Furto (s)
* Por Rodrigo Ramazzini
Era final da
tarde de uma quinta-feira. E como acontecia rotineiramente neste dia da semana,
Marcelo estacionou o carro por volta das 18 horas em frente ao apartamento do
amigo Michel para mais um ensaio da banda de rock “As Lendas”. O nome, segundo
os quatro integrantes, era alusão a eles próprios e suas peripécias na vida.
Uma provocação e um exercício de imaginação do que já haviam aprontado durante
as suas curtas existências.
Marcelo era
o baixista da banda e, após retirar o instrumento do interior do veículo,
acionou o alarme e ainda conferiu se as portas e vidros estavam realmente
fechados. Subiu até o apartamento 302 e, durante mais de duas horas, ensaiando
tocou de Pearl Jam a Rolling Stones, passando pelo rock nacional e gaúcho até
chegar às músicas próprias da banda. O ensaio era para um show em um Pub, que
aconteceria no sábado.
Depois de se
despedir dos demais integrantes da banda, Marcelo deixou o apartamento de
Michel, desceu com o baixo os três andares pela escada até visualizar o carro,
que permanecia estacionado na rua. Aproximou-se do veículo, contornou a parte
traseira até parar em frente à porta do motorista. Procurou por um breve
instante a chave no bolso das calças e foi então que notou um furo ao lado da
maçaneta e que a porta já estava aberta. Fora vítima de um furto.
O nervosismo
tomou conta de Marcelo. Suas mãos tremiam. Suava frio. Olhou para todos os
lados, ora em um estado de desconfiança, ora em uma tentativa de ainda
visualizar o ladrão. Sentou no banco do carro. Respirou fundo. Levou alguns
minutos para se recompor do susto. O sentimento oscilava entre a raiva e o
alívio por não estar junto ao carro no momento do crime. Em uma análise rápida,
notou apenas a falta do rádio. “Menos mal. Coisa pouca”, pensou conformando-se.
Ligou o carro e rumou para a Delegacia de Polícia para registrar um boletim de
ocorrência. Lá, o policial civil lhe explicou sobre a técnica dos criminosos
utilizando um furo para realizar o destravamento da porta. Feito o registrou,
partiu para casa carregando o sentimento de impotência e desolamento.
No outro
dia. Marcelo relata o furto a um colega de trabalho.
- Bah,
velho! Nem sabe o que me aconteceu ontem. Furtaram o rádio do meu carro...
- Putz!
Capaz? Onde?
- Lá em
frente ao apartamento do Michel.
- Bem no
Centro?
- Pior...
- Não tem
mais lugar seguro nesta cidade mesmo... Mas tu deste sorte...
- Por quê?
- Porque só
levaram o rádio. De um conhecido levaram o rádio e o estepe...
- Sério?
Putz! Eu não olhei se o estepe estava no lugar. Vamos ao estacionamento olhar
comigo?
- Vamos.
Dez minutos
depois a dupla retorna, com Marcelo esbravejando contra tudo e todos:
- Que
cambada de filho da puta! Eu pego um desgraçado desse... Olha! Eu mato! Com
certeza eu mato! Não tenho pena de vagabundo! O cara trabalha uma vida inteira
para ter os troços para malandro levar em cinco minutos... E esse governo não
faz nada! Nada! Pelo contrário, passa a mão em cima de vagabundo! Bando de...
O estado
irritadiço de Marcelo permaneceu no segundo dia após o furto. Contava o
episódio eloquentemente para um vizinho e que gastaria mais de R$ 500 para
repor o rádio e estepe. Foi então que o vizinho questionou:
- Não
levaram o teu extintor? A onda agora é furtar extintores ABC...
Em dúvida,
Marcelo se dirigiu até o carro para verificar e logo depois, um grito ecoou
pela quadra inteira:
- Caralhooooo!
* Jornalista e contista gaúcho
Depenaram o pobre carro.
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