Fortalecer
a presidenta Dilma e aprofundar a democracia
* Por
Alipio Freire
Há uma nítida
tentativa da direita e ultradireita brasileiras de desestabilizar o governo da
presidenta Dilma Rousseff, coro coadjuvado e alimentado pela grande mídia
internacional (especialmente dos EUA e Inglaterra) com o slogan “CHANGE BRAZIL”
(Muda Brasil); animado por estrelas da envergadura de Lady Gaga e outras peruas
e chesters da mesma granja; e com a adesão de figuras do naipe de Mark
Zuckerberg – o homem do “fez-se-buque”.
Felizmente a
resistência contra a ditadura do pós-64 foi cantada por Carlinhos Lyra,
Vinicius de Moraes, Chico Buarque, Gonzaguinha, João Bosco, Aldir Blanc, Fausto
Nilo, Belchior, Fagner, Milton Nascimento, Capinam, Tom Zé, Torquato, Gil,
Caetano – e interpretadas por, além dos próprios autores, ninguém menos que
Nara Leão, Elis Regina, Odete Lara, Beth Carvalho, Zezé Mota, Elba Ramalho,
MPB-4, Quarteto em Cy, Gal, Bethânia e tantas outras figuras, igualmente
protagonistas daquela saga.
E não se trata de
brincadeira ou retórica: os movimentos podem sempre ser medidos pela qualidade
das representações que produzem. O golpe e a ditadura de 1964, por exemplo,
tiveram – como epígono da arte (representação/comunicação) e da estética que
produziram – Don e Ravel…
Mas vamos aos fatos
Há mais de década, o
Movimento Passe Livre (MPL), tem se manifestado regularmente em várias cidades
do Brasil, quando do aumento das passagens dos transportes. Neste ano, em São
Paulo, o movimento voltou às ruas e, antes de qualquer tentativa de diálogo ou
negociação por parte das autoridades locais (governador e prefeito), que
viajaram para Paris, despejou-se violenta repressão contra os manifestantes,
protagonizada pela Polícia Militar paulista, imediatamente apoiada e aplaudida
desde a França pelos senhores Geraldo Alckmin (PSDB) e Fernando Haddad (PT) –
para não falarmos da grande mídia comercial de Pindorama, useira e vezeira em
glorificar todas as medidas e violências contra a classe trabalhadora e o povo.
Coroando o desastre, o ministro da Justiça – senhor José Eduardo Cardozo (PT),
disponibilizou “forças nacionais” para reforçar a razia iniciada pela PM.
Sinal verde para uma
repressão sem limites
Com relação ao
governador Alckmin, nenhuma novidade: é este o tratamento cotidiano que a sua
PM dispensa impunemente aos habitantes dos bairros populares de São Paulo. O
ministro Cardozo e o prefeito Haddad, porém, deram um passo a mais com relação
à postura que têm assumido: passaram do estágio do habitual e eloquente
silêncio pusilânime, para um apoio explícito e desavergonhado à ação da PM.
Assim, o sinal verde
estava dado pelas principais autoridades responsáveis pela contenção (e mesmo
punição) dos agentes do Estado que violam os direitos constitucionais de
liberdade de opinião e manifestação pacífica dos cidadãos deste País.
Autorizada e
estimulada a reprimir com violência os protestos, a PM prepara com requintes
nova performance: na manifestação (sempre pacífica) do MPL, dias depois, na
avenida Paulista, em formação de parede, a polícia parte para cima dos
manifestantes. A formação em parede – diferentemente da formação em cunha, que
visa à dispersão – é utilizada para o confronto. E foi em parede que marcharam
para o confronto contra os cidadãos que se manifestavam.
Ou seja, o objetivo
claro era o de terra arrasada. Mais ainda: ao mesmo tempo em que avançavam, os
policiais quebravam e incendiavam suas viaturas e outros próprios públicos e
particulares, secundados por personagens à paisana, “skinheads” e outras
formações da direita e dos fascistas – integralistas ou não. Preparavam assim,
certamente orquestrados, o álibi para o terror que semeavam na avenida. Algo
como o argumento de “reação armada” que costumam sempre alegar para suas
vítimas nas periferias, mortas com um tiro na nuca.
O milagre da
multiplicação de manifestantes
E foi desse modo que
prosseguiam os confrontos, até que um dia, em menos de 12 horas – “de repente,
não mais que de repente” –, como se numa Epifania, como se resultado de uma
Revelação, a grande mídia comercial uníssona, passa a defender os manifestantes
e atacar seus agressores. Também o governador Alckmin muda de posição frente à
ação policial, e o prefeito Fernando Haddad silencia. Ao mesmo tempo – e é aqui
que entram a Gaga e suas gaguetes – a mídia dos EUA lança seu lema “MUDA
BRASIL”, o que transborda para outros países.
Mas, “muda” para onde?
A grande mídia
comercial não apenas apoia os manifestantes. Oferece seus préstimos, em termos
de pautar suas reivindicações. Sempre na vanguarda da canalhice, a revista Veja
(edição de 19 de junho) estampa na capa: “A REVOLTA DOS JOVENS – Depois do
preço das passagens, a vez da corrupção e da criminalidade?”
