Preservação
da memória
Poucas pessoas se preocupam, de fato – mediante ações
efetivas – com a preservação da memória. Acontecimentos marcantes das famílias,
por exemplo, são logo esquecidos e as gerações seguintes, seus descendentes,
pouco ou nada ficam conhecendo dos feitos, sucessos e fracassos (estes também
devem ser lembrados e com atenção redobrada) dos que lhes deram carinho, afeto,
educação e, sobretudo, a vida.
Como se vê, sequer refiro-me, aqui, à memória nacional, a
dos grandes vultos, dos líderes, dos intelectuais, dos pesquisadores, dos
construtores de cidades, tumbas e monumentos etc., dos que contribuíram, com
suas ações, para a grandeza e o progresso do seu país. Destes, poucos são
lembrados e reverenciados, como mereceriam, meros meses (ou menos) após
morrerem.
Nem mesmo lembranças familiares são preservadas (salvo
raríssimas exceções). É fato que a maioria das famílias conta com álbuns de
fotografias que registram momentos especiais de suas vidas. Mas são imagens
frias, sem referências, sem indicações de datas, locais e circunstâncias em que
foram tiradas e, com o passar dos anos, são inúteis para de sequer sugerirem
informações a respeito..
O que você conhece (a fundo) sobre o seu avô, caríssimo
leitor? Ou acerca de seu bisavô? Ou mesmo do seu pai? Pouco, muito pouco, não é
verdade? Raramente nos preocupamos em preservar para a posteridade documentos e
anotações sobre nossa família. Achamos que é algo que importe apenas a nós. Nem
sempre.
Explico por que. Tenho a “mania” de pesquisar a vida e a
obra de escritores pouco conhecidos, mas cuja literatura seja de inegável valor
estético. Ou seja, que tenha não apenas forma, mas, principalmente, conteúdo.
Para tanto, busco informações onde a lógica sugere haver maior probabilidade de
encontrá-las: as famílias dos personagens de minhas pesquisas. Para minha
surpresa, todavia, a imensa maioria delas me fornece escassíssimas indicações a
esse propósito. E não se trata de má-vontade. Trata-se de ausência de
documentação (e de memória).
O mais comum é que me franqueiem toneladas de papéis
mofados, amarelecidos pelo tempo e empoeirados (uma tortura para os alérgicos),
que as famílias desses escritores entendem que sejam “documentos”. A maioria
consiste, apenas, de recibos de aluguel, de notas fiscais de aquisição de eletrodomésticos
de todos os tipos, de canhotos de passagens de avião ou de ônibus e assim por
diante. Ou seja, nada, absolutamente nada que seja aproveitável para o resgate
da memória de um literato.
Ainda se houvesse anotações pessoais, rascunhos de textos
literários, cartas, diários ou coisa que o valha, haveria algum proveito nessa
papelama. Como resgatar a memória de alguém, todavia, apenas com essa papelada
anônima, neutra, genérica e, portanto, sem utilidade prática? Entrevistando os
parentes, por outro lado, suas referências tendem a ser as mais vagas
possíveis, quando não contraditórias. Sai-se, desse tipo de entrevista,
conhecendo menos sobre a pessoa pesquisada do que quando se entra nelas.
O quanto a sua esposa conhece da sua atividade literária,
escritor amigo? “Ah, mas ela não se interessa por Literatura”, você poderá
dizer. Seja didático e desperte o seu interesse pelas letras ou, pelo menos,
pelo que “você” escreve. O que seus filhos sabem sobre os livros que você já
publicou? Pelo menos os leram? Têm noção da sua qualidade? Meus filhos, à
exceção da minha primogênita, a Tatiana, (infelizmente) conhecem pouco,
pouquíssimo da minha obra.
Não podemos, contudo, agir como se fôssemos viver para
sempre. Não vamos! Temos que batalhar para que o fruto do nosso talento e da
nossa inteligência nos sobreviva e seja útil às futuras gerações. Se não for
para preservar nossas obras, respondam, com lógica e tirocínio: para quê
produzi-las? Para que tenham fugaz “brilhareco” (na maioria, nem isso) e depois
sejam esquecidas, como se nunca houvessem existido? Isso vai contra todo o
senso lógico e prático de que me julgo dotado!
O que você tem feito para preservar a memória da sua
família? Tem, pelo menos, conversado com os filhos, sobre a trajetória
familiar? Vem guardando documentos e referências que permitam reconstituir, um
dia – se não com precisão, pelo menos de maneira bem próxima à realidade – aquilo que você é e
faz?
Não se trata, creia, de mera vaidade. Longe disso. Trata-se
de ser prático e de não deixar que preciosas experiências e obras se percam por
relaxo ou desinteresse. Se não forem preservadas, certamente se perderão.
Lembre-se que, na qualidade de escritor, você é (mesmo que não se dê conta ou
relute em aceitar) figura pública e, portanto, potencialmente alvo do interesse
geral. Não deixe sua memória morrer!
Boa leitura
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Quando me param na padaria para perguntar alguma coisa sobre algo que escrevi, fico encabulada. Sem imaginar que isso aconteceria,ao começar a escrever, há 16 anos, nem de longe me imaginava tornando uma pessoa pública. Sei bem da minha mãe e muito pouco sobre meu pai. Dos meus avós mal sei o nome. Realmente uma falha imperdoável.
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