Torre de marfim
Uma discussão interminável, que já atinge
algumas gerações e passa de um século, notadamente nos círculos acadêmicos, é a
que se refere ao papel do escritor na sociedade e, mais especificamente, se ele
deve, ou não, aderir a causas políticas ou defender determinada ideologia.
Muitos entendem que não lhe cabe
transformar sua produção literária em mero material de propaganda. Não lhe cabe
mesmo. Mas nem por isso lhe deve ser vedada a livre participação política. Os
que integram esta corrente defendem que o escritor se encerre em uma “torre de
marfim” e somente traga à baila temas eternos e transcendentais. Que aborde os
problemas de relacionamento, os conflitos emocionais e os dramas psicológicos.
Mas que não se meta em assuntos que não sejam da sua seara.
Outros tantos, contudo, afirmam que,
antes de tudo, o escritor é um cidadão e que, portanto, tem não somente o
direito, mas o dever de participar da vida política do seu país e, por
extensão, do mundo.
Os dois lados, porém, erram, ao quererem
impor ao literato determinada conduta. A escolha do caminho a seguir cabe-lhe
com exclusividade, e somente a ele e a mais ninguém. Ou seja, a mesma liberdade
que ele defende para os outros, deve lhe ser concedida, para escolher o procedimento que melhor lhe
convier.
Escritores notáveis de todos os tempos
abraçaram grandes causas e nem por isso fizeram má literatura. Pelo contrário.
Entre estes, pode ser citado, por exemplo, Emile Zola, com seu corajoso libelo
acusatório intitulado “J’accuse”, publicado no jornal Aurore, em defesa do
Capitão Alfred Dreyfus, vítima de uma armação racista (era de origem judia) que
redundou em sua expulsão do exército francês e na sua prisão na temível Ilha do
Diabo, na Guiana Francesa.
Outro defensor de causa política foi
Victor Hugo, que acabou eleito senador na França e se destacou na vida pública
por sua probidade e clarividência. Não se pode esquecer de Máximo Gorky e
Vladimir Maiakowski, na ex-União Soviética. Ou, mais recentemente, nos Estados
Unidos, de Gore Vidal, corajoso e ousado em suas denúncias ao governo de George
W. Bush e suas mazelas, tendo em vista a redução de liberdades civis, em plena
pátria da liberdade. Nenhum desses escritores, porém, teve seu talento
contestado ou desmentido por causa disso.
Quanto aos que se encerraram em “torres
de marfim”, poderíamos citar mais de um milhar, que com sua magistralidade e
competência nos desvendaram mundos ideais e trouxeram à tona mistérios e
segredos da alma. Ambas as correntes, portanto, são válidas e úteis. Ademais, o
julgamento cabe (e sempre deve caber) ao árbitro supremo que de fato importa ao
escritor: o leitor.
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Sem gesso, sem definições, com cada um escolhendo o que seguir, é mais fácil escrever.
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