Bandido Noel
* Por
Marcelo Sguassábia
Entalado em chaminé, velhote obeso é detido à
meia-noite do dia 24
Após o constrangedor flagrante e identificando-se apenas como Noel - que
não sabemos ainda tratar-se do nome verdadeiro, apelido ou codinome - , o
suspeito não portava documento algum, vestia roupas de cetim vermelho e foi
imediatamente encaminhado à Terceira Delegacia Seccional da Zona Norte para
interrogatório e demais averiguações. O enorme saco que trazia às costas,
também em cetim vermelho, comportava uma incalculável variedade de mercadorias,
em sua maioria brinquedos, todas elas sem Nota Fiscal. A evidente suspeita de
contrabando levou o delegado a acionar a Polícia Federal. Interrogado pela
autoridade aduaneira competente, o septuagenário não se defendia das acusações
e se limitava a articular, de quando em quando: "É Natal, é Natal... Ho,
ho, ho...".
O detetive Lampreia, que costuma assessorar o delegado local nesse tipo
de investigação, deduziu que Natal, a capital do Rio Grande do Norte, talvez
seja ponto de receptação da muamba.
Somada à suspeita de contrabando, o idoso foi ainda indiciado por
invasão de domicílio, sendo o delito testemunhado por centenas de moradores das
vizinhanças da casa invadida. Questionado sobre a razão que o motivou a
praticar tão reprovável ato, Noel respondeu: "É o nascimento de
Jesus". Foi quando o Cabo Jonas comentou com o detetive Lampreia
lembrar-se de um meliante, que há oito anos fora detido e fichado na mesma
delegacia sob acusação de latrocínio, cujo nome era Deoclécio Nascimento de
Jesus. Estabelecia-se assim mais uma conexão suspeita, que complicaria ainda mais
a situação do barbudo e também envolveria Deoclécio como provável cúmplice ou
co-autor da façanha.
O interrogatório, ou a tentativa de, prosseguiu madrugada adentro e ao
longo de todo o dia 25, mas o misterioso caso permanece inconclusivo até o
momento. O que mais intriga os investigadores é o fato de que, fosse Noel
realmente um bandido, não vestiria traje tão berrante e espalhafatoso, pois
obviamente sua ideia seria a de não chamar a atenção.
Nesse meio tempo, o Cabo Jonas levantou a hipótese de formação de
quadrilha entre Nascimento de Jesus, Noel e o dono da residência, que até então
mantinha-se a salvo de maiores suspeitas. Argumentou o Cabo que o envolvimento
do morador era muito provável, pois era em sua casa que Noel tentava adentrar
com o contrabando. E que se, ao invés de entrando, Noel estivesse saindo com as
mercadorias pela chaminé (o que a princípio contraria a lei da gravidade),
teríamos o dono da casa indiciado como receptador de produtos sem procedência,
e o velhote Noel acusado de ladrão de muambeiro.
Aos munícipes que tiverem alguma pista ou informação que ajude a
elucidar o caso, pedimos a gentileza de encaminhá-las, ainda que anonimamente,
às nossas autoridades.
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Marcelo Sguassábia é redator publicitário. Blogs: WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).
Essa imagem estranha, nascida da cabeça de algum insano, é relativamente recente, de 1930, se não me engano. Significa tanto quanto é horrível. E o melhor: eu já acreditei em Papai Noel. Boas falas, Marcelo.
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