Mulher à beira de um ataque de nervo
* Por
Evelyne Furtado
No consultório do
analista, Carmem choraminga e diz que não agüenta mais sofrer:
- Não sei mais se ele
me ama. Há duas noites não durmo, pois não paro de pensar nisso.
- Você poderia
descrever o que sente? Pede o analista.
- Sinto o chão se
abrir. Como se fosse acabar a alegria na minha vida e não fizesse sentido mais
viver.
O profissional a
observa. Ela esboça um sorriso tenso, encobrindo a emoção que sente. Uma sombra
se instala sobre seus olhos. Ele fala:
- O que a leva a pensar
que a vida não terá mais continuidade? Você é perfeitamente capaz de buscar
outros caminhos e sabe disso. Já conversamos muito sobre o assunto.
- Eu sei, mas não posso
me controlar. O medo vai aos poucos tomando conta de mim. Preciso desse amor,
não sei viver sem ele.
- O que mais me
impressiona é ver uma mulher tão inteligente se deixar levar assim pelas
emoções. Você tem sangue espanhol minha filha?
- Tenho sim, Doutor.
Por que o senhor pergunta?
- Nada importante, mas
tive a impressão, olhando para você, que estava diante de uma personagem de
Almodóvar. Uma mulher à beira de um ataque de nervos e sem nenhum motivo
concreto para se encontrar assim.
-O senhor acha que não
é um bom motivo ele não gostar mais de mim?
- Não é não, senhora!
Deve ter muita gente que gosta de você e por mais que doa, não é por apenas uma
pessoa não gostar de você que você deve desistir de viver.
Ela parece refletir. A
sombra permanece no seu olhar. Endireita-se na poltrona, olhando para o
psicoterapeuta e indaga:
- O senhor nunca sofreu
por amor?
O médico, não parece se
assustar com a impertinência, mas leva alguns segundos para responder.
- Não estou sendo
analisado, mas posso lhe dizer que já sofri, sim, mas não morri. Você está me
vendo aqui.
-Ah, mas eu sou
diferente. Disse Carmem, parecendo uma menina mimada.
-Claro que você é
diferente, porém tem tanta força como eu. Encontrará uma maneira de lidar com a
situação. Eu lhe asseguro.
Ela deixa as lágrimas
correrem por seu rosto. Sente-se uma menina abandonada e imagina o esforço que
fará para superar mais uma perda.
O terapeuta olha-a e
diz que é importante encarar essa possibilidade, mas que tudo pode ser fantasia
dela. Ele não enxerga com muita clareza as causa que a levaram a acreditar que
o namorado não mais gosta dela. Enquanto o ouve o rosto dela vai se iluminando
aos poucos:
- O senhor acha mesmo?
- Acho sim. Espere e
não seja tão ansiosa. Pode não ser nada disso.
Agora os olhos de
Carmem já brilham de alívio. O sorriso ilumina seu rosto. Pensa que o analista
pode ter razão.
O tempo acabou, antes
que o terapeuta pudesse dizer que não tinha certeza de nada. Que tudo poderia
acontecer. Ele ainda tentou, mas a cliente decidida já se despedia.
Ela sai do edifício com
a alma leve e uma expressão inegável de alegria no modo como se dirigia ao seu
carro no estacionamento. Dera uma pausa no sofrimento.Ufa!
* Poetisa
e cronista de Natal/RN
A terapia é um pouco como estar com fome e comer. Por duas horas o efeito das palavras do terapeuta têm um efeito sedativo. Depois recomeça o chororô. São um ponto de partida para se ver a situação sob um novo ângulo, embora o problema continue como sempre esteve. I M E N S O !
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