No tempo das maxambombas
* Por Leonardo Dantas Silva
Naquela tarde de cinco de janeiro de 1867, o inusitado ocorreu no
Recife... Como já haviam noticiado os jornais, nas ruas da pacata cidade de
pouco mais de 116 mil habitantes, passou a circular o primeiro trem urbano da
América do Sul; uma espécie dos atuais metrôs de superfície que por muitos anos
tornou-se o meio de transporte preferido da maioria dos habitantes do Recife e
de Olinda.
Explorados pela Brazilian Street Railway Company, empresa dirigida por
ingleses, os trens urbanos receberam o apelido de maxambomba e logo uniram o
centro do Recife à povoação de Apipucos, estabelecendo assim a “Linha
Principal”; que ao chegar na Estação do Entroncamento (hoje praça do mesmo
nome), se bifurcava em três ramais: Linha Principal (Dois Irmãos), Caxangá
(Várzea e Caxangá), Arraial (Casa Amarela e Monteiro).
Haviam ainda os ramais com destino a Olinda e Beberibe, que tinha seu
itinerário através da atual Avenida João de Barro, se bifurcando na
Encruzilhada de Belém, com as composições seguindo pela Estrada de Belém (Olinda)
e Estrada de Beberibe (hoje avenida). A primeira linha da maxambomba, entre o
bairro portuário e a povoação de Apipucos, foi inaugurada em 5/1/1867, com
bitola de 1.219 mm (4 pés), sendo nesse ano estendida ao bairro Dois Irmãos e
em 24/6/1870 a Caxangá. Um ramal para Arraial (Casa Amarela) começou a
funcionar em 24/12/1871.
O vocábulo, segundo Pereira da Costa, “tem origem fluminense, em cujo
estado há uma localidade [hoje Nova Iguaçu] assim chamada”; na antiga Lourenço
Marques (hoje Maputo), capital da República de Moçambique, na África Austral, o
vocábulo servia para designar certo tido de transporte coletivo (espécie de
micro-ônibus); opinando Antenor Nascentes ter ele origem na corruptela de
machine pump (bomba mecânica). Por sua sonoridade, logo ganhou o folclore sendo
cantado nos sambas de então:
Moça nenhuma
Me faça tromba
Qu’eu as embarco
Na maxambomba!
O preço da passagem na maxambomba era fixado em 200 réis por cada milha
do trajeto e logo foram inaugurados os ramais de Dois Irmãos e Caxangá (1870),
Olinda (1870) e Arraial (1871). Com a construção da ponte Lasserre (ponte da
Capunga), no final da atual Rua Joaquim Nabuco, as composições da maxambomba
cruzaram a Estrada Nova de Caxangá (atual Avenida Caxangá) e atingiram à
povoação da Várzea (1885). Outra linha, com bitola de 1,4 metro, foi instalada
por uma nova companhia formada por acionistas locais, a Trilhos Urbanos do
Recife – Olinda e Beberibe, fazendo uso de locomotivas inglesas da Manning
Wardle e carros de passageiros fabricados por John Stephenson, em New York. A
ligação com Olinda, porém, só veio a ser inaugurada em 20 de junho de 1870,
fazendo o trajeto através da Estrada de João de Barros passando pela
Encruzilhada, seguindo pela Estrada de Belém até atingir Salgadinho, Duarte
Coelho e o Carmo.
Na mesma época, foi construído outro ramal que, bifurcando na
Encruzilhada de Belém, seguia em direção à povoação de Beberibe, passando pelo
Arruda, Água Fria, Porto da Madeira e outras localidades. Neste mesmo ano de
1870, segundo o relatório da concessionária, o sistema de transportes era
composto por cinco locomotivas, onze carros de passageiros e cinco eram
destinados aos serviços de carga.
No recordar do escritor Mário Sette, “cada um de que viveu seu tempo [da
maxambomba] guardará uma recordação amável, esquecendo a poeira dos vagões, o
sacolejo das rodas, as janelas sem vidraças, os atrasos nos desvios, os
argueiros de carvão e os pregos dos bancos que furavam as calças novas...
Olhamos, de longe, somente o lado bom das maxambombas. Sem cometer o gesto
ingrato daqueles que recitavam os versinhos em voga antigamente:
Trepei na bomba
Comi pitomba;
Atirei caroço
Na maxambomba...
A maxambomba, tão integrada à paisagem e ao folclore do Recife,
funcionou até 1917 quando a Pernambuco Tramways, adquirindo a “Linha
Principal”, consolidou um novo tempo: o tempo do bonde elétrico.
· Jornalista e escritor do Recife/PE
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