorte por não contrair nenhuma doença tropical, notadamente a
malária, o terror dos trabalhadores que se dedicavam à extração, processamento
e transporte do então preciosíssimo látex. Mas encarou, naquele ermo, no âmago
da floresta, uma realidade muito diferente, bem mais dura (duríssima) da que
tinha em São Luiz, na casa do comerciante José Dias de Matos, que era seu tutor
e o considerava (e tratava) como a um filho.
Raros foram os aventureiros, atraídos pela ilusão da “fortuna
fácil”, que conseguiram escapar daquele ambiente hostil, que ficaria conhecido
como “inferno verde”. Os parentes distantes da maioria dos seringueiros nunca
mais tiveram qualquer notícia deles. Eles simplesmente, “desapareceram”.
Humberto de Campos, todavia, não retornou a São Luiz, para o aconchego do que
poderia chamar (e que era) um “lar”. Permaneceu na Amazônia, posto que não mais
na selva. Foi para Belém, que então já era florescente e progressista metrópole
regional, onde, afinal, encontrou o seu “destino”: o Jornalismo. E o jovem,
talentoso e inteligente, começou a nova carreira, que abraçaria por toda a
vida, bem de baixo. A exemplo do que havia ocorrido com Machado de Assis, a
primeira função de Humberto de Campos em um jornal foi a de tipógrafo. E
aprendeu rápido como compor as matérias a serem impressas. Não estacionou,
todavia, nessa atividade, no jornal “A Província”, de Belém.
Ocorre que, observando os textos que compunha, começou a
ensaiar as próprias reportagens e, sobretudo, crônicas, políticas ou não. Não
tardou para que esses seus “rabiscos” inteligentes caíssem nas mãos dos
superiores, que gostaram, sobretudo, do seu estilo, da forma clara e concisa
com que se expressava e da maneira inteligente e sagaz com que observava as
coisas. Seus chefes detectaram, ali, um talento inato, que talvez precisasse
ser burilado, mas que tinha potencial. Das oficinas, Humberto de Campos foi
promovido à Revisão do jornal. Daí para a Redação, foi um pulo, simples questão
de tempo, que nem mesmo foi tão extenso assim.
Mas o progresso, do então já jornalista, não parou por aí.
Não tardou para dar um salto ainda maior. Logo, logo, de mero aprendiz de
tipógrafo, Humberto chegou ao topo da carreira no jornal, tornando-se seu
coproprietário. Ou seja, atingiu à condição de sócio de “A Província”. Todavia,
não teve vida fácil como empresário. O jornal enfrentava sucessivas crises
financeiras e mal conseguia se sustentar. Ocorre que sua linha editorial era de
oposição aos governos tanto de Belém, quanto do Estado. E os políticos não
perdoaram essa postura. Retaliaram “A Província”, boicotando publicidade (e
quem é do ramo sabe que ela é vital em qualquer veículo de comunicação). As
dificuldades financeiras eram crescentes e se multiplicavam, a ponto de faltarem
recursos até mesmo para matérias-primas do jornal, como papel, tinta de
impressão, chumbo para as máquinas de linotipo etc.etc.etc.
Ademais, Belém se tornara muito pequena para as ambições de
Humberto de Campos. Ele queria mais, muito mais, o máximo que o jornalismo
pudesse oferecer. Buscava projeção, divulgação, público o mais amplo possível
para o seu trabalho. Mas isso só poderia ocorrer no Rio de Janeiro, a então
capital federal e o maior centro econômico e cultural do País. “É ali que estão
as oportunidades? Pois é para lá que vou!”, raciocinou o jovem ambicioso (e
talentoso, sem dúvida). E foi o que fez. Em 1912, aos 26 anos de idade, vendeu
a sua parte no “A Província” e transferiu-se para o jornal carioca “O Imparcial”,
com contrato já garantido. Seria, para ele, o “tudo ou nada”. Confiava, porém,
no seu talento. Logo de cara, ganhou uma coluna diária de crônicas, que não
tardou a cair no gosto dos leitores.
Paralelamente, Humberto de Campos ia reunindo textos novos e
antigos, publicados em jornais, e compondo sucessivos livros, que tinham vendas
expressivas, garantindo novas publicações. E sua popularidade, agora como
escritor, crescia. Já se cogitava na sua eleição para a Academia Brasileira de
Letras. É verdade que o sucesso jornalístico e literário não era garantia de
prosperidade financeira. Afinal, ainda hoje, tanto o jornalismo quanto a
Literatura não deixam ninguém rico, salvo raríssimas e honrosas exceções (eu
que o diga!). Enquanto que no Pará, Humberto de Campos havia publicado um único
livro (“Poeira”, lançado em 1911), no Rio de Janeiro as publicações se
sucediam, praticamente à razão de uma por ano.
Cito, como exemplo, os lançamentos de “Da seara de Booz”
(crônicas, 1918), “Vale de Josafá”! (contos humorísticos, 1919), “O mealheiro
de Agripa” (comentários políticos e literários, 1920), “Carvalhos e roseiras, (crítica
literária, 1923), ”O arco de Esopo e Antologia dos humoristas galantes” (contos
humorísticos, 1926), ”O conceito e a imagem na poesia brasileira” (pesquisa
literária, 1929) e vai por aí afora. Não foi surpresa para ninguém, pois,
quando em 1919, aos 35 anos de idade, Humberto de Campos foi eleito para a
Academia Brasileira de Letras, sucedendo o polêmico poeta Emílio de Menezes na
cadeira de número 20. No ano seguinte, foi eleito deputado federal pelo
Maranhão, permanecendo na Câmara até 1930, quando Getúlio Vargas tomou o poder
e fechou o Congresso.
Boa leitura!
O Editor.
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Interessante história. Não sabia nada sobre ele.
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