Raízes negras do rock
A verdadeira origem do rock – atribuída, oficialmente, ao
filme “Blackboard Jungle” e, mais especificamente, à sua trilha sonora com
destaque para a composição “Rock Around the Clock”, de Bill Halley,
interpretada por ele e sua banda, “The Comets” – é certamente muito anterior a
isso. É, na verdade, fruto de um processo. e não somente musical, mas também
cultural e social, que se desenvolveu ao longo do século XX e que é, até mesmo,
anterior a ele. Sua raiz, de fato, é afro-americana. São os negros e suas
manifestações que estão por trás dessa colcha de retalhos de ritmos. O rock é,
queiram ou não, fusão de vários e vários deles, cada qual contribuindo, muito
ou pouco (não importa) para o produto final.
Minha proposta, portanto, não é a de apurar, tim-tim-por-tim-tim,
sua “verdadeira” história, com cada detalhe e respectiva prova documental, o
que demandaria muito tempo para pesquisa, para a busca de fontes confiáveis (se
é que elas existam) e sempre restaria algum “furo”. O rock não nasceu pronto.
Foi se formando e transformando ao longo do tempo (transformação esta que ainda
não acabou). Em suma, foi (na verdade é) um “processo”. O rock conquistou, de
forma tão rápida e generalizada, público tão grande, principalmente depois que
começou a ser divulgado massivamente, sobretudo pelo rádio (de certa forma
salvou-o de desaparecer após o advento da televisão) pelo seu caráter
interativo. Ao contrário de outros estilos musicais, ele exige uma troca entre
quem o canta e toca e quem o ouve. Não é para ser, simplesmente, ouvido. Pelo
contrário, induz os expectadores e ouvintes a dançarem, a movimentarem cada
parte do corpo, a darem vazão ao entusiasmo, numa espécie de desabafo, de grito
de liberdade. Pressupõe isso.
É o que se espera do público durante sua apresentação. Paulo
Chacon, no livro “O que é o rock”, observa: “Por isso, dançar é fundamental. Se
não houver reação corpórea quente, não há rock”. Vocês já viram um show desse
ritmo em que a platéia permaneça passiva, calada, atenta, apenas “ouvindo” a apresentação
do cantor e da banda que lhe dá sustentação rítmica, como ocorre, por exemplo,
em concertos de música clássica? Ora, ora, ora... Onde? Quem? Duvido!!! Isso
não combina com o rock. O que se vê, invariavelmente, é o público participando
ativamente, cantando junto, apupando, gritando, participando e, se houver
espaço no local do show, dançando. Mesmo quando não há, as pessoas acabam dando
um jeito. Ou seja, a platéia interage. Não raro, vai ao delírio. Chega a entrar
em transe. Provavelmente nisso esteja o segredo do seu sucesso.
Como afirmei, esse estilo musical é uma fusão de vários
outros estilos (e comportamentos) que, ao longo do tempo, foram se fundindo,
emprestando seus elementos mais característicos – muitos dos quais ainda é
possível identificar no produto final: ou seja, no rock. Cite-se, por exemplo,
o “Rhythm and blues” (o famoso R&B). E citem-se outros tantos ritmos de
música negra, notadamente dos tão socialmente discriminados negros do Sul dos
Estados Unidos. Com a maciça migração de artistas afro-americanos para os
subúrbios das grandes cidades do Norte, surgiu um blues, digamos, urbano, que
influenciou, decisivamente, o rock. Outra grande influência foi a da música
gospel, de onde proveio, certamente, sua interação. Afinal, esses hinos religiosos
pressupunham (ou pressupõem, pois ainda existem) acompanhamento com palmas dos fieis
e estribilhos cantados por eles.
Não se pode esquecer o papel do “Jump band Jazz”. Essa
vertente incorporou-se ao R & B, que ao fim e ao cabo, é uma espécie de
proto-rock. O editor e produtor editorial Filipe Laredo, no excelente texto “A
origem negra do Rock n’ roll”, destacou o seguinte fator que tornaria, mais
adiante, o novo ritmo tão atrativo: “Deixando para trás os lamentos de
sofrimento e dor dos tempos da depressão tocados pelos bluesmen rurais, o
R&B contemplava principalmente o amor e as experiências sexuais da vida
real. Enquanto o ritmo ia se tornando cada vez mais popular, um novo público de
jovens ouvintes negros ia surgindo, à revelia de grande parte da população
branca, que tinha excesso de pudor e também não aceitava que uma música negra
invadisse seus ouvidos”.
Bem, resumindo tudo, já que o processo não foi tão simples
como possa parecer na leitura dos meus inábeis comentários (afinal, não sou especialista
na matéria, mas mero curioso), Filipe arremata, assim, seu brilhante
texto: “Coube... aos jovens sedentos por
mudanças a mistura sócio-musical tão importante para a origem de um ritmo que
vem se fazendo presente até os dias atuais. Dessa forma, a juventude mostrou
toda a sua força para a sociedade, especialmente a americana, cheia de
recalques e preconceitos. Tanto negros quanto brancos passaram a cantar e
dançar juntos e o rock serviu como instrumento de contestação e revolta, mesmo
que de maneira sutil e despretensiosa”. É certo que acabou cooptado pelo “sistema”.
Mas...
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Fui me apaixonar pelo rock na década de 1980. Na época de explosão global do ritmo eu não me ligava muito nele.
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