Caboclos de lança
* Por
Clóvis Campêlo
Os caboclos de lança
integram os maracatus rurais, também chamados de maracatus de baque solto ou
maracatus de orquestra.
Segundo a escritora
Virgínia Barbosa, em pesquisa publicada no site da Fundação Joaquim Nabuco, até
a década de 1920, os caboclos de lança não despertavam tanto interesse e nem
fascinavam as pessoas. Na sua maioria, eram trabalhadores das lavouras de
cana-de-açúcar que viviam e desfilavam nas cidades interioranas de Pernambuco.
A partir da década de 1930, no entanto, com a decadência dos engenhos banguês,
o crescimento das indústrias e a modernização da economia, esses trabalhadores
passaram a se deslocar do campo para as zonas urbanas das cidades litorâneas,
notadamente da capital do Estado, trazendo consigo essa tradição cultural.
Embora a origem do
maracatu rural ainda seja desconhecida, alguns pesquisadores acreditam que ele
tenha surgido devido à mistura de vários elementos das culturas indígenas e
africanas e de outros folguedos, como cambinadas, bumba-meu-boi,
cavalo-marinho, caboclinhos, folia de reis, etc. Os caboclos de lança, que
também são conhecidos como lanceiros africanos, caboclos de guiada ou
guerreiros de Ogum, integram o maracatu de baque solto ao lado de outras
figuras como o mateus, a catirina, a burrinha, o babau, o caçador, baianas,
damas de buquê, a dama do paço, calungas e caboclos de pena.
Os caboclos de lança
se submetem a um verdadeiro ritual, antes de saírem para as ruas durante o
carnaval. Primeiro, abstinência sexual completa, que começa na sexta-feira
anterior ao início do carnaval e vai até a quarta-feira de cinzas. Para não
“abrir o corpo” e aumentar as suas defesas, o caboclo também não toma banho
durante esses dias, obrigando-se a dormir sujo, do jeito que veio da rua.
Existem ainda, antes da saída dos caboclos para o carnaval, cerimônias
realizadas em terreiros, com a benção da lança e da flor, que carregam na boca,
e com a tomada do azougue, coquetel preparado com pólvora, azeite e cachaça.
Suas vestimentas são
formadas pelo chapéu de palha, ornamentado com fitas onde predomina a cor do
seu guia espiritual; um lenço colorido, colocado no pescoço; uma grande gola
coberta de lantejoulas, que cobre os ombros, o peito e as costas do caboclo; a
fofa, calça frouxa com franjas; o surrão, uma armação com chocalhos que o
caboclo carrega nas costas; os óculos escuros e uma flor presa nos lábios,
geralmente um cravo branco.
O destaque especial é
a lança de madeira, feita de imbiriba ou quiri, com dois metros de comprimento,
cortada por eles mesmos na mata, assada e enterrada na lama por quatro a cinco
dias, para endurecer; depois descascada e afilada na ponta de quatro quinas e
coberta de fitas coloridas, com cerca de 60 cm, cada, consagradas e batizadas
em um terreiro de umbanda, com rezas e defumadores.
Recife, 2011
Fotografias, montagens
e pesquisa de textos de Clóvis Campêlo
* Poeta, jornalista e radialista,
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