Cântico
dos cânticos
* Por Daniel
Santos
De alguma potável quimera, de um sítio
recôndito onde iaras e oxuns abrem seu primeiro olho, a água vaza por entre
moitas de taioba e de caninha-do-brejo, numa emissão irregular, rala, só depois
encorpa.
De início, silva, às vezes roufenha, de
outras até gutural, como a experimentar vozes. Não há ainda o rio discursivo, o
acervo manancial, o remanso generoso onde se abebera o gado, mas gotas do que é
já bênção.
Abro a torneira de manhã e ela flui,
enfim, canora num gorgolejante cantochão. Estendo a palma emocionada e ela se
aninha na concha, miúda como no início, quando largou das distâncias para me
acudir.
* Jornalista
carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de "O Estado de
São Paulo" e da "Folha de São Paulo", no Rio de Janeiro, além de
"O Globo". Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995,
Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002,
Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca
Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.
Que maravilhoso poema que ela, a rara, a sumida água!
ResponderExcluir