Feiúra
e banalidade
* Por Pedro J.
Bondaczuk
A educação é um processo contínuo, que começa logo
no nascimento – quando a natureza nos força a aprender a respirar, a se
alimentar utilizando o seio materno e a praticar outros tantos atos vitais de
que não nos damos conta – e se encerra, somente, com a nossa morte. Estamos,
continuamente, aprendendo, aprendendo e aprendendo, todos os dias, todas as
horas, todos os minutos até. Pena que a coisas novas que aprendemos nem sempre
são as mais convenientes, ou necessárias, ou mesmo saudáveis para a nossa vida.
Nesse processo de constante aprendizado, atos,
exemplos e atitudes, são muito mais importantes do que meras palavras, por mais
profundas e bem-utilizadas que sejam. O homem é um animal imitador. Isso faz
parte da sua natureza. Nesta época tensa da história, em que imperam o egoísmo
e um inconsciente e estúpido materialismo, todavia, se torna cada vez mais
difícil a tarefa do educador para ensinar princípios e valores sólidos aos
jovens.
Escasseiam exemplos de grandeza, beleza e
transcendência e abundam os de violência, cobiça e corrupção. O antropólogo e
cientista do comportamento, Konrad Lorenz, chegou a desabafar, certa ocasião,
com desalento, em entrevista a um jornal: “Como despertar num adolescente o
sentimento de respeito, se tudo o que ele vê ao seu redor é obra humana, feia e
banal?!”.
Como? Mostrando-lhe a ação dos grandes líderes do
passado, que com idealismo e talento, promoveram importantes saltos na
civilização. Não fossem eles, o mundo, certamente, estaria muito pior hoje em dia. Trazendo à baila
obras de arte, de poetas, pintores, escultores, compositores etc., que tornaram
a vida mais alegre e bela. É questão de justiça. Esses homens merecem nossa
lembrança e gratidão.
Ressalte-se
que não há demérito algum, ao contrário do que muitos pensam, em se imitar
pessoas dignas de imitação. A rigor, passados 13 mil anos de civilização, com
milhares e milhares de gerações se sucedendo, é absolutamente impossível sermos
originais. Todos nossos atos e pensamentos, dos mais banais aos mais complexos
e transcendentais, são imitados. Alguém, em algum tempo ou lugar, já os
praticou.
Desde
as primeiras palavras que balbuciamos, dos primeiros passos que damos, das
coisas mais triviais que aprendemos, imitamos alguém. O problema é o modelo.
Por exemplo, entre Hitler e São Francisco de Assis, é óbvio quem deve nos
servir de parâmetro, não é mesmo?
Devemos
imitar quem de fato mereça imitação, por seus atos e idéias. E muitos, dos que
consideramos (com justiça) “gigantes da espécie”, a merecem. Não se pode negar,
no entanto, que a feiúra e a banalidade imperam. Que a cobiça, a violência, a
corrupção, as injustiças, a ingratidão e milhares e milhares de outras atitudes
condenáveis e perversas prevalecem. Até a ação que deveria ser considerada
transcendental (porque o é), foi desvirtuada, corrompida, conspurcada,
banalizada e tornada horrível.
O
mais sublime e importante dos atos da natureza, o que assegura a reprodução das
espécies e a conseqüente multiplicação e perpetuação da vida, foi transformado,
pelo homem, em algo trivial, de pouca (ou nenhuma) importância espiritual, mera
diversão a dois. O desvirtuamento foi de tal sorte, que a maioria das palavras
de baixo calão, utilizadas para ofender desafetos em momentos de raiva, tem
conotação sexual.
O
ato mais sublime e nobre que o ser humano deveria praticar com compunção,
responsabilidade e devoção, foi corrompido, desvirtuado, aviltado,
emporcalhado, mercantilizado e banalizado, quando deveria ser considerado
sagrado e encarado como nossa maior missão no mundo.
Não
se trata, aqui, de ditar regras de moral, mas de atentar para a pura lógica que,
neste caso, é violentada da forma mais absurda e brutal. Machado de Assis, com
seu talento, apresenta argumentos irretorquíveis em defesa da sacralidade do
ato sexual, numa de suas magistrais crônicas, ao escrever: “Como a vida é o
maior benefício do universo, e não há mendigo que não prefira a miséria à
morte, segue-se que a transmissão da vida, longe de ser uma ocasião de
galanteio, é a hora suprema da missa espiritual”. Há como refutar, com idéias e
não meras palavras, tão sábio e verdadeiro argumento?
Embora
a vida seja rápida demais (e é), são muitas as experiências afetivas, boas e
ruins, que vivemos ao longo dos anos. São tantas, que sequer arranjam espaço suficiente
na lembrança para poderem se perpetuar, apesar da memória ser tão ampla e
receptiva. Esquecemos, com o tempo, de muitas dessas experiências e das pessoas
com as quais as compartilhamos. Por isso, só vemos feiúra e banalidade ao nosso
redor.
Causa-me
intensa piedade, acompanhada de frustração, quando observo uma pessoa que tinha
todo o potencial para se realizar na vida, para conquistar seus sonhos,
concretizar seus ideais e ser feliz, fracassar e se tornar inútil, maldosa,
amarga e derrotada. Foram inúmeras as que vi se corromperem e se desviarem da
boa rota, enveredando pelo caminho do vício ou do crime.
Mais
agudo, ainda, esse sentimento se torna quando constato que nada posso fazer
para ajudar esse alguém que se desviou da trilha óbvia e segue, célere, em
direção ao abismo sem volta. Lamento, lamento muito minha incapacidade de
convencimento e minha conseqüente desvalia. Essas pessoas imitaram modelos
errados, viciosos e corrompidos, de notórios fracassados, e se deram mal.
Passaram a enxergar, apenas, feiúra e banalidade ao seu redor. E tornaram-se,
física e espiritualmente, também feios e banais. Uma pena...
* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio
Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor
do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico
de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos
livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos),
além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O
Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com.
Twitter:@bondaczuk
Hoje os valores estão invertidos, os vilões são exaltado e "copiados", enquanto os que merecem de fato serem seguidos ficam relegados a uma ínfima porcentagem de seguidores. A grande maioria (e isso infelizmente inclui os jovens, ardorosos séquitos dos "espertalhões" e dos ardilosos "caras de pau") prefere o certo ao errado, o material em detrimento ao espírito e à contemplação, vícios, banalidades e bizarrices em detrimento a bem comum e as virtudes.
ResponderExcluirParabenizo-o enfaticamente amigo, pelo texto, que guardarei para futuras reflexões e certamente vou compartilhar entre os meus íntimos para que desfrutem também dessas oportunas considerações e sábias reflexões.
Talvez não haja tentativa de cópia do mal, e provavelmente nem espírito de imitação. Faltam valores e exemplos positivos,o caminho do vício mostra-se mais fácil e atraente e o desastre será o resultado.
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