Geração
perdida
* Por Pedro J. Bondaczuk
A morte, ocorrida em 28 de março de 1989, do escritor
norte-americano Malcolm Cowley, representou, definitivamente, o fim de uma
geração brilhante de artistas que, estranhamente, foi chamada de “perdida”. Foi
a que floresceu, no vigor da sua juventude, no período intermediário entre as
duas guerras mundiais do século XX, que mudaram, por completo, a visão dos
povos em relação à vida e à convivência internacional.
Foram dois conflitos terribilíssimos, que ceifaram da face
da Terra entre 40 e 70 milhões de pessoas. Algumas foram mortas em batalhas de
extrema selvajaria. Outras foram assassinadas, cruel e friamente, ou em campos
de extermínio, ou em bombardeios indiscriminados contra zonas densamente
povoadas ou, finalmente, quase 200 mil foram exterminadas com a mais terrível
das armas inventadas até hoje, a bomba atômica, testada, pela primeira vez, na
prática, em Hiroshima e Nagasaki. Oxalá não seja nunca mais utilizada.
A “lost generation” foi integrada por intelectuais que eram,
ao mesmo tempo, homens de reflexão e de ação. Como, por exemplo, o irrequieto
Ernest Hemmingway, que adorava touradas, safáris e esportes perigosos e que,
quando sentiu que a liberdade estava em risco, não teve dúvidas em pegar em
armas, como voluntário, na guerra civil espanhola.
Hoje, já há, até, quem chame esse extraordinário romancista,
autor de “O Velho e o Mar”, “Adeus às Armas” e “Por Quem os Sinos Dobram”,
ganhador do Prêmio Nobel de Literatura, de canastrão. É bem o espírito destes
tempos irreverentes, repletos de críticas, mas carentes de intelectuais
imaginativos, criativos, positivos, solidários e altruístas, que façam coisas
admiráveis que realmente contem, por serem valiosas, e não sejam meros modismos,
o que chamo de “Literatura prêt-à-porter”, a do “use e jogue fora”. Há exceções,
óbvio, mas...
A tendência dos escritores atuais (de muitos deles, pelo
menos), é a de descambar para a apelação, muitas vezes com incursões no
movediço e perigoso campo das convicções religiosas. Estão, nesse caso, o grego
Nikos Kazatsankis, autor da novela que serviu de tema para o diretor cinematográfico
norte-americano Martin Scorcese rodar seu polêmico filme “A Última Tentação de
Cristo” e Salman Rushdie, que com seu “Os Versos Satânicos” conseguiu agitar
uma comunidade de quase um bilhão de pessoas, ou seja, a muçulmana.
Quando não se está partindo para este tipo de escândalo,
desnecessário e absolutamente inútil, boa parte dos nossos romancistas atuais,
dos que estão na crista das ondas, tem partido para a deslavada pornografia, a
pretexto de tratarem de temas apenas “eróticos”, como meio fácil de esgotar
edições e mais edições. Para mim, isto é apelação explícita e deslavada, e as
coisas ficam mais graves quando tais livros são mal escritos (e em geral são mesmo).
Idéias, mesmo, são raríssimas as expostas com lógica, coerência, talento e
criatividade, sem artificialismos caretas e modismos ridículos e incabíveis.
Falta à geração presente, de intelectuais ou não, de
artistas ou de pessoas que exerçam outras atividades não ligadas às artes,
estilo, alegria, emoção, sinceridade e grandeza. Isso não ocorria com os
idealistas que marcaram seus nomes, indelevelmente, na cultura do Ocidente na
década de vinte do século de mesmo número? Às vezes sim, mas não de forma tão
generalizada como hoje.
“Lost generation” deveria ser chamada, portanto, a geração
atual. Mas por motivos diversos, evidentemente, da que viveu a chamada “Belle
Époque”. Aquela era chamada de “perdida” porque estava disposta a sacrificar a
vida por ideais que hoje são até risíveis. A geração desta segunda década do
século XXI (salvo exceções), todavia, faz jus a essa qualificação por razões mais
lógicas e menos nobres. Por não ter rumo definido, um ideal porque lutar e por
vagar a esmo através dos anos de suas polêmicas vidas, descrente de tudo e de
todos, num interminável tédio. Conseguem a façanha de ser, simultaneamente,
entediantes e entediados.
*
Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas
(atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e
do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe,
ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma
nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance
Fatal” (contos), “Cronos & Narciso” (crônicas), “Antologia” – maio de 1991
a maio de 1996. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 49 (edição
comemorativa do 40º aniversário), página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio
de 2001. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 53, página 54. Blog “O
Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
Assim como eu não condenaria Ernest Hemmingway por gostar de safáris, eu não diria que os jovens de hoje são entediados e entediantes como unidade.Desculpe, Pedro, mas vejo como errada a sua visão.
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