Veneno da
vaidade
* Por Pedro J. Bondaczuk
A vaidade, desde que sem exageros, é uma característica
normal, natural e desejável nas pessoas. É ela que nos leva, por exemplo, a
cuidar da aparência, nos vestindo com apuro e bom-gosto e atentando para as
normas de higiene. E faz, entre outras coisas, com que zelemos por nossa
reputação, agindo de forma a sermos valorizados e até admirados pelos méritos
que demonstrarmos.
Ela passa a ser nociva, todavia, quando descamba para o
exagero. Quando a pessoa se julga melhor (mais bonita, mais inteligente, mais
forte etc.) do que todos os outros, a vaidade fica doentia, ridícula e
sumamente condenável. Ou seja, quando se passa a não se admitir nenhuma espécie
de crítica ao que somos e ao que fazemos e se leva qualquer observação alheia,
que venhamos a considerar nem que levemente desairosa, para o terreno da
ofensa, estamos no limiar da burrice. Nessas circunstâncias, ela se torna não
somente reprovável, como perniciosa e daninha. Transforma-se num poderoso
veneno. Pode nos conduzir (e de fato conduz, sem dúvida alguma) com rapidez
espantosa, ao ridículo.
Todo artista é vaidoso em relação às obras que produz. É
natural e louvável que assim seja. Isso, óbvio, desde que não se descambe para
o exagero, para uma espécie de “auto-adoração”. Muitos agem assim. Ou seja,
passam a se considerar perfeitos, inatacáveis, incomparáveis, geniais e, em
grau extremo, isso se constitui, até, em grave desvio psicológico de conduta. É
inequívoco e contundente sintoma de megalomania.
O escritor, enquanto artista que é, evidentemente, também é
vaidoso. Reitero, é desejável que o seja, mas na medida correta. Há, contudo,
os que levam essa vaidade ao extremo. Os que, quando têm obras criticadas com
fundamento encaram as críticas como “ofensas mortais”. Quando um editor, ou
revisor detecta, por exemplo, algum erro em seus textos, em vez de agradecerem
por essa ajuda (afinal, errar é humano), ficam sumamente ofendidos e retrucam
ofendendo quem somente pretendeu colaborar. Interpretam as observações como se
quem as fez os considerasse o suprassumo da ignorância. Claro que não
consideram.
Todos erramos em nossas atividades e, infelizmente para nós,
não uma única vez, mas inúmeras. Há uma série de fatores que determinam, ou
pelo menos contribuem para que venhamos a errar. Erramos, por exemplo, por
desatenção, ou seja, por falta da devida concentração que a nossa atividade
requer. Outro fator bastante comum é a pressa que, como todos sabem, é a grande
inimiga da perfeição.
O mau entendimento do assunto que abordamos, por outro lado,
não raro nos induz ao erro. Podemos, também, ter um súbito lapso de memória e
trocar nomes, referências, características etc. Isso é comum. É normalíssimo.
Acontece até com os gênios de fato. A ignorância, ou seja, o desconhecimento do
escritor das regras de gramática ou do tema que aborda é, possivelmente, o
último e o mais raro dos fatores que nos induzem ao erro.
Claro que quem nos corrige não é onisciente, e sabe muito
bem disso (ou pelo menos deveria saber). Tanto que a maioria dos revisores das
editoras, quando detecta erros nos textos dos autores cujos originais revisa,
não sai por aí modificando, a torto e a direito, o que foi escrito. Esses
profissionais zelosos e sumamente úteis (diria indispensáveis) consultam os autores,
trocam idéias com eles, ponderam e recebem ponderações, antes de alterar ou não
o que entendem que esteja errado.
Não há motivos, pois, para ninguém ficar melindrado,
ofendido, cheio de dedos quando deixa escapar falhas no que escreveu, apontadas
pelos que lêem seus textos (editores, revisores ou apenas leitores). Quando
isso acontece, escritor amigo, conscientize-se que ninguém está presumindo que
você seja ignorante, ou que não saiba nada das normas da sua profissão
(gramaticais sobretudo). Seja elegante e receba os reparos feitos com gratidão
e com classe e, se quiser crescer ainda mais no conceito alheio, até com
bom-humor. Esteja certo que, agindo dessa forma, você só ganhará pontos. Não se
deixe envenenar pelo excesso de vaidade.
*
Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas
(atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e
do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe,
ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma
nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance
Fatal” (contos), “Cronos & Narciso” (crônicas), “Antologia” – maio de 1991
a maio de 1996. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 49 (edição
comemorativa do 40º aniversário), página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio
de 2001. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 53, página 54. Blog “O
Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
Repito, Guimarães Rosa afirmava que relia pelo menos cem vezes cada página antes de considerá-la pronta. Ainda assim, nós que somos pessoas comuns e não iguais a ele, um gênio, erramos mesmo depois de cem releituras. Inúmeras vezes temos de correr atrás do texto enviado para consertá-lo.Ainda assim, erros passam sem correção. Somos todos humanos.
ResponderExcluirConcordo, Mara!
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