Pequenos detalhes
* Por Rodrigo Ramazzini
Despertou cedo naquele dia. Assustado. A projeção da
cerimônia do próprio sepultamento em um sonho trouxera inquietação. Ficou
mexido. Tinha medo da morte. Sentiu-se diferente. Levantou da cama e pôde
deslumbrar-se com o nascer do sol. A visão associada ao gosto do café passado
na hora tomado em pé na porta de casa trouxe-lhe a sensação de bem-estar. Saiu
para trabalhar rindo de si próprio, depois de uma tentativa de calçar o tênis
direito no pé esquerdo e vice-versa. O bom dia empolgado do motorista de ônibus
cativou-o a fazer o mesmo ao cumprimentar as pessoas que cruzasse ao longo do
dia.
O abraço afetuoso da filha que caminhava lentamente
com a velha mãe em uma rua da cidade despertou-lhe o mesmo sentimento. Ligou
para os pais e disse-lhes que os amava.
Cruzou por uma charmosa borboleta, que planava suavemente despreocupada
com as suas asas em tons avermelhados. Comprou uma flor para decorar o ambiente
de trabalho. Lá, o brilho nos olhos de uma colega ao recepcioná-lo instigou-lhe
o otimismo e a alegria em estar vivo. Os desafios foram sendo vencidos. Fazia o
que gostava. O dia fluiu positivamente. Nem viu as horas passarem.
A cerveja gelada na esquina com os amigos realmente
espantou o mal, como diz a música do O Rappa, no happy-hour daquela
quinta-feira. O som harmonioso da banda do bar de fundo era a trilha sonora
perfeita.
O cheiro gostoso exalado pelo cabelo molhado da bela
morena, que lhe abriu um sorriso ao vê-lo, deixou rastros pela avenida na volta
para casa. O coração disparou.
Antes de entrar em sua residência, cortejou a imensa
e amarelada lua daquela noite, que com a sua imponência o fez pensar sobre quão
pequenos somos. “Somos nada mesmo”, refletiu.
O banho quente o fez relaxar e sentir-se bem. Jantou,
deu uma colherada no pote de doce de leite na geladeira e apreciou por alguns
segundos o seu gosto adocicado. Olhou um pouco do seu programa preferido na
televisão. Enfim, era hora de deitar-se. Estava exausto. Antes de dormir,
resolveu rezar e agradecer a Deus por ter propiciado aquele dia diferente, em
que notou tantas coisas boas à sua volta. Fechou os olhos. Foi então que
percebeu que não era o dia que fora diferente. Tudo sempre esteve ali. Ele é
que estava vendo a vida passar de outra forma...
* Jornalista e
contista gaúcho
É a nossa grande maneira de mudar o mundo. Parce óbvio, e é: mude você, já que n~]ao pode mudar os outros, embora tente. Não conhecia esse seu lado romântico filosófico, Rodrigo.
ResponderExcluirObrigado pela leitura, Mara! É o Rodrigo em suas múltiplas facetas literárias! Há! Há! Há!
ResponderExcluirTenha um ótimo final de semana!
Aquele abraço!