Somos
sentenciados?
* Por Pedro J. Bondaczuk
A vida nos foi dada à nossa
revelia e tanto pode ser encarada como um privilégio, um prêmio pelo fato de
determinado espermatozóide haver vencido uma árdua corrida de obstáculos, entre
bilhões de outros tantos competidores e fertilizado “aquele” óvulo específico,
entre centenas deles, quanto uma sentença, um tormento, um castigo inescapável
e injusto.
Podemos dar uma ou outra
interpretação e ambas serão, até certo ponto, corretas. Isso, porque
desconhecemos qual nosso destino depois da morte (se é que haverá algum). Ou
seja, ninguém sabe, com certeza, se há algum tipo de vida melhor, além-túmulo,
ou se tudo se encerra por aqui e, quando nosso cérebro deixa de emitir impulsos
elétricos e nosso coração pára de pulsar, desaparecemos e retornamos ao pó, sem
deixar vestígios, a não ser lembranças que, mesmo assim, um dia também se
extinguirão.
Se a verdade for o primeiro caso
(e não temos nenhuma prova que o seja, a não ser mediante a fé), nossa
existência é, de fato, um prêmio, que gozaremos eternidade afora. Se, todavia,
for o segundo... Então, somos, de fato, sentenciados, com a mais cruel e dura
das sentenças.
Viemos para um universo
estranhíssimo, cercados de perigos por todos os lados, submetidos a obrigações
de toda a sorte, com raros e fugazes momentos de prazer. Podemos ter alguma
doença incurável, a nos roer infatigavelmente as entranhas, em meio a atrozes
sofrimentos, cientes de que se aproxima o fim, sem que saibamos quando e como
ele virá e sem que, muito menos, possamos evitar.
Podemos ser decapitados por algum
fanático, ou mortos por algum pitbull, ou alguma fera selvagem que fuja de um
circo; ou assassinados por algum maluco (ladrão ou policial que nos confunda
com algum bandido); ou atropelados por algum automóvel dirigido por um
irresponsável etc. etc. etc. As formas de morrer são as mais variadas
possíveis, e todas violentas (mesmo que o “sono eterno” nos venha durante o
“sono noturno”).
Embora escapemos dessas
tragédias, e levemos vidas razoavelmente alegres e felizes, nunca estaremos a
salvo de perigos. Podemos, por exemplo, ser surpreendidos, a qualquer momento,
pela paranóia de algum imbecil submisso, que atenda a uma ordem suicida de
algum idiota detentor do chamado “poder”, que sem essa ou mais aquela, lance
algum dos milhares de artefatos nucleares que há por aí sobre nossa cidade e
nos destrua (e a todos os demais companheiros de “aventura”), em pavorosa
hecatombe.
Os perigos que nos ameaçam (sem
nenhum exagero), são tantos, que a enumeração de “todos” eles, se isso fosse ao
menos possível, daria para preencher um volume da grossura de uma lista
telefônica da cidade de São Paulo. Cometas, meteoritos, vulcões, terremotos,
tsunamis (como o que se abateu sobre a Ásia em dezembro de 2004, que foi tão
forte, que tirou a Terra de seu eixo em quase um grau, o que, certamente, trará
conseqüências futuras, mesmo que não se possa prever quais serão), são outras
tantas possibilidades de destruição do nosso judiado, depredado, superlotado e
poluído domo cósmico.
E o que podemos fazer para
evitar? Quanto às citadas catástrofes naturais, não há nada, absolutamente nada
que possa ser feito por esta criatura ao mesmo tempo notável – por contar com
consciência e razão – e bronca e frágil – face ao esmagador poder da Natureza –
chamada, eufemisticamente, de Homo Sapiens.
Mesmo sem nenhuma prova ou
indicação razoável, prefiro, pois, crer na primeira hipótese que levantei acima.
Ou seja, a de que a vida tem sentido e que é, sobretudo, uma fase de preparação
para algo muito melhor no porvir.
Morris West escreveu o seguinte,
a esse respeito, no romance “A Torre de Babel”: “Somos concebidos sem
consentimento, arremessados soluçando em um universo estranho, com a sentença
já escrita na palma da mão impotente; um cancro devora-nos as entranhas, um
fanático com um machado corta-nos a cabeça; um tigre, fugido de um circo de
aldeia, despedaça-nos; um louco embriagado atropela-nos com um automóvel;
viveremos, sorridentes e loquazes, até que um idiota submisso largue uma bomba
de hidrogênio em nosso pátio”.
Há, por acaso, qualquer absurdo
ou exagero na constatação do romancista australiano? Objetivamente, não vejo
nenhum. Acho que Morris West até que foi otimista diante da realidade da qual,
sem sequer nos darmos conta, procuramos fugir a todo o instante, para não
comprometer nossa sanidade mental. E você, amigo leitor, qual é a sua intuição
ou opinião? Recebemos, ao nascer, oportunidade ou castigo? Nosso destino é a
eternidade ou a eterna anulação? Somos seres destinados a durar para sempre ou
não passamos de mero e fugaz desperdício de vida?
* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de
Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do
Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em
equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por
uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de
“Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O
Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
Viver é maravilhoso e ao mesmo tempo "perigoso". Mas vale a pena, mesmo terminando na hora do adeus, como eu imagino que seja.
ResponderExcluir