sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

A reportagem policial


* Por Rodrigo Ramazzini



O Ariovaldo, ou Ari, como o chamavam, era um repórter novo no jornal. Entrou no periódico de médio porte e desde então, sempre trabalhou na editoria de esportes. Gostava e conhecia o assunto, por isso fora inicialmente destinado para essa área.

Era uma quarta. Ariovaldo chegava para mais um dia de trabalho, já pensando no material que precisaria para cobrir os jogos de futebol daquela noite, quando o diretor de redação o mandou chamar em sua sala.

Ariovaldo ingressou na sala e o diretor, que estava em um “dia daqueles”, mal o olhou e, secamente, ordenou, entregando alguns papéis sobre o crime: “Faça a cobertura deste assassinato!” Pensou em argumentar que não era da editoria de polícia, mas acabou desistindo, afinal, precisava do emprego.

Com os papéis que o diretor lhe havia entregado em mãos, Ari decide ir primeiramente à delegacia de polícia. Seria a primeira vez que pisaria profissionalmente em uma, pois a única vez anterior fora para registrar o furto de uma bicicleta.

Abriu a porta preta de acesso e entrou na delegacia. Um forte choro ecoou logo que ingressou. Fechou a porta, e escorou-se no balcão da recepção. No interior da delegacia a movimentação era intensa. A delegacia possuía dois corredores, um para a esquerda que levava para as celas prisionais, e um reto, onde estavam distribuídas as salas administrativas e o banheiro. Ari cumprimenta uma testemunha que aguardava para depor justamente sobre o caso do assassinato que ele estava cobrindo. Espera alguns minutos até ser recepcionado por um escrivão. Pede para falar com o delegado. Enquanto aguarda, começa a coletar dados com a referida testemunha.

O delegado aparece e, apressado, indaga: “Qual o assunto?” Ari começa a explicar o motivo da sua presença, que gostaria de entrevistá-lo sobre o crime, mas o delegado, que não pára para conversar, pois caminha de um lado a outro, entrando e saindo das salas resolvendo os problemas, desaparece por alguns segundos. Quando reaparece ordena: “Puxa no bloco então!” E começa a descrever a cena do crime.

Quando Ari vai fazer a primeira pergunta, chega um agente funerário, trazendo uma certidão de óbito. O delegado interrompe a entrevista para atendê-lo. Retorna questionando: “Onde paramos?” E ele mesmo responde: “Ah, sim!” E continua a falar sobre o crime. Ari consegue fazer algumas perguntas ao delegado, mesmo ele não parando especificamente para respondê-las, mas em cada “passagem” obtém uma resposta, quando novamente prantos desesperados voltam a ressoar, vindo de uma das salas. É a vizinha da vítima do tal assassinato que está indo embora. Era testemunha. O delegado sem paciência exige: “Pára de chorar que não era o seu filho!”  Prontamente um silêncio tomou conta do lugar.

Entre essas idas e vindas do delegado, Ari vai conseguindo “arrancar” respostas para os seus questionamentos, anotando tudo em seu bloco, escorado no balcão. Foi quando ela apareceu. Vestindo uma calça azul de brim, a loira, de cabelos longos e seios fartos, “desfila” em frente aos seus olhos, passando sensualmente a língua sobre o lábio inferior. Trabalhava no setor de perícia. Suspirando, Ariovaldo esquece por segundos onde se encontrava. Foi despertado quando policiais entraram abruptamente na delegacia com um preso.

A coleta de dados da primeira reportagem policial da vida do Ari estava quase finalizada, faltando, apenas, descobrir o nome ou apelido do assassino foragido. Na primeira vez que questionara, o delegado apenas redargüiu: “Já identificamos o criminoso e sua prisão é questão de tempo. Não posso revelar o nome, pois de alguma maneira isso pode prejudicar as buscas”. Foi então que Ari perguntou ao delegado, pois, segundo as informações que possuía, um animal teria morrido junto no crime: “E o cavalo? Onde entra nesta história?” O delegado, parando por um instante de uma “vinda”, reflete um pouco, e Ariovaldo contando com a sorte necessária no jornalismo, escuta-o responder, indignado, sem se dar conta: “Cavalo? Que cavalo, rapaz!? Não é Cavalo. É Burro o apelido do assassino! Por causa das orelhas...”

* Jornalista e cronista



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