Jornais, rádios, TVs,
Datenas e outros passam a convocar e/ou estimular os cidadãos a participarem
das manifestações. O jornal O Estado de S. Paulo insta todos a cederem seus
wi-fi a serviço da causa. Centenas de milhares lotam as ruas e avenidas de São
Paulo. Mas as organizações populares e/ou de esquerda perdem o rumo e o
controle dos protestos que reúne caoticamente todas as insatisfações difusas da
cidade, com palavras de ordem plantadas pela grande mídia, entre as quais, a
questão da corrupção começa a se destacar. Não faltou sequer a invocação da
nossa Vestal de Ébano: “Corruptos fora. Joaquim Barbosa agora”. Até faixas
pedindo a volta da ditadura estiveram presentes.
Nesse interim, o
prefeito FH reúne o Conselho da Cidade. Vários conselheiros (e pelo menos uma
das conselheiras) educadamente tentam convencê-lo a revogar o aumento. Mas o
prefeito FH permanece irredutível. Não negocia. Somente passados alguns dias
depois de uma reunião com a presidenta Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva (seu Criador), o prefeito aceita voltar atrás com relação
ao aumento. A essa altura, porém, o MPL e as forças populares e de esquerda já
haviam perdido a batalha do controle das ruas de São Paulo.
A lamentável
performance do prefeito FH
O prefeito FH decide
então anunciar a queda dos 20 centavos, lado a lado com o governador Geraldo
Alckmin. O governador fala primeiro, e anuncia que decidiu revogar o aumento
das passagens dos trens e metrô. O prefeito FH fala em seguida, anuncia que
também os ônibus voltarão à tarifa anterior, mas se recusa a utilizar qualquer
expressão que possa significar “revogar”, “recuar” ou “voltar atrás”.
A cena torna-se
patética: uma arrogância descabida, uma empáfia grotesca que desconhece que sua
candidatura é filha de uma decisão apenas da cúpula partidária, sem qualquer
discussão nas (já esfrangalhadas) instâncias ou mecanismos democráticos do seu
partido, e que grande parte da sua votação se deve ao prestígio do seu Criador
e outra (talvez até maior), aos eleitores que, conscientes, escolhem o
candidato “menos pior” ou, no caso da última eleição paulistana, eleitores que
não votaram nele, mas contra o senhor José Serra.
A postura do prefeito
paulistano, estimulando inicialmente a repressão e adiando o quanto pode sua
decisão de atender aos reclamos do MPL – esquecendo (se é que conhece) o
projeto Tarifa Zero, brilhantemente elaborado pelo secretário de Transportes
Lúcio Gregori (gestão da prefeita Luiza Erundina), gerou o tempo necessário à
organização da direita, sua intervenção orquestrada junto às manifestações
populares, fazendo com que estas inchassem, criando sérios problemas para a
presidenta Dilma e a falsa conclusão junto a setores da esquerda e dos
movimentos populares, de um “ascenso do movimento de massas”, que os pode levar
a desastrosas estratégias e táticas.
O que percebemos é um
ascenso da direita e da ultradireita fascista, e é indispensável que nos preparemos
desde já para reverter esse perigoso quadro que poderá sempre extrapolar os
limites da disputa eleitoral do próximo ano, e até implicar rupturas
institucionais “legais”, do tipo que vimos acontecer em Honduras e, ainda mais
recentemente, no Paraguai.
O silêncio oficial dos
partidos políticos chega a ser constrangedor – especialmente o do PT, e a
omissão dos poderes da República nas três esferas (exceto o Executivo Federal
representado pela presidenta Dilma) tangencia o criminoso.
O desconserto das quatro
estações
Em plena véspera do
Inverno no Hemisfério Sul, sentimos no ar o perfume da Primavera Árabe,
aparentemente induzido por nomes tipo Kassab, Alckmin e Haddad. Mas – se nos
detivermos um pouco, rapidamente perceberemos que não parte daí o odor que
paira no ar. Até o começo da queda dos governos árabes, os EUA haviam semeado
(e toda a mídia capitalista internacional amplificou) que, depois da “Queda do
Muro”, a única ditadura que sobrara no Ocidente era Cuba. E de repente, “como
por encanto”, descobriram quase uma dezena de déspotas nos países árabes.
Impressionante como
esses dissimulados ditadores conseguiram passar despercebidos dos serviços de
inteligência dos EUA e das civilizadas potências europeias. Sim, personagens
sinistras, figuras realmente perigosas! A sorte da humanidade é que o princípio
do direito dos povos à sua autodeterminação, conforme esteve inscrito pelo
menos inicialmente na Carta da ONU, parece ter sido banido ou caído em desuso,
e a Casa Branca, vigilante, tem tomado sempre as medidas necessárias à garantia
da democracia em todo o mundo.
Parece-nos que, exceto
a democrática Arábia Saudita, ali nada sobrava. Foram então tomadas as
providências primaveris. Certamente, por mera coincidência, os tais ditadores
primaverizados assentavam-se sobre milhões de barris de petróleo e/ou passagens
de gasodutos e oleodutos.
Com os sucessivos
acontecimentos envolvendo a Venezuela, o Paraguai, a Argentina e agora este
“Change Brazil”, a esperança é que não venhamos a ter um novo Frio Inverno no
Cone Sul.
(Reproduzido de “Brasil
de Fato”).
*
Jornalista e escritor
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