Ignorância e negligência
O escritor alemão Johann Wolfgang
Goethe escreveu, certa feita, que “a causa maior dos nossos problemas sempre
oscila entre a ignorância e a negligência”. Isso vale para qualquer setor da
vida. Inclusive a Literatura. Quantos livros não são arruinados por aí, o tempo
todo, pelo fato de seus autores não terem buscado o devido esclarecimento (às
vezes sobre um único aspecto que ignoravam) que, em vez de buscarem se informar
a respeito, optaram, por preguiça ou por arrogância, expressar o que “entendiam”
ser o correto (que não era), e se deram mal? São muitos, não é verdade?
Porém, esses problemas seriam evitados
com só um pouquinho de cautela e com um tantinho a mais de esforço e até de
humildade em admitir que não conheciam de fato o assunto de que tratavam. Tais escritores evitariam os
dissabores que passaram caso se dispusessem a pesquisar a respeito do que
ignoravam. Ou, simplesmente, como manda o bom senso, não escrever nada a
respeito. Mas essas pessoas entram, imprudentemente, “de cabeça” no problema e,
neste caso, simultaneamente, pelos dois motivos citados por Goethe: ignorância
e negligência, agravados por uma estúpida vaidade. Esse é somente um dos tantos
exemplos que eu poderia citar não importa de que atividade.
Nossa tendência, quase que automática,
é a de culpar terceiros, ou as circunstâncias, pelos problemas que nos sobrevêm,
em vez de reconhecer nossa responsabilidade, não raro exclusiva, por sua
gênese. Com isso, dificultamos, quando não inviabilizamos a solução. É como no
caso de uma doença. Caso seja feito diagnóstico equivocado dela, será
impossível prescrever a medicação ou o tratamento corretos. Em vez de curá-la,
a agravaremos levando o paciente, não raro, à morte. Lembro, a propósito, o que Confúcio afirmou: “Não
são as ervas más que afogam a boa semente, e sim a negligência do lavrador”. E
não estava coberto de razão?! São inúmeras as ocasiões em que nos mostramos
negligentes, achando que essa atitude não nos trará mal algum. Todavia, salvo
raras exceções, nossa negligência é causa de um problemão, que poderia ser
evitado com só um pouquinho de boa vontade e de bom senso.
A ignorância, ou seja, a incapacidade
de entender o que quer que seja, mesmo que o objeto do não entendimento não
seja muito complexo (que pode ser relativa ou absoluta), aliás, é a suprema das
misérias. Nada é mais precioso do que o potencial de compreensão, a facilidade
de entender o concreto e o abstrato, que convencionamos denominar de
“inteligência”. É mister admitir que todos somos ignorantes de algo, embora em
graus variáveis, uns mais, outros menos e outros, ainda, de forma absoluta. Não
conheço o “gênio” que entenda tudo de tudo, todas as disciplinas, todas as
artes, todas as ciências etc. que seja, em suma, onisciente.
Os sensatos admitem sua ignorância em
determinados assuntos e procuram um jeito de entender o que lhes seja
ininteligível, desde que necessitem desse entendimento. Saem à procura de
fontes que lhes esclareçam o que desconhecem. Quando não, deixam esses temas, para eles
obscuros e além do seu alcance de entendimento, para os que são especializados
neles. Com isso, evitam, com certeza, no mínimo, de descambar para o ridículo.
Já os insensatos... Nem é bom falar! Cegos pela vaidade, transformam o que
potencialmente seriam soluções em imensos problemas.
O conhecimento, desde que o homem
primitivo tomou consciência de si e do universo que o rodeia, se expandiu, de
tal sorte, que é impossível a qualquer pessoa, por mais genial e bem-dotada que
seja, saber de tudo o que há. História, ciências, artes, tecnologia etc., estão
em permanente expansão. E, cada uma dessas disciplinas, exige especialização.
Ainda assim, mesmo os especialistas de cada uma dessas áreas, não conseguem
apreender sequer ínfima parcela do conhecimento delas. Gostemos ou não,
admitamos ou não, somos, em alguma medida, todos “ignorantes” de alguns
assuntos.
Não há demérito nessa admissão. Afinal,
como Alfred North Whitehead concluiu, em um texto notável: “O túmulo do saber
não é a ignorância, mas a ignorância da ignorância”. Esta, sim, deve nos
preocupar. Pois é, justamente, no pleno conhecimento das nossas limitações
mentais, e no nosso esforço para supri-las, que reside o princípio da
sabedoria. Admitamos ou não, nosso conhecimento sobre o mundo que nos cerca,
embora achemos que seja extraordinário, é ínfimo, ridículo, pífio, diante do
que há, ainda, por aprender. Imaginem em relação ao universo! A extensão de
nossas vidas veda-nos a mais remota possibilidade da onisciência.
Portanto, convém não sofrer em demasia
com as incertezas. É prudente, sobretudo, não as transformar em “doenças do
espírito”. Haveremos de conviver com elas – múltiplas, variáveis, intensas ou fracas
– enquanto vivermos. Tudo o que nos cerca é incerto, duvidoso, passivo de
comprovação. E quando comprovamos alguma coisa, a prova nunca é cabal,
irretorquível, absolutamente convincente, sem nenhum aspecto obscuro carente de
maior esclarecimento. Qual é a fonte dessa nossa compulsória incerteza? É, sem
dúvida, o desconhecimento. E essa ignorância é a gênese, ao lado da
negligência, como afirmou com extrema pertinência Johann Wolfgang Goethe, se
não de todos, pelo menos da imensa maioria dos nossos problemas. Fôssemos oniscientes, não haveria o mínimo
espaço para o duvidoso, o misterioso e o incerto. E muito menos para o erro.
Todavia... não somos assim.
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondacvzuk
A cautela evita sim os erros maiores. Mesmo acautelados erramos. Sob efeito de forte emoção, podemos ser perdoados, pelo menos em parte.
ResponderExcluir