O plano
quase perfeito
* Por Rodrigo Ramazzini
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Bolei...
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Bolou o quê?
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O plano.
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Que plano?
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Que plano, Valdeci? Ora, que plano, Valdeci? O pra pegar a nega!
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Ah Tá! Tinha me esquecido da tua desconfiança... Estou dormindo ainda...
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Se ela tá me aprontando, agora, eu pego... Eu vou matar ela e ele! Já consegui
até um revólver emprestado.
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Calma, Hélio! Vai com calma... Será mesmo que ela está te traindo? Ou isso é
coisa que colocaram na tua cabeça?
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Olha a gracinha, Valdeci! Olha a gracinha! O assunto é sério...
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Eu sei...
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Tu ri porque não é tu.
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Eu acho que ela não te trai... Não tem jeito de mulher que faz isso...
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Aí que mora o perigo, Valdeci! As mulheres são imensamente mais silenciosas e
discretas na arte de trair do que os homens...
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Pode até ser... Só não entendi direito o porquê dessa desconfiança. Só por que
ela anda se arrumando? Qual a mulher que não gosta de fazer isso?
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Como eu havia te falado... De uns meses pra cá a nega está diferente. Fez
dieta, arrumou o cabelo, anda sempre maquiada e perfumada...
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E tu achas isso ruim?
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Não! Mas...
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Ela não pode estar se arrumando pra ti, Hélio?
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Depois de tantos anos juntos, Valdeci? Me poupe! Santa ingenuidade... Minha
intuição me diz que ela está me aprontando...
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Sei...
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Ela oscila cobranças com momentos de carinho, muito “mimimi”...
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Ela é igual às outras mulheres.
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A nega não era assim...
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O que pretende fazer?
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O meu plano é o seguinte: quando eu sair para trabalhar à noite, irei colocar...
Como se diz... Onde a gente passa... A gente caminha pra chegar na casa...
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Nos acessos da casa?
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Isso! Nos acessos da casa... Vou colocar uma camada de cal em cada acesso...
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Pra quê? Não entendi...
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Simples! Se tiver marca de pegadas na cal é porque alguém teve lá na minha
ausência. Daí, para o flagrante será uma questão de tempo...
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Entendi... Mas, ô Hélio! Não era mais fácil colocar uma câmera, não?
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E eu lá sei mexer com isso?
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Pede para alguém... Contrata alguém... Está cheio de moleque por aí que
instalam câmeras...
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Qual desculpa eu daria? Iria dizer para o instalador que estou desconfiado da
minha mulher? Não! Não! Para ficar com fama de corno, não! Só contei pra ti
porque confio em ti...
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Não precisa dizer para o que seria... Diz que é para segurança da casa e tal...
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É... Pode até ser... O problema seria a nega... O que eu iria falar pra ela?
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Diz a mesma coisa.
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Ela não acreditaria. Iria dizer que temos coisas mais importantes para comprar
do que uma câmera. Além do mais, se ela está se encontrando com alguém lá em
casa, com a câmera, ela pararia e daria outro jeito de aprontar...
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É... Tens razão... Só se instalasse escondido dela?
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Não tem como! Muito difícil...
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Sei... Então, por que tu não pedes para soltar mais cedo esta noite e pega no
flagrante?
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Eu vou fazer isso no dia do flagrante. A questão é que primeiro tenho que ter
certeza que a nega está me traindo... Tenho que dar o “bote” certo, entendi?
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Arãn!
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Por isso que o meu plano é genial. Primeiro, eu confirmo ou não a traição, sem
levantar qualquer suspeita. Até porque se a nega desconfia que estou fazendo
essa investigação, ela faz um escândalo!
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Entendi... Só tem um detalhe: ela não vai ver a cal espalhado pelo pátio?
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Já pensei nisso e tenho a solução. Quando eu chegar pela manhã, eu varro e digo
que coloquei veneno para acabar com as formigas. Até já comprei o veneno... A
cal, também!
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Entendi... Eu tenho lá minhas dúvidas que esse teu plano vai funcionar, mas
tomara que funcione!
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O plano é genial, Valdeci! Vai ver...
No
dia seguinte...
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E aí, Hélio! Deu certo o plano?
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Não.
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Como não? Não era um plano genial?
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Era... O problema foi que eu não contava com um imprevisto.
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Que imprevisto? O que aconteceu?
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É que... É que...
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Fala logo! Desembucha...
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É que... É que choveu lá no bairro ontem à noite e lavou toda a cal...
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Há! Há! Há! Só tu mesmo, Hélio! Há! Há! Há! Um plano quase perfeito! Há! Há!
Há!
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É brabo! Mas, eu ainda pego a nega, Valdeci! Eu juro! Virou questão de honra.
Já tenho até outro plano...
* Jornalista e contista gaúcho
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