Estar na moda está na moda
* Por
Mara Narciso
Em definitivo, não ter
a menor idéia sobre o que está sendo usado sobre o corpo é estar por fora de
tudo. O dinamismo das mudanças deixa os aficionados ainda mais neuróticos do
que os investidores da Bolsa de Valores. No tempo da hiperinflação havia uma
coisa chamada overnight, na qual, no ritmo do tic-tac do relógio os números
referentes ao preço de venda de certo produto mudavam de instante em instante.
O galope era outro, e não era engraçado.
Os quadros de moda
anunciados em jornais, revistas, TVs e blogs, as vitrines em verdadeiro frisson
quando chega o verão, as frequentes liquidações de toda quinzena mostram uma
realidade acelerada em termos de moda descartável, do tipo que passa voando. A
internet faz o estilo que passa de raspão ser ainda mais descartável, pois um
vídeo postado de manhã, ao meio dia pode ainda estar sendo curtido. Que povo
ultrapassado! Ainda não viu isso daí?
Repetir roupa em festa
ficou ainda mais constrangedor devido às montanhas de fotos postadas. Quem vai
ter coragem de ir ao outro casamento ostentando essa coisa já mil vezes
curtida? Nem que fosse couro bovino para passar por esse processo de conservação.
Roupas caras, chamativas, deslumbrantes então, ficam mais vistas que as das
atrizes do Oscar, quando atravessam o tapete. A novidade não dura um segundo,
talvez décimos, apenas o tempo de um avistamento, algo como contatos imediatos
do terceiro grau, e em vez de moda de uma estação, passa-se a disputar frações
de segundo como nas provas olímpicas.
Bolsas, sapatos,
acessórios, cores, riscam o céu da vaidade na velocidade de um raio. O que será
duradouro? Ainda existirão os clássicos? A padronagem é linda, original,
marcante, mas tão rápida quanto um tsunami. Sem pensar nos anexos. E de
imaginar que em tempos outros se tinha uma peça coringa que entrava em várias
toilettes? Refiro-me às tias e à minha
mãe, pois nunca soube nada sobre isso, por burrice, incapacidade, desinteresse,
ou parafuso a menos, além de falta de numerário, obviamente. Ainda assim,
admiro o chique, o elegante, o único, o exclusivo, aquela roupa que só combina
com um alguém. Por incoerência, fico de olho no grupo conhecido como “As
Poderosas”, do qual uma minha tia faz parte.
Saindo das roupas e
indo para as casas, ainda hoje coloquei sobre a mesa de jantar um caminho de
mesa. Pensei: há anos vejo falar que não se usa mais esse tipo de artefato.
Ficou out, antigo, démodé, para usar palavras tão velhas quanto essa moda. E
outra coisa, ninguém deste mundo sabe o que vem a ser calça com vinco. Quanto
ao formato dos móveis, tudo reto, e depois de amanhã tudo redondo. Hoje, tudo
peça grande, mas logo, logo tudo pequeno. As cores são decididas por um
grupinho de meia dúzia, pois em todo canto só se vê as mesmas cores e os mesmos
tons, renomeados, naturalmente. E usar um móvel específico que destoe de todo o
resto, também combina.
Os decoradores dizem há
décadas que assim pode e assim não pode, mas o que precisa mesmo é que a pessoa
se sinta bem em sua casa e que tudo se pareça com ela. Sim, sim, estou
entendendo. No século passado a família construía uma casa, comprava um carro,
fazia umas poucas viagens para longe, ficava-se casado por 60 anos. A
tecnologia atravessava o oceano a pé, e um filme lançado nos Estados Unidos
vinha de Zepellin, numa jornada de meses, que era para causar maior emoção na
audiência.
Eu estou na moda, exijo
de mim mesma estar permanentemente na moda. E para quê? O mundo da moda precisa
faturar. Isso já é um motivo justificável. Então vamos listar. É proibido
envelhecer, também não se pode repetir à noite a tecnologia de hoje ao meio
dia, mas fingir que já se soube da novidade de amanhã, pode.
O coração não vai bater
mais do que 80 vezes por minuto, exceto na esteira ergométrica. Os que já vivem
cansados das imposições feitas por eles mesmos, deveriam se acalmar e impor
outra moda: calma, paciência, tempo sobrando, atenção às pessoas e ao que se
esta fazendo, ouvir, degustar, olhar e respeitar o outro. Prestar atenção não
só no cachorro, mas no amigo, e não ficar com o olho esticado sobre uma tela ou
alguma outra coisa. Isso sim, nunca deveria ter saído de moda.
E sobre o caminho de
mesa, eu o coloco onde eu quiser, e se me der na telha fazê-lo de turbante ou
cachecol, estará num bom uso. A moda é louca? Eu sou louca e meia. O cabelo tem
de estar liso? Não dou a mínima para isso. No máximo estarei fora de moda, com
os meus fios grossos e desalinhados. E quem se importaria com isso, se nem
mesma eu me importo? Mas, que ninguém se implique com as minhas palavras e
entenda que faço um discurso contra a moda. Afinal um escrito desses bate na
parede e fica por lá. Morre. Quem se importa com textos natimortos?
*Médica endocrinologista,
jornalista profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto
Histórico e Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a
Hiperatividade”
Apoiado, Mara. Eu também, em matéria de moda, sigo uma única tendência: ficar bem fora dela. E bem longe de quem a ela dá valor. Abraços.
ResponderExcluirAchando muita graça do seu comentário, Marcelo. Sua veia humorística não tira férias. Sempre ao seu lado. Obrigada pela força em ler o texto e em acompanhar-me no pensamento.
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