Médicos na favela
* Por
Júlio César Macedo Amorim
Bem na entrada da
favela de Heliópolis, entre uma agência bancária e uma loja de departamentos,
desponta uma clínica médica que só realiza consultas particulares.
Não vale convênio,
tampouco cartão do SUS.
Quem passa ali
estranha. Muitos moradores custam a ter coragem de entrar. Só perdem o medo na
medida em que o boca a boca se espalha ou quando leem um cartaz bem à frente do
portão que informa, em linguagem clara e direta, o valor das consultas: R$ 40
para clínico-geral e R$ 60 para qualquer uma das dez especialidades oferecidas,
que pode ser dividido em duas parcelas.
“Quem disse que essa
população não pode ir ao médico particular?”, diz o criador do Dr. Consulta,
Thomaz Srougi.
Ele se refere ao seu
público-alvo: gente sem plano de saúde e cansada das filas dos postos públicos.
O perfil exato dos moradores da maior favela da cidade.
Para atendê-los, a
estrutura é simples, porém bem equipada. Nos consultórios – separados por
divisórias de fórmica e com cadeiras de plástico -, há equipamentos caros, como
o usado em exames oftalmológicos e o de ultrassonografia, além do
eletrocardiograma. Em casos mais sérios, em que seja necessária a internação,
os pacientes são encaminhados ao hospital público.
O atendimento é feito
por uma dúzia de médicos, todos formados em universidades conceituadas e
integrantes do corpo clínico de hospitais de ponta, como o Sírio-Libanês e o
Albert Einstein.
O diretor da clínica,
por exemplo, é Cesar Camara, indicado por Miguel Srougi, um dos urologistas
mais conceituados da cidade e pai de Thomaz.
Na quarta-feira
passada, Cesar saiu de Heliópolis e tomou o metrô Sacomã em direção ao Sírio,
para atender um dos seus pacientes. Em seu consultório, a consulta custa R$
450, sete vez o que pagou cada um dos dez pacientes atendidos naquela tarde.
“Engajei-me no projeto
porque consigo garantir um atendimento humanizado. Tem consultas em que levo 40
minutos, mesmo tempo que pratico no consultório particular, o que seria
impossível na realidade dos convênios.”
Todos os médicos dali
já haviam atendido por planos privados e recebem em Heliópolis o mesmo que
ganhariam em um convênio: cerca de R$ 40 por hora.
A diferença é que estão
livres das conhecidas metas de atendimento que encurtam as consultas a cada
dia.
“Selecionamos os
médicos por esse perfil humanizado. É importante serem egressos das melhores
universidades, mas isso não basta”, diz Cesar.
Desde sua inauguração,
em agosto de 2011, a clínica tem crescido 40% por mês e hoje realiza 600
procedimentos a cada 30 dias.
A conta ainda não fecha
porque houve investimento de cerca de R$ 1 milhão em estrutura, mas a receita
tem aumentado à medida que a população descobre o local.
Dos 300 mil habitantes
da região, só 10% conhecem a clínica, segundo pesquisa encomendada por Thomaz.
Nos sonhos do
administrador, ele vê uma clínica em cada um dos 96 distritos da capital. Só
para garantir o público, as próximas unidades devem ser instadas em bairros
periféricos, como Itaquera e São Miguel Paulista, na zona leste. “Inspirei-me
em projetos parecidos em países como Guatemala e México. Testei, adaptei e
agora quero crescer, sempre seguindo essa lógica simples, de gerar renda ao
mesmo tempo em que agrego um valor muito importante à população.”
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